terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Beata Ilduara, Condessa, mãe de São Rosendo de Celanova – 20 de dezembro

     
Filha de Ero e Adosinda, gozou de uma ampla projeção social na Galiza no século X. Seu pai era conde no território de Lugo no final do século IX. Seu casamento com Gutierre Menéndez no início do século 10 a ligou a um dos grupos aristocráticos mais importantes do reino de Leão. O casal viveu durante algum tempo em Salas, perto do Porto.
     O primeiro de seus filhos, Rosendo, nasceu lá; seguir-se-ão mais quatro: Munio, Froila, Adosinda e Ermesinda. Há uma legenda que relata como Ilduara rezou para conceber seu primeiro filho, e como um anjo lhe apareceu dizendo que ela teria um filho que seria a glória de sua família.
     Quando a família se mudou para o território da atual Galiza, as paisagens que lhes eram mais familiares situavam-se em torno de Porto Marín, onde o casal tinha uma residência, e, sobretudo, em Vilanova, hoje Vilanova dos Infantes, perto de Celanova, onde era a sua residência principal.
     Foi lá que aconteceu a parte principal da vida de Ilduara. Foi nas imediações da sua casa em Vilanova, onde, já viúva e juntamente com o filho Rosendo, fundou e construiu, entre os anos de 936 e 942, o Mosteiro de Celanova, que cedo se tornou um centro monástico de primeira importância na Galiza, na segunda metade do século X. E ali, também, junto à sua casa, no Mosteiro de Santa Maria, cuja fundação ela própria tinha promovido, passou os últimos anos da sua vida.
     Ilduara desenvolveu uma atividade significativa em diferentes áreas sociais.
     Entre as circunstâncias específicas que explicam por que Ilduara teve um papel de destaque na sociedade de seu tempo, é necessário levar em conta, em primeiro lugar, o uso das possibilidades oferecidas a ela para adquirir uma formação intelectual.
     Com base no aprendizado da leitura e da escrita e no consequente acesso ao conteúdo dos livros que ela ou seu filho Rosendo são conhecidos por possuírem, os encontros com a corte real, as frequentes entrevistas com clérigos e nobres, os relatos de viajantes e comerciantes, permitiram-lhe desenvolver uma concepção de mundo que estava acima da média de seus contemporâneos e que também pode ser vista na sensibilidade refinada e gosto pela qualidade de vida que demonstram a riqueza e beleza dos objetos cotidianos com os quais estava cercada. A capela dedicada a São Miguel, que fez parte do conjunto arquitetônico inicial do Mosteiro de Celanova, é, nos nossos dias, um testemunho expressivo da beleza das construções do século X, do cuidado que foi colocado na aparência exterior e interior dos edifícios.
Capela de São Miguel 
Mosteiro de Celanova
     
