Num mundo em que a honra e a dignidade feminina são substituídas por uma liberdade que descamba para a libertinagem, estas cinco mártires da castidade, em pleno século XX, nos dão exemplo de qual é a verdadeira face da mulher católica.
As “mártires do Drina” faziam parte da
Congregação das Filhas do Amor Divino.
*
A Serva de Deus Madre Francisca Lechner, Fundadora da Congregação das Filhas do
Amor Divino (fundada em Viena em 1868), recebeu do Arcebispo Josef Stadler o
convite para a abertura de uma Comunidade de Religiosas em Sarajevo, Bósnia.
Após os trâmites legais, a própria Madre Francisca e duas Irmãs partiram de
Viena, Áustria, no dia 24 de abril de 1882, e chegaram a Sarajevo no dia 28 do
mesmo mês.
Em Sarajevo as Irmãs trabalhavam em escolas e acolhiam alunas internas e
crianças órfãs. Rapidamente seu trabalho foi reconhecido e ganhou o prestígio
da população. A missão das Filhas do Amor Divino foi se expandindo em Sarajevo
e arredores, com o trabalho abnegado e generoso das Irmãs. Para atender a
demanda da missão, foi necessário realizar novas fundações.
Assim, em 1911, em Pale, localidade distante cerca de 20 k de Sarajevo, abriram
um convento, “Casa de Maria”. Inicialmente esta casa era destinada para o
repouso das religiosas que trabalhavam no Instituto São José, em Sarajevo, e
para a recuperação de doentes. Entretanto, a “Casa de Maria” foi recebendo
credibilidade e se tornou famosa pelas obras de caridade exercidas em favor de
todos os necessitados que batiam às suas portas. Pale era um corredor de muitos
transeuntes, pessoas que iam e retornavam de Sarajevo. Nesta casa também eram
acolhidas pessoas, sem fazer distinção de etnia, cultura, cor, religião, que
vinham de diferentes lugares. Ali recebiam alimentação e, não raras vezes,
lugar para um repouso restaurador de energias para então seguir a viagem.
As culturas ocidental e oriental - e seus respectivos interesses políticos e
econômicos - chocavam-se seguidas vezes. A 2ª Guerra Mundial foi
particularmente trágica na Bósnia oriental. O Rio Drina estabelece o limite
entre as duas partes que hoje divide a Bósnia da Sérvia. Houve um conflito
acirrado entre os sérvios e a população muçulmana e católica da Bósnia
oriental. Estes povos foram duplamente provados pelas tragédias: em primeiro
lugar, porque um grande número de civis inocentes perdeu a vida; em segundo,
porque os que sobreviveram ao massacre tiveram de abandonar o seu ambiente e
foram forçados a fugir.
Havia duas facções que entravam em atrito: os “četnik”, membros voluntários da
tropa armada do Estado da Sérvia. É um grupo irregular com conotação terrorista
contra os povos não Sérvios; os “uštasa”, croatas revolucionários da direita.
Aqueles multiplicavam os ataques às populações civis católicas e muçulmanas. Os
incêndios às vilas indefesas, as torturas mais desumanas e os assassinatos em
massa, o corte das linhas de comunicação fazia parte da ordem do dia. Estes,
apoiados pelas forças armadas de ocupação ítalo-germânica, instituíam, a
exemplo deles, os campos de concentração onde perderam a vida dezenas de
milhares de opositores ao regime, mas também civis inocentes.
Neste ambiente conflituoso, as Irmãs viviam e doavam a sua vida em favor do
próximo e experimentavam a dor do povo indefeso e inocente.
As cinco Irmãs Filhas do Amor Divino que formavam a comunidade “Casa de Maria”,
em Pale, eram:
- Maria Jula Ivanišević, nasceu em
Godinjak, Croácia, em 1893. Desde sua juventude manifestou a vontade de entrar
no convento, se bem que teve que esperar por causa da enfermidade de sua mãe.
Ingressou no Instituto dedicado a responder às necessidades sociais da juventude
feminina de seu tempo. Exemplar na obediência, realizou diversos serviços. Em
1883 foi enviada à Bósnia, onde permaneceu o resto de sua vida. Foi uma
religiosa “segundo o Coração de Jesus”, modelo na oração e no sacrifício,
modesta e humilde, com um amor ilimitado ao Senhor, à Congregação e ao próximo.
