quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Santa Pulquéria: A santidade elevada ao trono – 10 de setembro


Governante querida e respeitada, defensora da Igreja e da ortodoxia católica em meio aos esplendores da corte imperial de Constantinopla
 
    Santa Pulquéria nasceu no ano de 399 em Constantinopla, filha do Imperador Arcádio e da Imperatriz Eudóxia. Batizada por São João Crisóstomo, revelou desde cedo senso administrativo e rara piedade.
     Arcádio, ao morrer em 408, deixou Teodósio, filho de apenas oito anos, a filha Pulquéria, somente dois anos mais velha do que ele, além de outras filhas menores. Por isso, designara como tutor do imperador-menino um dos homens mais sábios do império, Antimo, muito ligado a Santo Afraates e a São João Crisóstomo.
  Pulquéria demonstrou tanto tino e maturidade, que em 414, tendo apenas 15 anos, foi proclamada Augusta, para compartilhar o governo com seu irmão.
     Apesar de ser apenas dois anos mais velha que Teodósio, Pulquéria encarregou-se de sua educação, cercando-o de mestres hábeis e virtuosos. Aplicou-se em inspirar-lhe profundos sentimentos de piedade. Ensinou-o a rezar, a amar tudo quanto se relacionava com o culto divino, e sobretudo a defender a doutrina da santa Igreja. Teodósio II foi casto, devoto, moderado, mas sem independência de ânimo e sem talento de governo.
     Pulquéria cuidou igualmente de suas duas irmãs menores, Arcádia e Mariana, levando-as a progredir na virtude. Incentivou-as a fazer, como ela, o voto de virgindade, consagrando-se assim a Deus. Juntas tomavam as refeições e faziam os exercícios de piedade, empregando o tempo livre em trabalhos manuais ou outras obras próprias ao sexo feminino. Em tudo se adiantava, praticando mortificações desconhecidas então na corte imperial. Proibiu a entrada no seu apartamento e nos de suas irmãs de pessoas do outro sexo, e não falava com homens senão em público. Recomendava a Deus todos os negócios de Estado, e não tomava nenhuma decisão séria sem antes ter ouvido as pessoas sábias e virtuosas que compunham seu conselho. Ela pensava com rapidez e obrava com resolução, não se tendo notícia de que, durante toda sua vida, houvesse uma só rebelião no império, o que era raro naqueles tempos conturbados.
Ingratidões e intrigas de corte
     Quando Teodósio completou 20 anos, Pulquéria deu-lhe como esposa a mais bela e cultivada donzela da corte, filha de um filósofo pagão de Atenas. Esta converteu-se, e no batismo tomou o nome de Eudóxia. Mesmo depois de se tornar imperatriz, Eudóxia compunha, com graça e espírito, escritos e poemas. Sua sabedoria era universal, tendo sido assombrosos seus progressos em gramática, retórica, matemática, música e poesia. Era também perita em bordados com fios de ouro e de púrpura, arte na qual assinalavam-se então as damas da sociedade.
     Grata a Santa Pulquéria, que a havia elevado ao trono, de início Eudóxia via com complacência a influência dela sobre o irmão. Mas depois de se tornar imperatriz, quis ela mesma governar o marido. Influenciada por descontentes da corte, começou a pressioná-lo para que afastasse Pulquéria da capital imperial.
Injustiças e o “concílio de ladrões”
     Nesse tempo, sucedendo a São Proclus, foi elevado à Sé de Constantinopla São Flaviano, fato que contrariou os desejos de Crisáfio, ministro de Teodósio II. Este procurou de todos os modos fazer o novo bispo cair em desgraça diante do imperador. E como Santa Pulquéria era resoluta advogada de São Flaviano, Crisáfio procurou o auxílio de Eudóxia para afastar os dois.
