sábado, 29 de agosto de 2020

Beata Teresa Bracco, Mártir da pureza – 29/30 de agosto



     Nasceu em 24 de fevereiro de 1924, penúltima de sete filhos, em Santa Giulia, no Piemonte, Itália. Seus pais, Ângela e Tiago Bracco, foram para ela um exemplo de fé e fortaleza cristã: em 1927 sepultaram em apenas três dias dois filhos de nove e quinze anos. Uma fé submetida ao cadinho da prova. Ângela abria todos os dias um grande livro de orações e aos domingos, após a missa, Tiago questionava as filhas mais velhas sobre a palavra ouvida e o sermão do padre.  No fim do dia, o próprio Tiago dirigia a oração do Rosário em família. O nome de Teresa ela recebera em honra da “pequena santa” de Lisieux, beatificada em 1923.
     Teresa só pôde frequentar até o quarto ano do primeiro grau, pois com o seu trabalho de pastorinha procurou contribuir para o sustento da família. Uma de suas companheiras da época testemunhou como ela sempre tentava trazer seu rebanho para onde Ginin estava (como era chamada Teresa na família). Por que? Porque Ginin sabia rezar o Rosário. Ela sempre estava com o terço e o seu trabalho diário era marcado pela alternância de Ave-Marias.
     Teresa era uma jovem extremamente reservada, modesta, delicada no relacionamento com as pessoas, sempre pronta a dar a sua ajuda. E bela: dois grandes olhos escuros e aveludados sobressaíam num rosto sereno e pensativo, emoldurado por grandes tranças castanhas. Bela, mas sem qualquer vaidade. Sabia atrair a admiração respeitosa dos conterrâneos: “Uma garota assim, eu nunca tinha visto antes e jamais vi depois”, afirmou um deles. “Havia nela algo de diferente das demais garotas”, recorda uma amiga. “Era a melhor de nós todas”, confia sua irmã Ana.
     Ginin – como era chamada – sacrificava de boa vontade preciosas horas de sono para poder comungar. A igreja não ficava tão perto de sua casa, e a missa era ali celebrada ao alvorecer. Mesmo assim, Teresa jamais renunciava à Santa Missa, por nada no mundo. A Eucaristia, a devoção à Nossa Senhora e a espiritualidade das obrigações, eis o segredo da sua santidade.
     Na casa da família Bracco chegava regularmente o Boletim Salesiano. No número de agosto de 1933, destacava-se em primeiro plano o retrato do pequeno Domingos Sávio, cujas virtudes heroicas a Igreja acabava de reconhecer. Teresa cortou a terceira página que trazia a figura de Domingos Sávio; o menino era filho de camponeses, como ela, e na escola de Dom Bosco havia chegado ao exigente propósito: “A morte, mas não o pecado”. A pequena – tinha apenas nove anos – ficou fascinada por ele, e colocou a página na cabeceira da cama. Desde então, o mote de Domingos foi também seu. Declarou guerra ao pecado: “Antes, eu me deixo matar”, escreveu. E manteve o propósito.
     Na manhã do dia 28 de agosto de 1944, depois de assistir a Santa Missa, Teresa encontrou um carregamento de esterco preparado por sua irmã Maria para ir e espalhar no campo de Braia. Ela, portanto, partiu para o trabalho que a esperava, mas depois de um tempo a notícia da chegada de tropas alemãs em sua aldeia chegou até ela. Pensando então na mãe deixada sozinha no local (seu pai falecera há apenas dois meses), ela abandonou suas ferramentas de trabalho para correr para casa.
     Diante da investida nazista, mulheres e crianças encontraram refúgio no desfiladeiro Rocchezzo. Os alemães invadiram e sequestraram as mulheres mais jovens, incluindo Teresa, como espólios de guerra. Mas ela, por amor aos ensinamentos evangélicos recusa vigorosamente a se submeter aos desejos do oficial nazista que a levou consigo, e tenta escapar pela floresta, mas ele a alcança e, tomado pela fúria, a estrangula, depois disparou um tiro de pistola no coração. Não satisfeito com tal ferocidade, com sua bota chutou-a na têmpora esquerda até romper seu crânio. Seu corpo torturado foi encontrado na floresta dois dias depois, em atitude de defesa suprema de sua integridade física. Teresa tentara inicialmente fugir às atitudes brutais do soldado; depois, vendo a inutilidade de seus esforços, preferiu renunciar à vida a perder a virtude tão ciosamente conservada.
     Uma morte inútil, dizem. Ela poderia ter sobrevivido à violência, como as outras duas meninas, e retornado em segurança para sua família. Por que se opor ao mal tão fortemente? Mas, poucos meses após sua morte, falava-se de alguém que havia recebido benefícios pela intercessão de Teresa. A fama do seu martírio espalhou-se assim pelas paróquias vizinhas enquanto a vox populi a aclamava como a nova S. Maria Goretti de Langhe.
     O seu sacrifício não foi senão o último de uma vida inteiramente vivida pelo Evangelho. Toda a dinâmica do assassinato foi esclarecida pelo exame dos restos feitos em 10 de maio de 1989, sob a ordem do tribunal eclesiástico. João Paulo II beatificou-a em Turim no dia 24 de maio de 1998, memória de Maria Auxiliadora, durante sua peregrinação ao Santo Sudário.
     Sua data de culto foi colocada no Martirológio Romano em 29 de agosto, enquanto a diocese de Acqui Terme e a Região do Piemonte a recordam em 30 de agosto.
     Que testemunho significativo para as jovens gerações do terceiro milênio! Que mensagem de esperança para aqueles que se esforçam para ir contra a maré do espírito do mundo! Que dela aprendam a fé quotidianamente vivida, a intransigente consistência moral, a coragem de sacrificar, se necessário, também a própria vida, para não trair os valores que dão sentido à vida!

Panorama de Langhe
Fontes: santiebeati e Bollettino Salesiano, Março, 2004

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Santa Mônica, mãe de Santo Agostinho – 27 de agosto


"... enquanto minha Mãe, Vossa fiel serva, junto de Vós chorava por mim, mais do que as outras mães choram sobre os cadáveres dos filhos" (Confissões, p. 83).

Forte de ânimo, ardente na fé, firme na esperança, de inteligência brilhante, sensibilíssima às exigências da convivência, assídua na oração e na meditação da Sagrada Escritura, Santa Mônica encarna o modelo de esposa ideal e de mãe católica.