     Condições gerais e circunstâncias específicas facilitaram o acesso de Ilduara a um nível de preparação e treinamento que possibilitou a estreita colaboração com seu marido Gutierre e, sobretudo, com seus filhos Rosendo e Froila, em múltiplos aspectos de projeção extra doméstica, que vão desde a organização do espaço até a atividade religiosa, passando pelas esferas econômica e política. A participação de Ilduara estava longe de ser meramente passiva na constituição dos dois suportes essenciais – patrimônio e poder – nos quais se baseava a posição social de sua família. Ela desempenha um papel muito significativo na criação e evolução do patrimônio sobre o qual se sustentava o grupo de filiação formado por ela, seu marido e seus filhos.
     Em 942, Ramiro II concedeu a Froila, sob a tutela de sua mãe Ilduara, uma série de condados e decanos. A função tutorial é um reconhecimento do prestígio e confiança despertados por Ilduara, já viúva do Conde Gutierre.
     É na esfera religiosa que Ilduara tem uma atividade mais significativa; sua formação cultural e sua alta renda possibilitaram ações importantes em relação à vida monástica de seu tempo.
     Do ponto de vista da história das mulheres, de particular interesse são as comunidades duplas presididas ou copresididas por uma abadessa, são um sintoma significativo do papel que as mulheres desempenharam nos séculos IX e X.
     A relação de São Rosendo com o monaquismo carolíngio após a reforma de Bento Aniano e os passos dados na beneditização estão bem comprovados. No mesmo contexto, compreendem-se as críticas específicas aos mosteiros duplicados feitas pelo grupo familiar de Ilduara; na documentação de Celanova, há dados que indicam que nesse ambiente a imagem da mulher instável e fraca progride. As atuações nos mosteiros de Santa Maria de Loio e Santa Comba de Bande são apresentadas como expressão do fato de a relação entre mulheres e homens estar na raiz de todo o mal. A reforma deve, portanto, basear-se na sua separação estrita.
     Um novo testemunho muito significativo: Ilduara participou direta e ativamente da fundação do Mosteiro de Celanova; mas ele não conseguiu se integrar a ela durante sua vida. No final dos seus dias, já viúva, para ter acesso à vida monástica, recorreu ao modelo testado em Loio e Porto Marín. E, além do mosteiro masculino de Celanova, muito próximo dele, mas diferente e totalmente separado, fundou o mosteiro feminino de Santa Maria de Vilanova, que abraçou. Em Celanova, ela só entrará depois que morrer.
     Ilduara, entendida como expressão da mulher aristocrática do século X, reflete uma imagem social de notável riqueza. É o que corresponde a uma sociedade cuja organização vem de séculos anteriores e ainda não é a dos séculos medievais. Entre as duas situações, as mudanças em curso são a manifestação de um longo estágio social, que se desenvolve entre o impacto de Roma nas sociedades indígenas e a plena articulação do feudalismo.
     De acordo com a inscrição em seu túmulo, ela morreu em 20 de dezembro de 941 e foi enterrada no mosteiro em um túmulo construído por seu filho.
     Quando seu corpo foi exumado em 1717, apenas dois ossos foram encontrados e seus restos mortais foram reduzidos a cinzas.
     Nos martirológios beneditinos, a Beata Ilduara é celebrada e lembrada no dia 20 de dezembro.

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São Rosendo de Celanova
 
     
Lembremos que foi ele o fundador da grande Abadia de Celanova e que terminou a sua vida como bispo na então já muito famosa Catedral de Santiago de Compostela (968-977). Bom é saber igualmente que a sua prestigiosa família galega pertenceram nada mais do que 10 reis e 7 bispos, assim como uma boa parte das mais importantes figuras do reino ― entre os anos 850 e 1000.
     Este grande santo ibérico, é considerado português, pelos portugueses, por causa do seu nascimento ― mesmo se nesse tempo nem o Condado de Portugal existia ― e por ter sido um dos bispos de Dume, na região de Braga, a mais antiga diocese de Portugal.
     Os espanhóis e, particularmente os galegos, consideram-no espanhol por ter sido o fundador da Abadia de Celanova na Galiza e por fim, bispo da grande diocese de Santiago de Compostela, cuja catedral era já muito visitada, como o provam antigos documentos.
     Segundo nos diz um autor espanhol, S. Rosendo é o único bispo da época alto medieval do qual se possuí uma verdadeira biografia, obra de um monge do mosteiro de Celanova que viveu na segunda metade do século XII, chamado Ordoño, o qual utilizou na sua obra documentos e dados recolhidos durante décadas pelo famoso claustro celanovense.
 
 
Fontes: www.santiebeati.it
María del Carmen Pallarés Méndez
Ilduara Eriz abençoada - España | Academia Real de História (rah.es)

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Santa Lúcia ou Luzia de Siracusa, virgem e mártir - 13 de dezembro