    Num sínodo que São Flaviano tinha convocado para analisar uma disputa havida em seu clero, o arquimandrita Eutiques, ligado a Crisáfio, foi acusado de heresia. Embora São Flaviano o tratasse com clemência, procurando fazer com que se retratasse e abandonasse a posição herética que defendia a respeito das duas naturezas de Cristo, Eutiques não abandonou a heresia. Diante da recusa, São Flaviano pronunciou sua sentença de degradação e excomunhão. Enviou depois uma relação completa do que se passara no sínodo ao Papa São Leão I, que aprovou sua decisão.
     Eutiques apelou para o imperador, reclamando que a justiça havia sido violada no sínodo, e pedindo revisão do mesmo. Feita esta por ordem de Teodósio II, nenhuma irregularidade foi constatada, e São Flaviano foi inocentado.
    Entretanto, o patriarca de Alexandria, Dióscoros, que súditos seus acusavam de vida irregular e opiniões heretizantes, tomou o partido de Eutiques. Crisáfio convenceu então Teodósio a convocar em Éfeso, no ano de 449, novo concílio, sob a presidência de Dióscoros, para de novo analisar a situação. Eutiques foi absolvido, apesar dos protestos do enviado papal, e todas as medidas contra ele anuladas. Flaviano foi condenado e deposto. Duramente maltratado em seu caminho para o exílio, faleceu três dias depois. Um partidário de Dióscoros foi nomeado para sucedê-lo na Sé de Constantinopla.
   São Leão I escreveu várias epístolas advogando a inocência de São Flaviano, especialmente a Teodósio II, a Santa Pulquéria e ao clero de Constantinopla. Fez mais: convocou um concílio em Calcedônia (ver abaixo) para julgar a farsa do que denominou “concílio de ladrões”. São Flaviano foi inocentado.
Sai do retiro para defender a Igreja
    Para fazer oposição a Pulquéria, Eudóxia levou o marido a apoiar o heresiarca Nestório, que atacava a maternidade divina de Nossa Senhora, e cujos erros haviam sido condenados pelo Concílio de Éfeso em 431. Eudóxia apoiava também o heresiarca Eutiques.
     Em vão São Cirilo de Alexandria tentou fazer ver à imperatriz Eudóxia o erro em que caía. Teodósio II publicou um edito no qual aprovava tudo o que havia sido feito pelos hereges.
     São Cirilo de Alexandria enviou então a Pulquéria, que sempre se mostrara ardente defensora da fé, uma obra que intitulou De fide ad Pulcheriam, pedindo-lhe defender a verdadeira doutrina da Igreja. Pulquéria convenceu o irmão a voltar atrás, e o reconhecimento dos erros de Nestório pelo imperador deve-se sobretudo à sua influência.
    Os nestorianos, aproveitando-se de toda a intriga existente no palácio, liderada por Crisáfio com o apoio da imperatriz Eudóxia, pressionaram também o imperador a afastar Santa Pulquéria. Sem nenhuma recriminação ao irmão nem à cunhada, que se mostravam assim tão ingratos, ela afastou-se para uma propriedade sua no campo, para ali levar uma vida verdadeiramente monástica.
     Eudóxia entrementes continuava a apoiar Eutiques e os nestorianos, ameaçando não só a ortodoxia, mas também o império.
     Em seu retiro, ao saber do que se passava na corte, Pulquéria ficava penetrada de dor, mas não pensava em intervir. Entretanto, o Papa São Leão suplicou-lhe encarecidamente que deixasse seu retiro e fosse em auxílio da Religião perseguida.
     Pulquéria voltou à corte para fazer cessar os abusos de que eram vítimas a Religião e o Império. Conseguindo falar a sós com seu irmão, o fez com tanta força e persuasão, que lhe tornou claro o abismo em que se tinha precipitado, apoiando Nestório contra São Cirilo de Alexandria. Teodósio II procurou remediar com novas leis o mal que tinha feito. E baniu da corte os instigadores da desgraça da irmã.
Única senhora do Império Romano do Oriente