     Santa Mônica entrou na História por meio da obra Confissões, de seu filho Santo Agostinho, escrita aproximadamente no ano de 397. Santo Agostinho tornou-se um venerável bispo, homem de grande virtude e grande sabedoria, alcançou também a santidade e é Doutor da Igreja.
     Mônica teria nascido no ano de 331 d. C. em Tagaste (Norte da África, distante 100 k de Cartago, atual Sukh Ahras, na Argélia), embora existam controvérsias quanto a esta data. Seus pais eram cristãos, que se mantiveram católicos durante o cisma donatista.
     Segundo Santo Agostinho, Mônica foi criada por uma dada (termo que designava uma escrava incumbida de vigiar as crianças filhas de seus senhores), que se caracterizou por sua religiosidade e também por sua rígida disciplina. Santo Agostinho conta-nos um caso em que sua mãe, ainda criança, foi severamente repreendida pela dada, pois começou a demonstrar gosto pelo vinho.
     Tal educação fez com que Santa Mônica também se tornasse uma mulher de grandes virtudes. Após receber o santo Batismo, conservou tal graça por toda a vida pela pureza da fé e santidade de vida.
     Seu casamento foi ajustado por seus pais com Patrício, membro da ordem dos decuriões do Conselho de Tagaste. Na qualidade de decurião, ele provavelmente possuía muitos bens, que incluía escravos, olivais e vinhas, o que colocava o casal numa razoável posição social. Mônica teria dezessete ou dezoito anos e Patrício cerca de quarenta anos de idade quando o casamento ocorreu.
     O marido era um homem rude e violento, fonte de muito sofrimento e provações para Mônica. Mas ela sofria tudo com muita paciência, mansidão e docilidade; não respondia a Patrício. Muitas eram as más línguas que procuravam semear a discórdia no lar da santa mulher, aconselhando-a a abandonar o marido violento, mas Mônica defendia o marido, e jamais tolerava que o difamassem em sua presença. Havia, naturalmente, um abismo entre marido e mulher; suas esmolas e seus hábitos de oração o irritavam, mas diz-se que ele sempre manteve uma espécie de reverência em relação a ela.
     Santa Mônica teve com Patrício três filhos, sendo dois homens, Agostinho e Navígio, e uma mulher, Perpétua, que se tornou religiosa. Agostinho, o filho mais velho, foi também fonte de grandes amarguras para a mãe.
     Apesar de nunca faltarem os bons conselhos da mãe, o filho era desobediente e se mostrava muito inconstante e volúvel. Por esses motivos, Santa Mônica achou por bem não o apresentá-lo para ser batizado, temendo que se o fizesse, poderia vir a perder a graça do Batismo. Agostinho, contudo, foi inscrito na preparação para receber o batismo.
     Naquela época o Cristianismo já tinha a aquiescência do Império Romano e é provável que Patrício tenha cedido aos apelos da esposa se convertendo e dando os primeiros ensinamentos cristãos a Agostinho.
     Mônica ficou viúva aos 39 anos e teve então que ocupar-se de toda a família. Agostinho perdeu o pai com dezessete anos, depois foi mandado para Cartago a fim de estudar num curso superior. Mônica ficava tão desolada com as notícias que recebia do filho, que chegou a proibi-lo de entrar em sua casa. Em Cartago Agostinho se tornou maniqueísta e quando voltou para casa ele ventilou certas propostas heréticas fazendo com que ela o afastasse de sua mesa com energia.  Mas Deus consolava o coração da pobre mãe, revelando-lhe a futura conversão do filho por meio de sonhos misteriosos. E isto fez com que ela aceitasse o filho em casa.
     Certa feita, Mônica fez súplicas a um bispo - provavelmente o de Cartago - para interceder junto a seu filho, já que seus pedidos não eram atendidos. O bispo teria respondido: “O coração de teu filho não está ainda preparado, mas Deus determinará o momento. Vai em paz e continua a viver assim, porque é impossível que pereça o filho de tantas lágrimas" (Confissões, p. 85).
     Quando Agostinho foi para Milão, Santa Mônica para lá se dirigiu para procurá-lo e vigiá-lo. Ali ela encontrou o grande Santo Ambrósio, e por meio dele ela finalmente teve a alegria de ver Agostinho se render, depois de dezessete anos de resistência. Mãe e filho passaram seis meses de verdadeira paz em Cassiacum.
     Tantas foram as orações, súplicas e penitências de Santa Mônica pela conversão de seu filho Agostinho, que na noite de Páscoa de 387 ele recebeu, com seu filho Adeodato, o santo Batismo na igreja de São João Batista, em Milão. Diante disto Santa Mônica afirmou: “Vendo-te hoje católico, nada mais me resta fazer neste mundo”.
     A África reivindicou-os, no entanto, e eles partiram em sua jornada, parando em Cività Vecchia e em Óstia. Foi lá que Mônica morreu no mesmo ano, aos 56 anos de idade. Mas antes, os dois santos tiveram um diálogo-êxtase em Óstia, numa das passagens mais famosas das Confissões.
     Santo Agostinho afirma que esse encontro foi obra dos "secretos desígnios de Deus": "Enquanto assim falávamos, anelantes pela Sabedoria, atingimo-la momentaneamente, num ímpeto completo do nosso coração" (Confissões, p. 228). Uma semana depois, ela caía com febre e falecia.
     Santa Mônica foi sepultada em Óstia e a princípio parece ter sido quase esquecida, embora seu corpo tenha sido removido durante o século VI para uma cripta escondida na igreja de São Aurélio. Por volta do século XIII, no entanto, o culto de Santa Mônica começou a se espalhar e uma festa em sua honra foi mantida em 4 de maio.
Túmulo de Santa Mônica na Igreja de Sto. Agostinho em Roma
     Em 1430, Martinho V ordenou que suas relíquias fossem transladadas para Roma. Muitos milagres ocorreram no caminho, e o culto de Santa Mônica foi definitivamente estabelecido, e mais tarde uma igreja lhe foi dedicada. Depois, o Arcebispo de Rouen, Cardeal d'Estouteville, construiu uma igreja em Roma em homenagem a Santo Agostinho e depositou as relíquias de Santa Mônica em uma capela à esquerda do altar-mor. A vida de Santa Mônica, no entanto, só apareceu no Breviário Romano no século XVI.
     Em 1850 foi estabelecida em Notre-Dame de Sion em Paris uma Associação de mães cristãs sob o patrocínio de Santa Mônica; seu objeto era oração mútua para filhos e maridos que tinham se desviado. Esta Associação foi em 1856 elevada ao posto de arquiconfraria e se espalhou rapidamente por todo o mundo católico, filiais sendo estabelecidas em Dublin, Londres, Liverpool, Sydney e Buenos Aires. Eugenio IV havia estabelecido uma confraria semelhante muito antes.