Fundamentalmente se sentia grata à Providência por haver sido educada na fé
católica e pelo dom da vocação religiosa.
Foi enviada a Pale como superiora da
comunidade, onde exercia seu apostolado empenhando-se no âmbito pastoral e
caritativo. Com efeito, em seu convento, chamado o “hospital dos pobres”, acolhia
os doentes, os convalescentes, pobres e fugitivos. Sua atividade generosa e
gratuita era de domínio público entre os habitantes daquela região, composta
especialmente por ortodoxos.
- Berchmana Leidenix - seu nome de batismo
era Karoline Anna Leidenix; nasceu em 28 de novembro de 1865 em Enzersdorf, vizinho
de Viena, Áustria, sendo seus pais Michael e Josefa. Foi batizada dois dias depois
na igreja paroquial de São Tomé, Apóstolo. Nasceu em seguida uma outra filha,
Matilde (mais tarde religiosa, Irmã Bernarda, FDC), e uma terceira nasce morta.
A família logo ficou sem o pai, o que deixou Josefa, a mãe, em uma difícil
situação social. A Madre Francisca Lechner, acolheu as duas meninas no convento
em 1878. Karoline tinha então 12 anos.
Durante os estudos sentiu-se chamada e
decidiu se tornar membro daquela Congregação. Ingressou no noviciado em 1882 e
recebeu o nome de Irmã Maria Berchmana Johanna. Emitiu os primeiros votos em 20
de agosto de 1883 e os perpétuos em 17 de agosto de 1892. Foi enviada à Bósnia,
então país de missão, onde permaneceu a vida toda.
Professora muito hábil e empenhada,
trabalhou nas escolas da Congregação. Além de outras atividades, dava aulas de
catecismo. Durante a 1°. Guerra Mundial, prestou serviço no hospital militar
alemão de Višegrad, cuidando dos doentes e dos feridos. A administração do
hospital expressou sua gratidão em carta de 1915.
Em 1931, quando tinha mais de 60 anos, foi
nomeada mestra de noviças em Sarajevo. Na sua atividade educativa procurava
infundir o amor por Deus, pela Igreja e pelo próximo nos corações das noviças,
conforme afirmam aquelas que educou.
Irmã Berchmana era uma mulher de fé
profunda. Continuamente se dirigia à capela, toda imersa na oração. Ela sofria
de asma, mas suportava tudo com paciência, abandonada à vontade de Deus. Se
distinguia particularmente pelo equilíbrio, pontualidade e disciplina, exigindo
o mesmo das noviças. Dois meses antes da sua morte, falando com o Pe. Ksaver Meško,
Irmã Berchmana assim sintetizou a sua vida: “Por duas coisas sou infinitamente
grata a Deus: porque nasci e fui educada na fé católica e porque me tornei
religiosa”.
- Krizina Bojanc, eslovena, nascida
em 1885, "silenciosa e diligente como uma abelha", entrou no convento
com 36 anos, quando as condições da família o permitiram. Aos 56 anos de idade,
ela tinha um olhar atento para ajudar e confortar suas coirmãs, porque ela era
simples, mas "cheia de Deus, era como se estivesse sempre pensando em
Deus".
- Antonija Fabjan, nome de batismo Josefa,
nasceu em 23 de janeiro de 1907 no vilarejo de Malo Lipje (vizinho a Žužemberk,
na Eslovênia) terceira de cinco filhos da mãe Josefa e do pai Janez (que tinha outros
3 filhos da primeira esposa que morrera). Perdeu o pai quando tinha 4 anos, e a
mãe faleceu quando ela tinha 11 anos. Josefa foi confiada aos cuidados de uma
das tias.
Ingressou no convento em 9 de abril de
1929 e se consagrou a Deus em 19 de março de 1932. Esteve primeiramente no
convento de Betânia próximo de Sarajevo, depois foi para Antunovac na Ilidža, e
de novo no convento Betânia. Fazia trabalhos agrícolas e cuidava dos animais.
Tinha uma saúde muito frágil e por isso passou um tempo em Pale se
convalescendo, para onde foi transferida em 16 de setembro de 1936 e onde
permaneceu até sua morte.
Na Casa de Maria atendia os doentes e
recebia pobres e crianças com boa vontade. Fazia todo necessário: cozinha,
lavanderia, jardim e capela. O servir era o seu grande dom e simplesmente
reconhecia as necessidades dos outros. Tinha uma palavra boa para todos.
