O mosteiro das carmelitas de
Compiègne, França, vivia entregue ao espírito de oração, de silêncio e de
renúncia, quando rebentou a Revolução Francesa.
Em 13 de fevereiro de 1790 um decreto
suprime as ordens religiosas; as carmelitas deviam deixar o mosteiro, mas todas
afirmam “querer viver e morrer naquela
casa santa”. A 4 de agosto de 1790, os membros do diretório do distrito
procederam ao inventário dos bens da comunidade. As religiosas foram “convidadas”
a despir o hábito e a abandonar o mosteiro.
Cinco dias mais tarde, a conselho da Câmara, todas assinaram o juramento
de Liberdade-Igualdade. Desde então,
vivem dispersas.
Um século antes, uma Irmã chamada
Elisabeth Batista vira em sonho todas as religiosas do seu convento na glória,
revestidas do manto branco e tendo uma palma na mão... Reservava-lhes o céu a honra do martírio?
Durante o ano de 1792, as monjas fizeram
um ato de consagração pelo qual se oferecia a comunidade “em holocausto para apaziguar a ira de Deus e para que a divina paz, que
o Seu querido Filho tinha vindo trazer ao mundo, fosse transmitida à Igreja e
ao Estado”. E cada dia era renovada
a consagração, mantendo uma chama que não devia extinguir-se em cada uma, senão
sob o cutelo da guilhotina.
Todavia, mesmo dispersas, a regularidade
da vida de cada grupo não passou despercebida aos jacobinos de Compiègne. Decidiram estes fazer uma inspeção, durante a
qual se apoderaram de vários elementos que lhes pareceram gravemente
comprometedores: cartas de padres em que se tratava de novenas, escapulários e
direção espiritual, um retrato de Luís XVI e imagens do Sagrado Coração. O
grupo revolucionário, “considerando que
as anteriormente religiosas, com desprezo das leis, viviam em comunidade”;
que as correspondências provavam “que
elas tramavam em segredo pelo restabelecimento da monarquia e pela aniquilação
da república”, mandou deter as religiosas e mantê-las incomunicáveis.
A 22 de junho de 1794, foram encerradas no
Mosteiro da Visitação, transformado em cárcere.
Lá, as reclusas retrataram o juramento feito de Liberdade-Igualdade, “preferindo mil vezes morrer a manterem-se
culpadas de tal juramento”. E julgaram-se felizes por terem retomado em comum
os exercícios da Regra. Mas esta
consolação depressa lhes seria tirada.
A 12 de julho, chegava a Compiègne a ordem
da Comissão de Salvação Pública para serem levadas a Paris. Sem lhes ser permitido acabar a sua frugal
refeição, nem mudar os vestuários molhados por causa duma barrela que faziam,
meteram-nas todas em duas carroças, ficando elas com as mãos presas atrás das
costas. O cortejo chegou à Paris no dia
seguinte, pelas três horas da tarde, à Conciergerie, a prisão anexa ao palácio
da justiça.
Uma religiosa octogenária e doente, com os
membros entorpecidos por demorada imobilidade, não sabia como descer da
carroça. Impacientes, os carreteiros pegaram nela e atiraram-na ao chão com
brutalidade. Ergueu-se toda
ensanguentada, mas contentou-se com dizer aos que a tinham tratado assim: “Acreditai que não vos quero mal por isto. Ao
contrário, quero-vos muito bem porque não me matastes, pois, se eu tivesse
morrido, teria perdido a felicidade e a glória do martírio”.
Na Conciergerie, como em Compiègne,
prosseguiram as 16 carmelitas em observar a regra; testemunha digna de fé
asseverou que “eram ouvidas todas as
noites, às 2 da manhã, rezar o Ofício”.
A 16 de julho, celebraram a festa de Nossa Senhora do Carmo com tal
entusiasmo que, segundo afirmou um preso, “a
véspera da morte parecia para elas um dia de grande festa”.
À tarde foram avisadas que iriam
comparecer, no dia seguinte, diante do tribunal revolucionário. Realmente, este conselho ouviu nesse dia o
acusador público lançar contra as rés um requisitório dos mais violentos: “Embora separadas pelos domicílios, formavam
conciliábulos de contra-revolução entre elas e outras que a si reuniam. Viviam
sob a obediência duma superiora e, quanto aos seus princípios e votos, bastava
ler as cartas e os escritos delas”.
Depois de breve interrogatório e sem ouvir
testemunhas, o tribunal condenou à morte as 16 carmelitas. E como, sem se perturbar, uma religiosa
perguntasse ao presidente o que se devia entender pela palavra ‘fanático’ que
figurava no texto do julgamento, recebeu esta confissão, que devia enchê-las de
alegria inexprimível: “Entendo por essa
palavra o vosso apego a essas crenças pueris, às vossas loucas práticas de
religião”. Era isto que lhes merecia
a palma do martírio!