Fórmula para não brigar
     Mônica não era a única matrona de Tagaste cuja vida de casada era infeliz, mas, por sua doçura e paciência, ela foi capaz de exercer um verdadeiro apostolado entre as esposas e mães de sua cidade natal.
     Naquela região da África, onde as pessoas eram sumamente agressivas, as demais esposas perguntavam a Mônica porque seu marido era um dos homens de pior gênio em toda a cidade, mas não a agredia nunca, e, ao contrário, os esposos delas as agrediam sem compaixão.
     Mônica respondeu-lhes: "É que quando meu marido está de mal humor, eu me esforço para estar de bom humor. Quando ele grita, eu me calo. E como para brigar precisam de dois e eu não aceito a briga... não brigamos". Esta fórmula fez-se célebre no mundo e serviu a milhões de mulheres para manter a paz em casa.

Oração
     Nobilíssima Santa Mônica, rogai por todas as mães, principalmente por aquelas mães que se esquecem que ser mãe é sacrificar-se.
     Rogai, virtuosa Santa Mônica, para que abram-se os olhos e as almas de todas as mães, para que elas enxerguem a beleza da vocação materna. A beleza do sacrifício materno.
     Rogai, Santa Mônica, para que todas as mães saibam abraçar com Fé o sofrimento e a dor, assumam seus filhos com coragem, como instrumento de santificação para suas famílias, e para sua própria santificação. Amém.

Fontes:
HUGH T. POPE (Enciclopédia Católica)

Postado neste blog em 26 de agosto de 2011

terça-feira, 25 de agosto de 2020

Nossa Senhora de Knock (Nossa Senhora do Silêncio) – 21 de agosto

     
     O dia 21 de agosto de 1879 sempre será uma lembrança muito especial aos habitantes de Knock, e para todo o povo da Irlanda. A aldeia de Knock está situada a oeste de Dublin e a norte de Galway, no condado de Mayo.
     Em 1829, foi aí construída uma pequena e pobre igreja paroquial, onde não cabiam mais de 30 pessoas. Foi dedicada a São João Batista. Em torno da Igreja havia uma pequena escola para rapazes e outra para as mulheres. O terreno da igreja era rodeado por um muro de pedra.
     Também chamada de a “Ilha dos Santos”, devido a importante contribuição dos seus mártires na evangelização dos povos e no desenvolvimento do Cristianismo, a Irlanda passava por séria crise econômica, já há uma década.
     Durante todo o século XIX, a Irlanda sofreu uma depressão da sua economia por causa das más colheitas, sobretudo da batata. No ano de 1879, os agricultores quase não tinham o que comer. Nesse ano, houve mais uma desastrosa colheita de batata, o que anunciava mais miséria. As pessoas morriam de fome e de doenças, minadas por uma vida muito dura.
     O Pe. Bartholomew Cavanah foi nomeado prior da igreja em 1867. Era um santo homem, profundamente devoto de Nossa Senhora da Imaculada Conceição. Era de bom grado que sacrificava os seus bens materiais para ir em auxílio dos pobres e famintos. Também tinha muito zelo pelas pobres almas do Purgatório. Tendo a Virgem Maria como Mãe de Deus e de todos os filhos de Deus, recorria à sua intercessão por todos os que estavam no Purgatório.
     Alguns meses antes da aparição em Knock, o Pe. Cavanah começou a rezar 100 missas pelas pobres almas do Purgatório que Nossa Senhora mais desejasse ver libertas. Surpreendentemente, foi no dia da centésima missa que Nossa Senhora visitou Knock, ao final da tarde de 21 de agosto de 1879. 
     Nesse dia, o céu estava coberto de pesadas nuvens. O Pe Cavanah tinha ido visitar paroquianos em regiões vizinhas. Na mesma tarde, uma chuva cerrada encharcou suas roupas e a aldeia ficou toda molhada pela noite afora. Mary McLoughlin, sua empregada, acendeu a lareira para lhe secar as roupas e depois foi-se embora visitar uma amiga, Mary Beirne, que morava próximo.
     Mais ou menos ao mesmo tempo, um outro membro da família Beirne, Margaret Beirne, chegou à igreja para fechá-la durante a noite. Ela deu conta de um brilho estranho que vinha do lado sudoeste da igreja. Mas, com pressa de se abrigar, não olhou mais, nem disse nada a ninguém sobre o brilho naquela noite. Quando terminou a visita, a amiga Mary Beirne acompanhou Mary McLoughlinde de volta, em direção à igreja. Viram figuras iluminadas pela luz. Mas quando se aproximaram, Mary Beirne exclamou: “Mas não são imagens, estão a mexer-se. É a Santíssima Virgem!”
     A mais velha das videntes era Bridget Trench, de 75 anos. Caminhou em direção à visão e, sob a chuva, tentou beijar os pés de Maria Ssma., mas não conseguiu. Quando as mãos e a cabeça inclinada de Bridget entraram na área da visão, ela caiu de joelhos na erva seca. Nessa área, nenhuma gota de chuva lhe caiu.
     Os quinze videntes permaneceram junto à visita luminosa durante duas boas horas. Rezaram o Rosário em conjunto. Mais tarde, a aparição desvaneceu-se.
     Durante as semanas e meses que se seguiram à aparição, toda a aldeia continuava a perguntar: “Por que é que Nossa Senhora lhes tinha aparecido?” Multidões de pessoas começaram a afluir a Knock. Deram-se numerosas curas e várias delas foram relacionadas com a aplicação de terra retirada da parede da empena. Tanta terra foi retirada que a parede estava em perigo de cair. Nos primeiros três anos que se seguiram à aparição de “Nossa Senhora do Silêncio”, o Pe. Cavanah registrou aproximadamente 300 curas milagrosas associadas com o Santuário de Knock.
A Aparição
     Nossa Senhora tinha um longo vestido branco e, na cabeça, uma coroa brilhante com uma rosa na parte da frente. Suas mãos e olhos estavam voltados para o céu em atitude de oração. À sua direita, com uma túnica branca, São José mantinha a cabeça inclinada e ligeiramente voltada para sua esposa. À esquerda de Nossa Senhora estava São João Evangelista, com os paramentos de bispo: ele mantinha a mão direita levantada, como numa pregação, e segurava um livro na mão esquerda. No centro, via-se um altar grande e simples com um Cordeiro voltado para Oeste. Atrás dele, havia uma grande cruz e, ao seu redor, os anjos que ali ficaram durante toda a aparição, que durou cerca de 2 horas, sob chuva.
     A aparição tem um profundo simbolismo do livro do Apocalipse. O cordeiro é Jesus. A cruz é onde se oferece o Cordeiro ao Pai como sacrifício. O altar da Missa é onde o sacrifício se torna presente.
     Maria Ssma. e São João estavam ao lado da cruz. São José não estava ao lado da cruz, mas a morte não pode separá-lo da Sagrada Família e dos benefícios do sacrifício de Jesus. Aquelas pessoas, homens e mulheres de idades variadas, entre cinco e setenta anos, testemunharam a mesma cena. Curiosamente, apesar da chuva, todos tinham as roupas secas no final da aparição. Ainda sob o impacto do evento, foram juntas contar ao pároco. Este, após ser indagado por outras famílias sobre a claridade vinda da igreja, decidiu ir falar com o seu bispo.
     Os testemunhos foram recolhidos seis semanas depois por uma Comissão de Investigação criada pelo Arcebispo de Tuam, D. John MacHale, em outubro de 1879.
     As quinze testemunhas foram examinadas e a comissão informou que o testemunho de todos, tomados juntos, era confiável e satisfatório. O pároco de Knock recebeu uma mensagem do Arcebispo, dizendo que as evidências dos fatos davam como certa a aparição da Virgem naquela igreja, e que um representante do clero da Irlanda estava levando o processo para Roma.
     Em 1936, foi criada outra comissão diante da qual compareceram os três videntes sobreviventes: Mary O’Connell (Mary Byrne), Patrick Byrne e John Curry (*). Os três confirmaram as suas declarações originais de muitos anos atrás.
     Knock logo se tornou meta de peregrinação dos católicos irlandeses e devotos marianos de outros países.
     Em 1976, um novo e grande templo foi erguido no lugar da aparição. Há um complexo em Knock formado por cinco igrejas, incluindo a Capela das Aparições, uma igreja paroquial e a Basílica. Embora a igreja original ainda esteja de pé, ao lado dela foi construída uma nova Capela das Aparições.
     Ilustres personalidades da sociedade e do clero foram ao Santuário venerar Nossa Senhora de Knock, declarada Rainha e Padroeira da Irlanda e festejada no dia 21 de agosto.
     Cem anos depois da aparição, em 1979, o papa João Paulo II abençoou o local com sua presença na celebração do centenário. Meio milhão de peregrinos se juntaram no Santuário onde o Papa declarou a passagem da Igreja de Nossa Senhora, Rainha da Irlanda, a Basílica.