  
   Luzia nasceu na cidade italiana de Siracusa e era de uma família rica e cristã. Era considerada como uma das jovens mais belas de sua cidade. Seu pai morrera quando ela tinha 5 anos e sua mãe, Eutíquia, sofria de graves hemorragias internas.
     Luzia tinha uma grande convicção cristã, que a fez consagrar-se secretamente a Nosso Senhor Jesus Cristo, e oferecer sua virgindade perpetuamente.
     Ela e a mãe decidiram fazer uma peregrinação à cidade de Catânia onde se encontrava o corpo da grande virgem Santa Águeda, que morrera por recusar adorar os ídolos. O Evangelho pregado na Santa Missa daquele dia foi o da mulher que sofria com hemorragias internas, iguais às da mãe de Luzia. Ela então pensou: "Se aquela mulher ao tocar nas vestes do Senhor ficou curada, será que Santa Águeda não pedirá ao Senhor que cure minha mãe da mesma forma como Ele curou aquela mulher?" Ela então disse à mãe que esperassem todos saírem da igreja para irem rezar junto ao corpo da Santa.
     Nesse interim, Luzia em êxtase sonhou que anjos rodeavam Santa Águeda e que a mesma lhe dizia: "Luzia, minha irmã, por que pedes a mim uma coisa que tu mesma podes conceder?" Luzia saiu do êxtase e foi procurar sua mãe, que lhe disse ter sido curada. Luzia aproveitou esse momento para revelar à mãe que havia feito voto de virgindade a Jesus e que distribuiria seus bens aos pobres. Sua mãe disse: "Luzia minha filha, tudo o que é meu e de seu falecido pai é teu, por isso faça o que queres".
     Elas então começaram a distribuir seus bens aos pobres. Um jovem muito rico e pagão, que se enamorara de Luzia, perguntou à mãe dela o motivo de tanto esbanjamento de dinheiro, e em resposta Eutíquia disse: "Luzia achou bens muito mais valiosos do que esses". O jovem não entendeu que ela falava dos bens celestes.
     Luzia e sua mãe davam mais e mais dinheiro aos necessitados dilapidando a grande fortuna da família, o que fez com que o jovem tivesse certeza que Luzia era cristã. Ele denunciou-a ao prefeito de Siracusa, Pascasio que furioso com a grande fé de Luzia, mandou-a ao Imperador Diocleciano que tentou persuadi-la a se converter aos ídolos. Luzia se mostrou cheia do Espírito Santo diante de Diocleciano.
     Vendo que nada a convertia, Diocleciano mandou enviá-la a uma casa de prostituição, mas foi em vão: ninguém conseguia tirar Luzia dali, nem mesmo uma junta de bois. Os soldados saíram envergonhados por não conseguir tirá-la dali. Era como se seus pés estivessem fincados no chão como raízes de plantas.
     Depois tentaram colocar fogo em seu corpo, mas Luzia fez uma oração e as chamas nada fizeram contra ela e por isso retiraram-na de dentro do fogo. Como nada havia dado certo, foi-lhe aplicado o castigo mais cruel depois da degolação: um soldado, a mando do imperador, arrancou-lhe os olhos e entregou-os em um prato a Luzia. No mesmo instante nasceram-lhe olhos sãos, perfeitos e mais belos do que os outros.
     Vendo que nada a convencia a voltar para o paganismo, deceparam sua cabeça no momento em que Luzia dizia: "Adoro a um só Deus verdadeiro, e a Ele prometi amor e fidelidade". No mesmo instante sua cabeça rolou pelo o chão. Era 13 de dezembro do ano de 304 D.C. Os cristãos recolheram seu corpo virginal e a sepultaram nas catacumbas de Roma. Sua fama de santidade se espalhou por toda a Itália e Europa e depois para todo mundo, onde hoje é venerada e honrada como a "Santa da Visão".
 
Fonte: Referências: Santa Luzia, virgem, mártir, +303, Evangelizo.org 2001-2010, 13 de Dezembro de 2011


