"Às suas orações a
França deve o dom da Fé" (oração litúrgica da festa da Santa)
O rei da
Borgonha morreu e seus quatro filhos dividiram o pequeno reino. Dois
deles, gananciosos e cruéis, uniram-se aos ferozes alamanos para invadir os
reinos dos outros dois irmãos. Childerico teve a cabeça decepada, seus filhos
foram mortos e a esposa atirada ao Ródano. As duas filhas de Childerico, ainda
muito crianças, foram poupadas. Gundebaldo, um dos irmãos invasores, levou-as
para sua corte. Apesar de ariano, permitiu que elas continuassem a professar a
verdadeira religião.
Fredegária,
a mais velha, tornou-se religiosa num mosteiro, onde terminou seus dias em odor
de santidade. Clotilde, a mais nova, por "sua doçura, piedade e
amor pelos pobres, fazia-se bendizer por todos aqueles que viviam a seu redor".
Sua
missão: converter um rei e um reino
A fama de
sua virtude e beleza chegou ao reino dos Francos (atual França). Clóvis I,
vitorioso rei dos francos, provavelmente influenciado pelo Bispo São Remígio,
que gozava da inteira confiança do monarca, pensou em desposar a virtuosa
princesa, apesar de ser ela católica. As bodas realizaram-se no ano de 493, em
Soissons, com toda a suntuosidade da época.
Para agradar
a esposa, o rei franco mandou instalar um oratório católico no palácio. Nele
Clotilde assistia diariamente a Santa Missa com grande devoção.
Clotilde
deu à luz um herdeiro e obteve de Clóvis licença para batizá-lo. O
pequeno inocente faleceu poucos dias depois. Clóvis alegou que se ele tivesse
sido consagrado aos seus deuses não teria morrido. A rainha protestou com
firmeza e doçura dizendo que em vez de entristecerem-se, eles deveriam
alegrar-se por ter o pequenino ido para o Céu.
No ano
seguinte, Clotilde deu à luz outro menino. Apenas batizada, a criança
correu perigo de morte. A rainha por suas súplicas e lágrimas, que visavam mais
a conversão do marido do que evitar outro falecimento, obteve de Deus que ele
se restabelecesse.
Clóvis
começou a admirar as qualidades da esposa, e ouvia-a com gosto, mas a sua
conversão haveria de custar muitas lágrimas à esposa. A piedosa
rainha entregava-se em segredo a grandes austeridades, prolongadas orações
e caridade para com os pobres, a fim de obter a conversão do marido e do reino.
Ao mesmo tempo, procurava suavizar o temperamento belicoso do esposo com sua
mansidão cristã.
Clotilde
tornou-se amiga de Santa Genoveva, que então resplandecia em Paris por suas
virtudes e milagres; a ela e a São Remígio Clotilde recomendou também a
conversão do marido. Enquanto isso, Clotilde catequizava suas damas, serviçais
e mesmo alguns dos nobres francos que viviam no palácio.
Na planície
de Tolbiac, em 496, a
hora da Providência chegou. Clóvis viu-se quase vencido pelos alamanos, mas
obteve a reversão da batalha após formular a seguinte promessa: “Deus
de Clotilde, se me dás a vitória, faço-me cristão". Após a
vitória, sua conversão foi pronta e sincera. Não querendo esperar chegar a
Soissons para conhecer "a Fé de Clotilde", mandou chamar um
virtuoso eremita, São Vedasto, para que, marchando a seu lado, o instruísse na
Fé católica.
No dia de
Natal do mesmo ano, Clóvis, com três mil de seus mais valentes guerreiros, suas
duas irmãs e seu filho bastardo, Thierry, ingressaram pelo batismo "na
Fé de Clotilde". Quando o rei dos francos entrou com o Bispo de Reims
no batistério, este lhe disse as famosas palavras: "Curva a cabeça,
altivo Sicambro; adora o que queimaste e queima o que adoraste".