(*)  John Curry, o menininho de 5 anos que viu Nossa Senhora
     Durante as entrevistas com a comissão de investigação responsável por estudar o caso, John declarou que tinha visto “belas imagens da Virgem e de São José”. Outra criança que presenciou a aparição foi Patrick Hill, de 11 anos: ele relatou que o pequeno John lhe havia pedido que o levantasse para poder “ver os bebês grandes, como ele chamava as imagens”.
     Em uma carta escrita anos depois, John contou que se lembrava de ter visto São João com um livro e que outra vidente, Brígida Trench, tentou beijar os pés de Nossa Senhora. Quando foi entrevistado por outra comissão de investigadores, 58 anos depois, John afirmou que as imagens estavam vivas, mas não falavam, e que Nossa Senhora estava vestida de branco.
Uma vida humilde
     Tanto John quanto os outros videntes viveram de modo simples e anônimo – a tal ponto que, em vários dos relatos históricos John nem sequer é mencionado de modo individual.
     John Curry emigrou da Irlanda para Nova Iorque em 1897. Três anos depois, se mudou para Londres e, em 1911, retornou aos Estados Unidos. Já idoso e adoentado, foi viver em Long Island sob os cuidados da Congregação das Irmãzinhas dos Pobres. Ele nunca se casou. Ajudava na Missa diariamente e manteve uma viva devoção à Nossa Senhora, testemunhando que ela jamais lhe negou nada que lhe tivesse pedido.
     Ele tinha 68 anos quando morreu em 1943 e foi enterrado no Cemitério da Ressurreição, em Farmingdale, Long Island, propriedade das Pequenas Irmãs dos Pobres.
     No entanto, ele não deveria ser enterrado para sempre na obscuridade em uma cova não marcada. Quando em 2015 o Cardeal Timothy Dolan de Nova York liderou uma peregrinação para Knock, ele soube da história de John Curry pelo Pe. Richard Gibbons da paróquia de Knock. As pessoas da terra de seu nascimento e da terra de sua adoção começaram a corrigir uma negligência. Os restos mortais de John Curry foram removidos de seu túmulo em Long Island e reenterrados na Catedral de São Patrício, em Manhattan, com o Cardeal Dolan presidindo. Certificando-se de que sua memória fosse honrada, uma laje memorial lembrando sua presença na aparição foi colocada.
     Toda aparição mariana tem um propósito e um significado. Talvez o silêncio de Knock tenha uma mensagem para nossos tempos turbulentos, especialmente para a Igreja Católica de hoje, tão vilipendiada, perseguida, negada. Quando Maria Santíssima, São José e São João apareceram, eles o fizeram a um povo que estava agarrado à sua fé apesar de um tempo de dificuldades, sofrimento e privação. 

Fontes:
Portal Paulinas - https://catholicus.org.br/ 
(Via ACI Digital) - https://pt.aleteia.org/ 

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Santa Emília de Vialar, Fundadora - 24 de agosto