Era notada pela obediência e pelo espírito
juvenil. Irmã M. Wilibalda Markensteiner disse dela: “Esta era a nossa grande menina!
De boa vontade rezava em silêncio na capela do convento. Depois da oração sabia
dizer: ‘Rezei, mas não recebi’”. Irmã M. Ligorija Murn deu este testemunho: “Quando
Irmã Antonija estava comigo em Betânia, me contou que sua tia dizia sempre: ‘A
quem te faz mal, tu faças o bem!’, como fala a passagem do Evangelho. Fui
sempre fiel a estas palavras”.
Na manhã do dia 11 de dezembro de 1941, o
dia em que seria presa com suas coirmãs, um cetnico disparou e quase a matou
enquanto ela fugia para a Casa de Maria.
- Bernadeta Banja de origem húngara,
nascida na Croácia em 1912, de 29 anos, a mais jovem das cinco mártires; era a
cozinheira da comunidade, mas tão pequena de estatura que tinha que subir em um
banquinho para desempenhar sua função. Era de uma família devota e numerosa,
que considerou sua vocação como uma bênção de Deus; alegre, ela escolheu ser
"fiel no pouco", e fazia um grande trabalho sobre si mesma para
melhorar seu caráter e ser mais prestativa e humilde.
Era perigoso viver em Pale. Diante das sugestões de abandonar o povo, as Irmãs que ali viviam decidiram permanecer no meio dele, para compartilhar sua sorte e continuar a testemunhar-lhes o Amor Divino. Como era de se esperar, em 11 de dezembro de 1941, os soldados da milícia “četnik” aprisionaram as Irmãs, saquearam e incendiaram o convento.
Assim iniciou a via-sacra dessas cinco Irmãs. Elas foram obrigadas a marchar,
durante 4 dias e 4 noites, pelos caminhos da montanha Romanija, na neve, sem
veste adequada, com interrogatórios, ameaças e ofensas. Irmã Berchmana não
podendo prosseguir a caminhada, foi levada a Sjetlina onde se recuperaria do cansaço.
Conforme o combinado, ela deveria ser levada também para Goražde, a fim de se
juntar ao grupo de suas coirmãs, o que não aconteceu. Ela foi morta no dia 23
de dezembro, no bosque de Sjetlina.
As Irmãs tiveram de continuar a sua caminhada até Goražde, percorrendo cerca de
70 km. Ali chegaram na tarde de 15 de dezembro e foram levadas à caserna (2°
andar do quartel), próxima ao Rio Drina. À noite, os “četnik”, completamente
embriagados, invadiram o seu quarto com intenção de violentá-las, pediram que
renunciassem à vida religiosa, em troca suas vidas seriam garantidas, teriam
trabalho e graduação militar. Elas, porém, resistiram fortemente e declararam
que estavam prontas a morrer antes de trair Deus e a própria consagração.
Em defesa da dignidade e honrando o voto de castidade, Irmã Jula, Superiora da
Comunidade, para evitar o estupro, abriu a janela e convidou as demais Irmãs a
segui-la. Com a invocação “Jesus, salva-nos!”, lançou-se no vazio e as outras
três fizeram o mesmo. Os soldados furiosos, sentindo-se derrotados, às pressas
desceram as escadas até o local onde as Irmãs haviam caído e com muitíssimos
golpes de faca mataram-nas. Depois, chutaram seus corpos até as margens do Rio
Drina. Um soldado, também ferido por este grupo, viu como cada uma delas, antes
de morrer, fez o sinal da cruz.
Durante o processo canônico, fica evidente
que as Irmãs foram mortas pelo fato de serem freiras católicas e por ter
rejeitado o assédio dos soldados; foram consideradas mártires pelo ódio à fé e
pela pureza.
As Irmãs Jula, Berchmana, Krizina, Antonija e Bernadeta, conhecidas como as
Mártires do Drina, verdadeiras missionárias na Bósnia sofrida, serviram a Deus
e aos pobres com generosidade e amor desinteressado. Ao derramarem seu sangue, confirmaram
a fidelidade a Deus. Estas zelosas religiosas foram elevadas à glória dos
altares em 24 de setembro de 2011 como "mártires do Drina".
Fontes:
Congregação das Filhas do Amor Divino; santiebeati/it
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