No momento em que São Remígio ia
proceder à unção do rei com o óleo do Santo Crisma, uma pomba trazendo no bico
uma ampola com azeite baixou da abóbada do templo. O Bispo ungiu com aquele
azeite a cabeça de Clóvis. Esse azeite seria usado para a unção de praticamente
todos os reis franceses, até a abominável Revolução Francesa, quando a ampola
foi quebrada pelos revolucionários.
Clóvis
tornou-se muito devoto de São Martinho e foi muitas vezes a Tours visitar-lhe o
túmulo. Iniciou a aliança entre a França e a Igreja enviando embaixadores ao
Papa Anastácio, e fazendo colocar sua própria coroa diante do túmulo do
Apóstolo São Pedro. Encorajado por Clotilde, o rei mandou destruir os templos
dos ídolos
A partir de
então, um afeto muito mais forte e sobrenatural uniu os dois esposos,
concedendo-lhes a Providência mais dois filhos e uma filha, que é também
honrada como Santa.
Clotilde
incentivou seu esposo a empreender uma guerra contra Alarico, rei dos
visigodos, que tentava disseminar a heresia ariana na região de Guyenne.
Enquanto Clotilde, que o acompanhara nessa cruzada, rezava pelo êxito da
batalha, Clóvis abatia o rei visigodo e desbaratava seu exército.
Extenuado
pelas fadigas e lides do governo, Clóvis viu-se atacado por mortal doença em Paris. Clotilde
foi ao seu encontro. São Severino, Abade, ministrou-lhe os Sacramentos e
ajudou-o preparar-se para a morte. O rei faleceu em 27 de novembro de 511 aos
45 anos de idade.
Clotilde
quis então viver só para Deus; dividiu o reino entre seus três filhos e o
enteado. O filho natural de Clóvis, Thierry, reinou em Reims sobre a Austrásia,
parte oriental da França, com várias províncias da Alemanha atual; Clodomiro
reinou em Orleães; Childeberto em Paris e Clotário I em Soissons.
Mais de 30
anos de sofrimentos ainda estavam reservados à rainha. Clotilde tinha dado sua
filha, que recebera seu nome, como esposa a Amalrico, rei dos visigodos da
Espanha, visando a conversão desse monarca. Todavia, a reação do soberano
ariano foi de promover toda sorte de perseguições à esposa por sua
fidelidade à verdadeira religião. Com permissão do rei, seus vassalos
chegavam a atirar-lhe lama quando ela ia à igreja.
Seus
irmãos declararam guerra a Amalrico, que foi morto. Trouxeram então
consigo a jovem Clotilde. A mãe não voltaria a ver a filha senão no Céu, pois,
acabrunhada de dor, a jovem faleceu a caminho da terra natal.
As
contínuas discórdias e dissensões de seus filhos, e as crueldades cometidas por
eles levaram-na a sair de Paris, que tinha sido elevada por Clóvis a capital.
Mudou-se para junto do túmulo de São Martinho, em Tours, no mosteiro ali
existente, onde, diz São Gregório de Tours, "viu-se uma filha de rei,
sobrinha de um rei, esposa de um rei, e a mãe de vários reis, passar as noites
em oração, servir os pobres e proteger as viúvas e os orfãozinhos". E
ali viveu até à morte.
Desde essa
época viveu ela para a oração, as esmolas, as vigílias, jejuns e outras
penitências. E operou vários milagres ainda em vida: curas, mudança de água em
vinho, fez surgir uma fonte em campo árido...
Sentindo
aproximar-se a morte, mandou chamar seus dois filhos, exortando-os a servir a
Deus e a guardar sua lei, a proteger os pobres, a viverem juntos em perfeita
harmonia, e a tratar seus povos com bondade. Depois de fazer pública profissão
de Fé Católica, recebeu os Sacramentos e entregou docemente sua alma ao
Criador, no dia 3 de junho de 545.
Felizes os povos aos quais foi dada uma mãe, pela
divina munificência.
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