  
     Em agosto de 1835 um navio francês atracava majestosamente no porto de Argel, “a cidade branca". Ao som de marchas militares, entre gritos da multidão e o estrondo da artilharia, quatro humildes religiosas desembarcam e passam pela fila de soldados que apresentam armas. Entretanto, aquelas honrosas demonstrações não eram para elas. Toda aquela movimentação era causada pela chegada do novo governador geral, Mal. Clauzel, que havia vindo no mesmo navio.
     Com ele também fizera a travessia o Barão de Vialar, irmão de Emília, fundadora de uma nascente instituição, as Irmãs de São José da Aparição, que nos primeiros passos de sua existência já se sente com brios para levar à África maometana a mensagem de Cristo, “desfraldando diante dela todas as formas da caridade”.
     Emília de Vialar havia nascido na graciosa cidade de Gaillac, banhada pelas águas do Tarn, no Languedoc. A cerimônia do batismo foi celebrada no dia 12 de setembro de 1797 na igreja paroquial de São Pedro, sem a alegria dos sinos, pois por ordem do Comitê da Saúde Pública eles haviam sido fundidos, convertendo-se em canhões.
     Emília era a mais velha dos três filhos. Seu irmão Agostinho De Vialar permaneceu toda a sua vida um verdadeiro amigo e colaborador dedicado em todos os seus empreendimentos admiráveis e de caridade. O irmão mais novo era Maximino.
     Ali, em uma quinta senhorial, passou sua infância; à sombra de uma esplêndida acácia a menina aprendeu a ler no livro que sua mãe, a Baronesa de Vialar, lhe apresentava. A delicada saúde da mulher a impediu de continuar o doce e ao mesmo tempo duro magistério, e decidiu enviar sua filha à escola. A escolha não era fácil, porque apesar da concordata firmada conjuntamente pelo Papa e por Napoleão, as casas religiosas ainda estavam fechadas. A única professora da região era uma antiga revolucionária! Não havia escolha e por 6 anos a menina frequentou aquela escola, sem que se estabelecesse uma simpatia entre ela e a mestra.
     Em setembro de 1810, a família Vialar foi a Paris para apresentar a jovenzinha às religiosas da Congregação de Nossa Senhora, fundada no século XVIII por São Pedro Fourier, que geriam o célebre pensionato de l´abbaye-au-Bois, cuja reabertura era recente. Foi o último gesto de sua piedosa mãe, que no dia 17 daquele mês expirou, aos 34 anos de idade. Assim se iniciava a Via Crucis de Emília.
     Aos 13 anos fez sua 1ª. Comunhão na capela do convento em que se educava, e Jesus tomou posse da alma da menina. De volta à casa da família em Gaillac, depois de uma estadia no pensionato, Emília se depara com a vida frívola da pequena cidade. Referindo-se àquela época, ela diria: “Apenas se frequentava os sacramentos”.
     Mas Nosso Senhor cuidava dela. “Um dia, escreve, estando sozinha na casa de temporada no campo, fui como que transportada em Deus. De súbito me senti dominada, quase deslumbrada por uma luz brilhante que me envolvia. Pareceu-me que ela vinha do céu, e para lá dirigi meus olhos, colocando-me de joelhos. Isto durou só uns instantes; embora fosse grande o arroubamento que este toque da graça produziu não me fez perder o uso das faculdades. O favor assinalado que o Senhor me concedeu me impulsionou a tomar a resolução de pertencer inteiramente a Ele”.
     A missão solene pregada em 1816 na igreja de São Pedro, “a primeira que se celebrava depois da revolução”, tornará forte seus propósitos generosos e acabará com todas as bagatelas sedutoras do mundo. A partir daquele ano as graças cairiam incessantes sobre a alma de Emília. Desta época é uma visão inesquecível que ela teve ao rezar diante do Santíssimo Sacramento. Ela vê Jesus sobre o altar e o que mais chamou sua atenção foram as cinco chagas que ela via com toda clareza. Tão gravada ficou aquela visão, que em honra das cinco chagas ela prometeu rezar diariamente cinco Pai Nossos e Ave-Marias, promessa que suas filhas cumpririam fielmente.
     O novo pároco da igreja de São Pedro passou a dirigir a alma de Emília, que foi pouco a pouco vencendo suas dificuldades espirituais. Os galantes saraus “em que só se falava de modas e de acontecimentos políticos” cedem espaço para as visitas aos pobres. Cada manhã apresentam-se ao aristocrático saguão de sua residência todas as misérias da cidade, a despeito dos protestos exasperados da velha governanta. Esta caridade chega ao mais alto grau no inverno de 1830, quando as águas do Tarn se converteram em uma longa faixa de gelo. Humildemente vestida, percorre as ruas levando pesados sacos de trigo. Esses esforços lhe causaram a hérnia que mal cuidada haveria de causar sua morte anos mais tarde.
     A noite de Natal de 1832 será para sempre uma data histórica nos anais da Congregação das Irmãs de São José da Aparição. Quando os sons da alegria festiva ecoavam de cada casa, quatro jovens atravessavam as ruas estreitas até sua nova moradia, onde pretendiam levar uma vida consagrada a Deus em dedicação aos pobres. Emília com outras três companheiras se recolheram na casa que ela havia adquirido, contigua à igreja paroquial de São Pedro, no mais rigoroso segredo. Seu avô, o Barão de Portal, havia falecido deixando para a neta uma herança que possibilitou financiar a fundação projetada. Emília, filha exemplar, temendo a injusta oposição de seu irritável pai, deixou uma carta cheia de ternura, com a qual se despedia dele e do lar tão querido.