    
Quando Teodósio II faleceu em 450, devido a uma queda de cavalo, sua viúva Eudóxia retirou-se para um convento em Jerusalém, onde terminou piedosamente seus dias. O que resta de seus inúmeros escritos demonstra que ela se tornou uma fervorosa católica, depois de ter, por más influências, apoiado os hereges.
    Com a morte do irmão, Pulquéria tornou-se única senhora do Império Romano do Oriente. Entretanto, para firmar sua autoridade, julgou seu dever dividi-la com o hábil general Marciano, viúvo, que juntava a um conhecimento profundo dos negócios um zelo ardente pela fé católica, incomum virtude e amor pelos pobres. Casou-se com ele, mas declarou-lhe o voto de virgindade que havia feito, e seu desejo de que Marciano o respeitasse. Assim ela o elevou ao trono imperial, vivendo ambos em continência.
     Tanto Marciano quanto Pulquéria opunham-se aos novos ensinamentos de Dióscoros e Eutiques, eivados de heresia. Por isso, Marciano informou ao Papa São Leão seu desejo de convocar um novo concílio, como era também desejo do Pontífice, para julgar os dois renitentes.
     O zelo de ambos pela ortodoxia mereceu-lhes grandes elogios da parte do Papa São Leão e dos padres reunidos nesse Concílio Ecumênico de Calcedônia, em 451, que condenou e excomungou novamente o heresiarca Eutiques, excomungou e depôs Dióscoros de sua Sé, e declarou São Flaviano mártir da fé.
     Os imperadores, para dar mais força a esse Concílio, assistiram pessoalmente a seis de suas sessões. Na sexta, Marciano e Pulquéria estiveram presentes com grande acompanhamento de todos os comissários imperiais e do senado. O imperador fez um discurso e foi lida a profissão de fé feita na sessão anterior, novamente aprovada pelos imperadores. Essa sessão terminou com alegres aclamações ao imperador e à imperatriz, que foram comparados a Constantino e Santa Helena.
     Santa Pulquéria trouxe então os restos mortais de São Flaviano para a capital do império, onde foram recebidos triunfalmente, e os sepultou junto aos seus predecessores na Sé de Constantinopla.
    Quando, ainda em 451, Átila enviou um ultimato aos imperadores para que lhes pagasse pesado tributo, sob pena de invasão, Pulquéria e Marciano responderam-lhe que tinham ouro para os amigos, e ferro para os inimigos. E recrutando novas tropas, guarneceram as fortalezas e se prepararam para a guerra, o que fez o huno desviar seus olhares para o decadente Império Romano do Ocidente, que com efeito atacou.
     Para aniquilar a heresia de Nestório, que negava a maternidade divina de Nossa Senhora, Pulquéria mandou construir no império três magníficas igrejas em honra da Mãe de Deus. Uma delas, especialmente bela, recebeu um quadro de Nossa Senhora de muito valor, que a Imperatriz Eudóxia lhe havia mandado de Jerusalém, e que era atribuído a São Lucas. O que comprova que a paz e o afeto haviam voltado a reinar entre as duas imperatrizes.
     Além de igrejas, Pulquéria construiu também hospitais, casas para peregrinos e, sempre preocupada com o decoro das casas de Deus, fez-lhes grandes doações. Também mandou trazer de volta para a capital imperial os ossos de São João Crisóstomo, que morrera no exílio. Sendo favorecida por uma visão, mandou buscar as relíquias dos 40 mártires de Sebaste, que foram encontradas próximo de Constantinopla.
     A grande imperatriz faleceu no dia 10 de setembro de 453, aos 69 anos. Durante a vida, havia sido a protetora da Igreja e dos pobres, e deixou em favor deles todos os bens de que podia dispor.
     Marciano executou fielmente o testamento de sua esposa, e continuou as boas obras que ela havia começado. E foi, por fim, reunir-se a ela em 457, depois de quatro anos de enérgico governo.
 
Fonte: http://catolicismo.com.br       Autor: Plinio Maria Solimeo
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Obras consultadas:
- Juan Bautista Weiss, Historia Universal, Tipografia La Educación, Barcelona, 1928, tomo IV.
- Edelvives, El Santo de Cada Dia, Editorial Luis Vives, Saragoça, 1955, tomo V.
- Pe. José Leite, S.J., Santos de Cada Dia, Editorial A.O., Braga, 1987, tomo III.
- J.P.Kirsch, Saint Pulcheria, The Catholic Encyclopedia, Online edition, www.NewAdvent.org
- Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, Paris, 1882, tomo XI.

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