Santa Eulália, Virgem e mártir na Espanha - 10 de dezembro

     
Santa Eulália de Mérida (finais do século III - inícios do século IV), festejada a 10 de dezembro, é com frequência confundida com Santa Eulália de Barcelona, cuja hagiografia é semelhante.
     Santa Eulália é uma das mais famosas santas da Espanha. Os dados sobre sua vida e sua morte são encontrados em um hino escrito em sua honra pelo poeta Prudêncio no século IV. Ela também é cantada na célebre Sequência de Santa Eulália (ou Cantilena de Santa Eulália), o primeiro texto poético em língua francesa de fins do século IX.
     Eulália nasceu em Emerita Augusta no ano 292. Quando completou 12 anos, o imperador Maximiliano decretou a proibição do culto a Jesus Cristo pelos cristãos e ordenou que eles adorassem os ídolos pagãos. A menina sentiu um grande desgosto por leis tão injustas e se propôs protestar junto aos delegados do governo. Sua mãe a levou para viver no campo, pois temia que a jovem pudesse correr algum perigo de morte afrontando a perseguição dos governantes, mas ela deixou seu lar e se dirigiu à cidade de Mérida, indo enfrentar Daciano, o governador.
     Assim narra o martírio de Eulália de Mérida o poeta Prudêncio:
     ''De madrugada, antes da saída do sol, chegou à cidade, e, corajosa, se apresentou diante do tribunal, em meio de cujos leitores bradou aos magistrados: "Dizei-me, que fúria é essa que os move a fazer perder as almas, a adorar aos ídolos e a negar o Deus criador de todas as coisas? Se buscais cristãos, aqui me tendes a mim: sou inimiga de vossos deuses e estou disposta a pisoteá-los; com a boca e o coração confesso o Deus verdadeiro. Isis, Apolo, Vênus e até mesmo Maximiliano são nada: aqueles porque são obra da mão dos homens, este porque adora coisas feitas com as mãos. Não vos detenhais, pois: queimem, cortem, dividam estes meus membros; é coisa fácil quebrar um vaso frágil, porém minha alma não morrerá, por maior que seja a dor".
     Daciano tentou a princípio oferecer presentes e prometeu ajudar a menina se mudasse de opinião, porém ela continuou profundamente convencida de suas convicções cristãs. Enfurecido mandou torturá-la e a submeteu a sofrimentos atrozes. Mas nada fez com que ela deixasse de louvar ao Senhor.
     O poeta Prudêncio narra que ao morrer a santa, as pessoas viram uma pomba mais branca do que a neve que subindo tomou o caminho das estrelas: era a alma de Eulália, branca e doce como o leite, ágil e incontaminada.
     O culto de Santa Eulália se tornou tão popular, que Santo Agostinho fez sermões em honra desta jovem santa. Já em uma antiquíssima lista de mártires da Igreja Católica, o Martirológio Romano, constava a seguinte frase: “em 10 de dezembro se comemora Santa Eulália, mártir da Espanha, morta por proclamar sua Fé em Jesus Cristo”.
     Sepultada em Mérida, capital da Lusitânia, cidade da qual é patrona, parece que algumas das suas relíquias terão ido para Barcelona, donde a confusão com a santa homônima, Santa Eulália de Barcelona. Ela é também patrona da Arquidiocese de Oviedo, em cuja catedral repousam os seus restos.
 
Etimologia: Eulália, do grego Eulálios: “que fala bem”, “eloquente” - Eu = “bem”, Lálios = “falar”.