     Desde o primeiro momento a fundadora se colocou sob o patrocínio do Patriarca São José. No Museu de Toulouse existe um quadro de mediano mérito que feriu vivamente a imaginação de Emília. Representa o Arcanjo anunciando em sonho o grande mistério da Encarnação a São José. Suas filhas também anseiam praticar a caridade do modo mais excelso, levando até os confins da terra o jubiloso anúncio da Encarnação.
     Protegidas pelo novo bispo de Albi, Mons. De Gualy, elas viveram ali por dois anos, enquanto afluíam muitas jovens “à Ordem de Santa Emília”, como diziam as más línguas. Na realidade o Instituto não tinha ainda regras nem constituições, mas para estender o voo sobre o mundo infiel lhe basta o sopro do Espírito Santo.
     Sem que me desse conta, escreveria a fundadora, eu notava um sentimento vivíssimo que arrebatava meu coração aos países infiéis”. Desde suas visitas ao avô em Paris, nunca deixava de entrar na igreja das Missões da Rue du Bac. Por outro lado, sem sair de Gaillac, tinha o costume de visitar a igreja do bairro de São João de Cartago, em que havia uma capela dedicada a São Francisco Xavier. “Aos 18 anos, precisa a Santa, fiz o voto de invocar diariamente este grande Santo”.
     Agostinho de Vialar, que se transladara para a Argélia, envolta ainda na aureola da recente conquista, chamou sua irmã a pedido do Conselho da Regência. Para lá foram as audazes monjas para travar uma luta desigual contra a violenta epidemia do cólera que dizimava a população. Os muçulmanos ficam presos pelas malhas de uma caridade tão extraordinária. O punhado de almas se multiplica e pouco depois de desembarcar em Argel, a fundadora se apressou em adquirir uma grande casa, que se tornou um asilo providencial para desvalidos.
     Em dois anos, quantas obras! Um noviciado, um hospital, uma enfermaria-farmácia, uma escola gratuita, um asilo...
     A Santa interrompe brevemente sua estadia em Argel para conseguir a aprovação das constituições do Instituto e selar a reconciliação com seu pai. Sem perda de tempo retorna ao continente africano. Uma cadeia ininterrupta de lutas e sofrimentos se abre diante dela, junto com um esperançoso número de fundações.
     “Será a Chantal, a Teresa de nossos tempos”, escreve, aludindo a Fundadora, sua amiga Eugênia de Guérin. “Vereis as maravilhas que ela faz. Entre os árabes do interior a Santa se põe a curar o chefe das tribos do deserto”. “Tanta é a confiança que lhe inspiro, escreveu Emília, que ao apresentar-lhe um remédio tendo provado antes para animá-lo a beber, me disse com um ar ofendido: ‘Por que fazes isto? De tuas mãos eu tomarei sem receio algum!’
     Depois desses centros africanos, ela fundou outras casas em rápida sucessão e enviou suas Irmãs para missões distantes na Austrália, Mianmar (Birmânia) e Terra Santa etc.
     Onde quer que as Irmãs fossem, experimentavam a proteção e o cuidado de São José, seu patrono, o amor e a orientação da Santíssima Mãe Maria; como consequência, as irmãs se desenvolviam maravilhosamente bem. Elas ensinavam nas escolas, cuidavam dos órfãos, visitavam os doentes em suas casas, abriam dispensários e hospitais, davam socorro e refúgio a todos necessitados.
     Andarilha incansável, Madre Emília, depois de um longo périplo por Gaillac, Paris e Roma, onde coloca os alicerces para outra fundação, volta de Túnis a Argel. Uma tormenta caiu sobre o navio que foi forçado a fundear nas costas de Malta. Emília desembarca e logo dá início a duas fundações. Permaneceu por onze meses naquela ilha florescente de promissoras vocações.
     Mas para que tantas obras fossem possíveis, a Santa teve que sofrer muito. A fundação de Argel foi a primeira e a mais acirrada, porque ela teve que defender os direitos de sua nascente Congregação não contra as hordas revolucionárias, nem contra as autoridades anticlericais, mas contra o pastor da diocese, Mons. Dupuch que tentou imiscuir-se no regime interno da Instituição. Ela não cedeu e sua resistência foi qualificada de rebeldia: o prelado se utilizou de interditos e da privação dos sacramentos. Após três anos de intermináveis perseguições, as Irmãs são obrigadas a deixar Argel.   
     Outra prova sacudiria a Congregação. Uma das cofundadoras, Paulina Gineste, dilapidou os bens da comunidade de Gillac e se colocou contra a fundadora; em vez que dar conta de sua péssima administração, levou a fundadora aos tribunais, terminando por atraiçoá-la semeando cizânia entre as religiosas, várias das quais seguiram a filha pródiga. Foi preciso deixar aquele ninho em que a Congregação ensaiou seus primeiros passos.
     Em 1847 a comunidade reduzida se estabeleceu em um modestíssimo imóvel de Toulouse. Ali também sofre revezes e por fim, em agosto de 1852 a sofrida expedição chegou a Marselha, a “terra prometida”, como chamam acertadamente os biógrafos de Santa Emília de Vialar.
     Dois anos mais tarde, a fundadora, sofrendo violentas dores devido a hérnia estrangulada, descansaria placidamente na paz do Senhor. Havia sido fiel ao seu lema: “Entregar-se e morrer!” À sua morte, mais de 40 missões haviam sido fundadas pelo Instituto das Irmãs de São José da Aparição.
     Madre Emília, alma gigante que soube conciliar as duas vidas ativa e contemplativa, ascendeu à glória dos altares em 24 de junho de 1951, juntamente com Santa Maria Mazzarello, a cofundadora de São João Bosco.
     Em 1914, os sagrados restos da fundadora foram trasladados do cemitério de São Pedro para a Casa Mãe de Marselha. Segundo o epitáfio, “governou (a Santa) durante 20 anos com uma grande suavidade e um zelo admirável”.
     O decreto de louvor, dado em 6 de maio de 1842, estabeleceu sua Congregação como um Instituto de Direito Pontifício. A Santa Sé aprovou suas Constituições em 1862.