Uma hora depois, subiram elas para as
carroças que as levaram à Praça do Trono Derrubado (Praça da Nação). Enquanto, à passagem delas, uma multidão
contraditória exprimia sentimentos diversos – desde gritos e injúrias até à
admiração – elas, indiferentes e serenas, cantaram o Miserere e depois a Salve
Rainha. Chegadas à base do cadafalso
entoam o Te Deum, o canto de ação de
graças, a que juntam o Veni Creator. Depois, renovam as promessas do batismo e os
votos de religião.
Mas eis que uma jovem noviça se ajoelha
diante da prioresa. Com tanta simplicidade como fazia dentro das paredes do
convento, pede-lhe a bênção e a licença de morrer. Em seguida, cantando o salmo
Laudate Dominum omnes gentes, sobe os
degraus do cadafalso. Sucessivamente, as outras religiosas observam o mesmo
cerimonial e vêm receber a bênção da Madre Teresa de Santo Agostinho. Esta, em
último lugar, depois de ver todas as suas filhas dar a Deus a maior prova de
amor, confia a sua cabeça aos algozes.
Assim pereceram, na tarde de 17 de julho de 1794. O sacrifício, das
que se tinham generosamente oferecido em holocausto “pela paz da Igreja e da França”, não foi em vão. De fato, “somente
dez dias após o suplício delas, cessava a tormenta que, ao longo de dois anos,
tinha espalhado pelo solo da França o sangue dos filhos da França” (Decreto
de declaração do martírio, 24 de junho de 1905).
São Pio X, a 10 de dezembro de 1905,
declarou beatas aquelas que “desde que
foram expulsas, continuaram a viver como religiosas e a honrar, com muitas
devoções, o Sagrado Coração”.
* * *
Os nomes das Beatas são os seguintes:
- Anne-Marie
Madeleine Thouret (Irmã Carlota da Ressurreição) * em Mouy, 16/9/1715,
professou 19/8/1740, sub-priora em 1764 e 1778. Sacristã da capela do Convento.
- Anne Petras
(Irmã Maria Enriqueta da Providência) * em Carjarc, 17/6/1760, professou em
22/10/1786
-
Marie-Geneviève Meunier (Irmã Constance) * em Saint Denis, 28/5/1765, noviça,
tomou o hábito em 16/12/1788 (ela sobe os degraus do cadafalso cantando o Salmo
Laudate Dominum omnes gentes)
-
Rose-Chrétien de la Neuville (Irmã Julia Luisa de Jesús) * Evreux, 1741,
casou-se jovem, enviuvou, entrou para o Carmelo e professou em 1777
- Marie
Claude Cyprienne Brard ou Catherine Charlotte Brard (Irmã Euphrasia da
Imaculada Conceição) * 1736 em Bourth, professou em 1757
-
Madeleine-Claudine Ledoine (Madre Teresa de Santo Agostinho), priora, * em
Paris, 22/9/1752, professou em 16 ou 17/5/1775
- Marie-Anne
(ou Antoinette) Brideau (Madre São Luís), sub-priora, * em Belfort, 7/12/1752,
professou em 3/9/1771
- Marie-Anne
Piedcourt (Irmã de Jesus Crucificado), religiosa do coro, * 1715, professou
1737; ao subir no cadafalso ela disse: "Eu perdôo vocês do mesmo modo
como desejo que Deus me perdoe".
-
Marie-Antoniette ou Anne Hanisset (Irmã Teresa do Sagrado Coração de Maria) *
em Rheims, 1740 ou 1742, professou em 1764
-
Marie-Françoise Gabrielle de Croissy (Madre Henriette de Jesus), * em Paris,
18/6/1745, professou 22/2/1764, priora de 1779 a 1785
-
Marie-Gabrielle Trézel (Irmã Teresa de Sto. Inácio), religiosa do coro, * em
Compiègne, 4/4/1743, professou 12/12/1771
Havia ainda três irmãs leigas:
- Angélique
Roussel (Irmã Maria do Espírito Santo) * em Fresnes, 4/8/1742, professou em
14/5/1769
- Julie ou
Juliette Vérolot (Irmã São Francisco Xavier) * em Laignes ou Lignières,
11/1/1764, professou 12/1/1789
- Marie
Dufour (Irmã Santa Marta) * em Beaume, 1 ou 2/10/1742, entrou na comunidade em
1771
E duas serventes que não eram Carmelitas, mas
ocupavam-se dos trabalhos na comunidade:
- Catherine Soiron, * 2/2/1742 em Compiègne
- Teresa
Soiron, * 23/1/1748 em Compiègne
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