Santa Narcisa de Jesus Martillo Morán – 8 de dezembro

      Na primeira metade do século XIX as guerras e as convulsões sociais eclodiam em quantidade na América do Sul. Quando Narcisa nasceu, em 29 de outubro de 1832, havia pouco tempo que o Equador tinha-se transformado em república.
     Seus pais Pedro Martillo Mosquera e Josefa Morán eram profundamente católicos, abastados e de ilustre ascendência espanhola, e viviam numa fazenda no povoado de Nobol, província de Guaias. Ela foi a sexta de nove filhos. Faltam dados sobre o início de sua vida, tendo-se apenas a data de sua Crisma, recebida aos sete anos, no dia 16 de setembro de 1839, quando passou a aplicar-se em alcançar a santidade, acostumando-se a dedicar longas horas à oração.
     Uma testemunha da época nos relata: “Narcisa tinha uma irmã, porém, que tremenda irmã! Filhas dos mesmos pais, mas tão diferentes! No meio dos santos surgem também pecadores. Assim saiu a irmã de Narcisa, que foi terrível: gostava dos bailes e tinha muitos namorados. Convidava sua irmã a dançar nas festas que organizava na fazenda, mas ela nunca aceitava. […] Narcisa brilhava por sua ausência, encontrando habilmente o modo de não participar dos bailes nem dos banquetes que sua irmã organizava”.
     As fugas das ocasiões de pecado e das más companhias, bem como as graças místicas que já marcavam a fundo sua alma, tornaram essa santa jovem alvo de um sem-número de incompreensões, zombarias e falatório de seus próprios familiares.
     Narcisa costumava transformar um frondoso araçazeiro existente perto da fazenda em seu oratório para “elevar a alma a Deus”. Certo dia, absorta em seu convívio com Jesus, não se deu conta de que uma chuva torrencial caia sobre a floresta. Seu pai saiu à sua procura, mas regressou para casa com as roupas molhadas, sem encontrá-la. Pouco tempo depois a menina chegou debaixo da chuva, mas, surpreendentemente, suas roupas estavam totalmente secas!
     Num dos aposentos da casa de seus pais, ela instalou sua “capela”, onde passava longas horas rezando diante de uma pequena imagem do Menino Jesus. Muitos anos depois, seu diretor espiritual, Mons. Manuel Medina, revelaria que Nosso Senhor “a consolava quase diariamente com Sua presença”.
     Na adolescência dedicava-se aos trabalhos domésticos, e aos 15 anos aprendeu o ofício de costureira, que exercia em sua casa e nas casas das famílias vizinhas.
     Em 1851, aos 18 anos, seu pai faleceu e ela transferiu-se para Guayaquil, onde moravam seus parentes. Em Guayaquil, viveu em vários lugares. As famílias que a acolhiam ofereciam-lhe confortáveis aposentos, porém, ela sempre os recusava. Em seu ardente desejo de passar despercebida, preferia transformar o sótão dos anfitriões em seu local de oração, de trabalho, de árduas e dolorosas penitências.
     As pessoas que a rodeavam começavam a ter-lhe muito respeito e até veneração.
     Apesar de ter anteriormente usufruído de uma cômoda fortuna, Narcisa dedicou- se ao humilde ofício de costureira em Guayaquil. Passava até altas horas da noite, à luz de um candeeiro, trabalhando para as damas da sociedade.
     Além de uma humildade profunda e sincera, a alma de Narcisa estava adornada com outras virtudes características dos bem-aventurados. Segundo os que a conheceram, ela era “muito amável e alegre”, “de caráter doce e aprazível”, “sumamente boa e obediente”, “muito caritativa”, “bondosa e compassiva”, mas sobretudo “extremamente piedosa”.
     A espiritualidade da humilde costureira se fundamentava em três firmes alicerces: uma arraigada devoção ao Santíssimo Sacramento, ao Coração de Jesus e à Santíssima Virgem, Mãe de Misericórdia. Trazia sempre consigo um terço que desfiou incessantemente ao longo da vida.
     Embora sendo simples leiga, desde muito jovem seguiu os conselhos evangélicos de pobreza, castidade e obediência, somando-se a eles outros propósitos que praticou com todo rigor: “de clausura, até mesmo para não sair de seu quarto, de isolamento, de jejum a pão e água, de comunhão diária, de confissão, de mortificação e de oração”.