Etimologia: Emília = Aquela que é amável e gentil, de origem grega.
Panorama de Gillac
Fontes:
Juan José Pérez Ormazábal | Fuente: Mercaba.org

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Beata Vitória Rasoamanarivo, Viúva e Princesa de Madagascar - 21 de agosto

    
     A Beata Vitória Rasoamanarivo, nasceu em 1848 na cidade de Tananarive na grande Ilha de Madagáscar (*), e pertencia a uma das mais poderosas famílias dos Hovas: seu avô materno foi primeiro ministro por vinte anos quando era rainha Ranavalona (1832-1852) e era irmã de Rainilaiarivony, que exerceu a mesma função por mais de 30 anos, de 1864 a 1895.
     Segundo o uso do país, foi adotada pelo irmão mais velho do pai, de quem se sabe pouco; o tio Rainimaharavo era comandante geral do exército malgaxe.
     Rasoamanarivo (este era seu nome original) cresceu recebendo, principalmente da mãe, uma ótima educação moral e seguia a religião idolátrica dos seus ancestrais. Mas quando alguns missionários franceses chegaram a Madagáscar, e se estabeleceram em Tananarive, ela ingressou na escola das Irmãs de São José de Cluny, abraçou a fé católica e aos 15 anos de idade, no dia de Todos os Santos de 1863, foi batizada, recebendo o nome de Vitória.
     Madagáscar sofria então influência colonial da França, o que resultava em descontentamentos e tumultos; quando o Rei Radana II, considerado demasiado amigo da França foi afastado, se desencadeou uma perseguição mais ou menos aberta contra a missão católica, pois a nacionalidade francesa dos missionários supunha um apoio aos interesses coloniais da França.
     Vitória teve que suportar a insistência de seu pai adotivo que procurava convencê-la a deixar a fé católica e retornar ao paganismo, ou abraçar a fé anglicana, que naquele tempo estava bem radicada em Madagáscar. Vitória resistiu com firmeza a todos os pedidos, ameaças e até castigos corporais. Pensou mesmo em ingressar num convento. Todavia os missionários foram de parecer que isso era uma imprudência e aconselharam-na a permanecer na família e a ser apóstola no mundo.
     Finalmente ela contraiu matrimônio em 13 de maio de 1864, perante um sacerdote católico, com o jovem Radriaka, filho do primeiro ministro e comandante do exército. O marido era um homem dissoluto, o que provocou tais sofrimentos à jovem esposa, que chegou a ser aconselhada pelos parentes a se divorciar. Ela, porém, cônscia da indissolubilidade do matrimônio e certa de que provocaria escândalo perante a opinião pública uma princesa católica se divorciar, preferiu aguentar a dolorosa situação até à morte de Radriaka, que ocorreu em 1887.
      Em 1883, a leve perseguição diária que os católicos sofreram se tornou mais severa durante a guerra franco-malgaxe. Todos os missionários estrangeiros foram expulsos de Madagascar. Ao saírem, os sacerdotes confiaram os católicos do país a Vitória, assim como os Apóstolos foram deixados aos cuidados da Santíssima Virgem.
     Vitória era a mulher perfeita para esse trabalho. Quando o governo trancou as igrejas, ela se apresentou diante da rainha e do primeiro-ministro para objetar. Quando colocaram soldados do lado de fora para barrar a entrada para a oração, Vitória calmamente se aproximou dos homens armados, dizendo: “Se você deve ter sangue, comece por derramar o meu. O medo não nos impedirá de nos reunir para a oração”. Ela os encarou e, depois, levou a comunidade reunida para a igreja. Embora a Eucaristia tivesse acabado e não houvesse Missa, ainda assim eles rezaram. Vitória explicou: “Coloco diante de mim os missionários que rezam a Missa e assisto, mentalmente, a todas as missas que estão sendo ditas em todo o mundo”.
     Victoria viajou por toda a ilha encorajando as comunidades católicas, garantindo que elas tivessem uma catequese adequada e defendendo-as diante dos abusos do governo. Quando em 1886 os sacerdotes foram readmitidos, encontraram uma comunidade de 21.000 católicos em chamas por sua fé. A própria Vitória reconheceu que se tivesse se tornado uma religiosa como esperava, nada disso teria sido possível. Segundo uma expressão malgaxe, tornou-se “Pai e Mãe” dos fiéis e a coluna da Igreja, que ficou privada de seus pastores.
     Pelos seus magníficos exemplos de vida autenticamente cristã, conquistou a simpatia e o respeito de todos: povo e autoridades.
     Não muito tempo depois do retorno dos missionários, a fidelidade de Vitória ao marido foi recompensada. Em 1888, ele sofreu uma queda; quando ficou claro que seus ferimentos eram fatais, ele pediu o batismo. Vitória o batizou e viu o fruto de anos de sacrifício quando seu marido morreu em estado de graça. Ela passou os seis anos seguintes rezando, servindo, amando, e quando o tio que a perseguiu caiu em desgraça com a corte, ela demonstrou o quanto se importava por ele.
     Sofreu várias enfermidades com grande paciência. Finalmente, aos 46 anos, essa líder forte e corajosa faleceu no dia 21 de agosto de 1894, aos 46 anos. Foi grande o pesar do povo. Embora não desejasse, foi sepultada triunfalmente no mausoléu de seus antepassados em Tananarive.
     A causa de sua beatificação foi iniciada somente em 14 de janeiro de 1932. Depois do processo canônico e da comprovação de um milagre atribuído à sua valiosa intercessão, foi beatificada pelo papa João Paulo II em 29 de abril de 1989, em Antananarivo, Madagáscar.  
     Em seu dia de festa, 21 de agosto, vamos pedir a ela para termos a coragem de enfrentar toda perseguição e isolamento. Beata Vitória Rasoamanarivo, rogai por nós!

Fontes:
AAS 84 (1992) 493-6; L'OSS. ROM. 7.5.1989. 

(*) Madagascar é a quarta maior ilha do mundo, depois da Groenlândia, Nova Guiné e Bornéu. Em 2018, a população estimada era de 26.2 milhões. Em 2011, estimava-se que 41% dos habitantes pertenciam a alguma denominação cristã (católicos, luteranos e anglicanos). A ilha situa-se a 200 milhas da costa da África, no Canal de Moçambique no sul do Oceano Índico. A capital, Antananarivo, fica mais ou menos no meio da ilha. Madagascar é também chamada de “a grande ilha vermelha” por causa dos seus solos avermelhados, ruins para a agricultura.
     Os primeiros grupos humanos a chegarem à ilha foram os malaio-polinésios há dois mil anos. A partir do século X começam a migrar povos africanos e comerciantes árabes. Os árabes batizaram a ilha de "Jaziral al Gamar", que em português significa "Ilha da Lua". Nesse período algumas cidades malgaxes como Ilharana e Nosy-Manja já realizavam comércio com mercadores árabes e indianos.
     Os portugueses foram os primeiros europeus a chegarem à ilha, no século XV. Em 1500 o navegador Diogo Dias batizou a ilha de São Lourenço. Os franceses fundaram em 1643 Fort Dauphin, atual Toliara no extremo sul da ilha, que serve como base de proteção às possessões francesas nas Ilhas Reunião.
     A França estabeleceu o protetorado na ilha em 1885, com a derrota da rainha Ranavalona III, que dois anos mais tarde também foi exilada na Argélia, e Madagáscar passou a ser uma colônia. Em 1905 foi estabelecida a União Malgaxe, em que os merinos com ajuda francesa conquistaram definitivamente a ilha.
 
Panorama da capital, Antananarivo
Postado neste blog em 20 de agosto de 2012

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Beata Leopoldina Naudet, Virgem e fundadora - 17 de agosto