     Quando, em 1853, Pio IX beatificou Mariana de Jesus Paredes y Flores, a “Açucena de Quito“,  uma onda de devoção e entusiasmo por  sua vida de intensa penitência e oração cativou muitas almas, entre elas a de Narcisa de Jesus, que se propôs imitá-la. “E o Senhor a favoreceu tanto para cumprir esse propósito, que basta ler a vida de Mariana para conhecer as virtudes de Narcisa”, comenta seu biógrafo.
     Tal como aquela Santa, Narcisa oferecia sacrifícios pela expiação de sua cidade. Chegou a mandar fazer uma cruz salpicada de pregos, sobre a qual deitava todas as noites por quatro horas, antes de se acomodar sobre o chão para um breve repouso. Foi muitas vezes surpreendida por seus familiares e conhecidos na prática de atos como esse. Ao presenciar seus sacrifícios, perguntavam-lhe por que fazia isso. “Vim ao mundo para sofrer”, respondia a Santa com simplicidade, sempre com o rosto sereno e aprazível.
     Deus lhe concedia graças muito peculiares: êxtases após receber Nosso Senhor Jesus Cristo, na Eucaristia, ou simplesmente ao pôr-se em oração. Mas Narcisa foi também muito perseguida pelo espírito infernal. O demônio lhe armava ciladas para afastá-la do caminho de santidade, espancava-a cruelmente, sujava seu quarto, mas ela saía sempre vitoriosa de todas essas vexações.
     Em Guayaquil, Narcisa encontrou uma amiga, Mercedes Molina, venerada como beata, empenhada na direção de um orfanato. Não hesitou em ajudá-la na formação das crianças e na confecção de indumentárias. As duas amigas assistiam à Missa cotidiana e moravam no orfanato.
     Segundo testemunhas da época, "Narcisa era muito bela, alta e bem proporcionada; sua cabeleira loura, abundante e anelada, chamava a atenção das pessoas; era muito estimada na cidade. Como caráter, era muito amável e em certos momentos dava demonstração de sua alegria cantando, enquanto sua amiga tocava a viola. Era muito caridosa".
     Em 1868, o frade franciscano Pedro Gual, nessa época, comissário e visitador geral dos franciscanos na América do Sul, que se tornara seu diretor espiritual, convidou Narcisa a transferir-se para Lima, onde ela ficaria hospedada no convento dominicano de Patrocínio. O capelão daquele mosteiro tornou-se seu confessor até a sua morte.
     Naquele convento ela intensificou suas orações e penitência. Certo dia, quando fazia a ação de graças depois de ter comungado, apresentou-Se diante dela o Rei dos reis, envolto numa inefável e deslumbrante claridade. Com muita doçura e um suave sorriso, Nosso Senhor Jesus Cristo “tirou da cavidade do peito o Seu Coração”, aproximou-o dos lábios da Santa e o deu a beijar, dizendo-lhe: “Jamais concedi igual graça a uma alma”.
     Em 24 de setembro de 1869, apareceram-lhe o Salvador e Nossa Senhora. Pediram-lhe que manifestasse um desejo, alguma graça especial que quisesse obter. Santa Narcisa, movida pela caridade, pediu por seus próximos, mas rogou também a graça de ir logo para o Céu. Seus pedidos foram atendidos: após essa revelação sobrenatural, ela caiu enferma, com agudas febres que aumentavam a cada dia.
     Poucas horas antes de seu falecimento, na noite do dia 8 de dezembro de 1869, ao despedir-se das Irmãs, como que zombando, disse que partiria para uma longa viagem. Um pouco antes da meia-noite, a Madre que devia fazer o turno de vigília percebeu que a cela de Narcisa estava misteriosamente iluminada, e dela provinha um perfume fortíssimo. A religiosa foi verificar o que ocorria e "ao abrir a porta do quarto de Narcisa, viu a mesma claridade que se notava do lado de fora e sentiu que ali a fragrância era maior; ela tinha falecido, abrasada pela febre de seu corpo e, sobretudo, pelo ardor do amor divino". Tinha apenas 37 anos.
Exumação do seu corpo
incorrupto
     Seus restos mortais irradiavam uma intensa luz e exalavam um discreto perfume. Ao ser exumado anos depois seu corpo apareceu incorrupto com um sorriso esboçado nos lábios.
     Foi beatificada por João Paulo II em 25 de outubro de 1992. A sua canonização ocorreu em 12 de outubro de 2008, sendo a quarta pessoa oriunda da América Latina a ser canonizada por Bento XVI e a terceira santa equatoriana.
     Seus santos despojos se encontram no Santuário que ostenta seu nome, na sua cidade natal, Nobol, no Equador. Por ter-se santificado tanto no campo como na cidade, em sua pátria como fora dela, muitos migrantes têm especial devoção por ela.