     Leopoldina Naudet nasceu em Florença no dia 31 de maio de 1773, sendo seu pai José Naudet, francês, e sua mãe, Susanna d’Arnth, alemã, ambos a serviço dos arquiduques de Lorena. Aos três anos Leopoldina ficou órfã de mãe e em 1778, quando tinha cinco anos, foi enviada, com sua irmã Luísa, ao mosteiro do Castelo de S. Frediano do convento de S. José. Em 1783, foi para a França, a fim continuar os estudos e terminar sua instrução no convento das Damas de Nossa Senhora de Soissons, cidade de origem de sua família.
     Leopoldina se destacava por seu comportamento e por seu espírito de oração, tanto que recebeu a Crisma e a 1a. Comunhão respectivamente em 1781 e 28 de março de 1782.
     Em 1789 Leopoldina e a irmã retornaram a Florença, ocasião em que faleceu também o pai. Foram então convidadas a prestar serviços de camareira junto à corte do Arquiduque Leopoldo, no Palácio de Pittia. Leopoldina dirigiu a instrução dos filhos do grão-duque e quando este tornou-se Imperador Habsburgo em 1790, acompanhou-o à Viena. Naquela cidade, Leopoldina entrou em contato com um jesuíta, Pe. Nikolaus von Diessbach, que se tornou seu diretor espiritual. Este sacerdote havia fundado a Amicizia Cristiana, um grupo seleto e secreto composto de leigos e eclesiásticos, dedicado à difusão da imprensa católica. Embora vivendo na corte mais faustosa da Europa, Leopoldina não se deixou atrair por sua vida mundana.
     Em 1792, com a morte do Imperador Leopoldo, passou ao serviço da Arquiduquesa Maria Ana Fernanda, irmã do novo imperador Francisco II, e quando esta foi nomeada abadessa do canonicato de S. Jorge de Praga, as irmãs Naudet e algumas nobres, acompanharam-na na nova residência real na Tchecoslováquia.
     O piedoso ambiente criado pela arquiduquesa favoreceu em muito um desejo íntimo de viver uma vida mais religiosa. Dissuadida por seu diretor espiritual a entrar na Trapa, em 1799 encontrou o Pe. Nicolau Paccanari, que após a dissolução da Companhia de Jesus havia procurado reviver o espírito de Santo Inácio de Loyola fundando os Padres da Fé. Este sacerdote também havia planejado a criação de um Instituto feminino, as Diletas de Jesus, com finalidade educativa. Persuadida por seu diretor espiritual, Leopoldina passou a amadurecer o projeto, que teve o apoio e o empenho direto da Arquiduquesa Maria Fernanda.
Viena no sec. XVIII, por Canaletto
     Em 31 de maio de 1799, na capela privativa da arquiduquesa na Abadia dos Beneditinos de Praga, junto com mais duas mulheres, pronunciou os votos temporários, empenhando-se em viver “para a maior glória de Deus e proveito para o próximo”.
     Com o objetivo de obter aprovação ao novo Instituto, retornaram à Viena para prosseguir para a Itália. Em 1800 tiveram um encontro pessoal com o Papa Pio VII, em Pádua, que as encorajou a prosseguir nos trabalhos; assim, deslocaram-se por diversas cidades italianas e chegando à Roma em fevereiro de 1801, foi organizada uma comunidade, e Leopoldina foi nomeada superiora. Sua iniciativa foi levada para outras casas na França e na Inglaterra.
     Em 1804, devido a acusações que circulavam contra o Pe. Paccanari, os Padres da Fé e as Diletas resolveram seguir um caminho autônomo; estas últimas deram origem à Sociedade do Sagrado Coração, sob a direção de Madalena Sofia Barat (canonizada em 1925), que já era superiora das Diletas francesas desde 1802.
     Em 1805 Leopoldina deixou Roma, com suas coirmãs, indo para Pádua e depois para Verona, a conselho do Mons. Luís Pacífico Pacetti, pregador apostólico e amigo de Pio VII. Ele era diretor espiritual da Marquesa Madalena de Canossa (canonizada em 1988), empenhada em fundar um instituto caritativo assistencial, dedicado também ao ensino das classes mais pobres: era o primeiro núcleo das Filhas da Caridade. Leopoldina ofereceu a colaboração dela e de seu grupo à iniciativa da marquesa, e em 8 de maio de 1808 a seguiu no mosteiro dos Santos José e Fidêncio. Madalena teve por ela uma tal estima, que a nomeou superiora também de suas discípulas.
     Entretanto, a espiritualidade de Leopoldina era muito diferente, ela se sentia mais orientada a uma vida claustral e, no serviço apostólico, projetava dedicar-se às jovens das classes altas. A sua experiência a serviço do imperador, de fato a havia persuadido da necessidade de influenciar aquele ambiente onde as senhoras eram atraídas a levar uma vida frívola que, como consequência, as afastavam dos mais pobres.
     A comunidade canossiana tinha como diretor espiritual São Gaspar Bertoni, fundador da Ordem dos Estigmatinos (Congregação dos Sagrados Estigmas de Nosso Senhor Jesus Cristo), canonizado em 1989. Dirigida por seus conselhos, Leopoldina cresceu no espírito do mais puro abandono em Deus e estudou as regras de outras congregações religiosas, para criar uma toda sua. Foi sob a direção, orientação e preparo para seu crescimento espiritual, que São Gaspar Bertoni incentivou Leopoldina a fundar uma congregação de religiosas.
     No ano de 1816, Leopoldina deixou a Marquesa Canossa, que continuou a ter por ela grande estima, e com seu grupo estabeleceu-se em Verona, no ex convento de Santa Teresa de Verona, chamado popularmente “das Teresas”, onde teve início a Congregação das Irmãs da Sagrada Família. Este nome era devido a uma intuição que Leopoldina tivera cinco anos antes, enquanto rezava. Assim ela descreve nas suas notas intimas: “Na oração pensei em criar o Instituto sob a proteção da Sagrada Família, e para manter-se tomar a imitação de Jesus Cristo, tanto na sua vida escondida, como na pública”. As Irmãs firmavam votos monásticos, vivendo em clausura, porém, abertas ao apostolado educativo das moças nobres que viviam como internas no convento, mas que estudavam em escolas externas.
As Irmãs da Sagrada
Família 
     Por este motivo Leopoldina abriu um educandário para as jovens nobres provenientes de todo o reino Lombardo-Vêneto, não só de Verona. Além disto, inaugurou escolas externas, completamente gratuitas, para as crianças e as jovens não ricas. Mais, desejava que suas casas religiosas estivessem abertas para acolher encontros formativos e exercícios espirituais, bem como um oratório para as muito jovens.
     Em 20 de dezembro de 1833, o Papa Gregório XVI aprovou o Instituto. Madre Leopoldina exclamou, enquanto tinha nas mãos a carta com o decreto, erguendo os olhos ao céu: “Basta isto. Deus mais nada deseja de mim. Agora posso dizer: ‘Nunc dimittis...’” Não muito tempo depois adoeceu, com fortes febres. Pareceu recuperar-se, mas teve uma recaída: a fundadora morreu em 17 de agosto de 1834. Seu corpo foi trasladado em 1958 para a capela da Congregação na cidade de Verona.
     Em 29 de abril de 2017 ocorreu a beatificação da Madre Leopoldina Naudet em Verona, na Basílica de Santa Anastásia, pelo Cardeal Ângelo Amato, Prefeito da Congregação da Causa dos Santos. A sua memória litúrgica, para as Irmãs da Sagrada Família e a diocese de Verona, é o 17 de agosto, dia de seu nascimento para o Céu.

Fontes:
www.santiebeati/it Autores: A. Borrelli e E. Flocchini

Postado neste blog em 16 de agosto de 2017