“A taumaturga da Normandia”
Uma Vita et miracula Sanctae Opportunae foi escrita cerca de um século após sua morte (ca. 885-88) por Santo Adelino), bispo de Séez.
Santa Oportuna nasceu na outrora importante Exmes, na diocese de Séez, próximo de Argentan, numa data desconhecida. Seu pai governava esta região com o título de conde; seu irmão, Santo Godegrande, ocupava a sede episcopal de Séez; e sua tia, Santa Lantilde, era abadessa das beneditinas de Almenèches, fundada dois séculos antes.
Muito jovem Oportuna decidiu ingressar no convento. Embora a abadia beneditina de Almenèches governada por sua tia ficasse mais próxima, ela preferiu a solidão de Montreuil, pequeno mosteiro no vale do Auge, célebre por sua estrita observância. Oportuna recebeu o véu pelas mãos de seu irmão, Godegrande, alguns dias após sua entrada na abadia.
Após o falecimento da abadessa, as religiosas escolheram Oportuna para sucedê-la. A nova abadessa mudou de condição, mas não de conduta, aumentou suas devoções e penitências. Ela dormia sobre a terra nua e tinha por coberta um simples cilício; alimentava-se apenas de pão e aos domingos comia um pouco de peixe; jejuava nas 4as e 6as feiras.
Oportuna primava pela prudência e pela caridade com os pobres; tinha uma maneira muito peculiar para instruir suas filhas, ou para corrigi-las, sempre temperando a justiça com a misericórdia, por suas orações e exemplo. Ela fazia isto tão bem, que as mais recalcitrantes se tornavam dóceis aos movimentos do espírito de Deus que a conduzia.
Contudo, como a vida dos justos é cheia de cruzes para estar conforme a de Jesus Cristo, Deus permitiu que ela as tivesse e a maior foi a seguinte.
Seu irmão, Godegrande, fez uma viagem a Roma e a Palestina para visitar os lugares santos. Ele deixou como vigário geral Godoberto. Este, ao invés de agir como o bom pastor, tornou-se um lobo por suas injustiças, especialmente contra as pessoas religiosas da diocese e em particular contra Oportuna. Sua ambição, tão alta quanto violenta, o fez se consagrar bispo de Séez. Oportuna rezava pedindo o fim de tanta desordem.
Finalmente, sete anos depois de sua partida, o Santo voltou a sua diocese e restabeleceu a ordem. Furioso com sua deposição, Godoberto conspirou contra a vida do santo bispo e o mandou assassinar durante o trajeto de uma visita que ele faria a irmã. Pessoas piedosas desejavam dar sepultura ao bispo, mas sua irmã, que chegara ao local do crime, o levou para seu mosteiro, onde ele foi solenemente sepultado.
Algumas fontes dizem que Oportuna morreu de uma doença causada pelo sofrimento após a morte de seu irmão, que ocorreu dia 3 de setembro de 769. Embora ela tivesse previsto sua morte numa visão profética, nada pode fazer para impedi-la.
Antes de sua morte a Santa teve uma visão: recebeu a visita das Santas Luzia e Cecília, cuja presença inundou sua cela de uma brilhante claridade e de um odor muito agradável; elas asseguraram que a Rainha dos céus logo viria buscá-la. Oportuna recebeu o santo viático e a Ssma. Virgem lhe apareceu para levá-la em seus braços. Era o dia 22 de abril de 770. Seu corpo foi sepultado próximo ao de seu irmão.
Devido aos inúmeros milagres que ocorriam junto a sua sepultura, muito numerosas eram as visitas que lhe fazia o povo rogando por sua intercessão. Foram tantos os milagres alcançados, que Santa Oportuna ficou conhecida como “a taumaturga da Normandia”.
A vita de Santa Oportuna relata que certa vez um camponês roubou um jumento do convento e recusava admitir seu crime. Oportuna deixou o caso nas mãos de Deus e no dia seguinte o campo do homem estava coberto de sal. O camponês arrependido não só devolveu o animal como doou as terras para as religiosas.
A Santa é muito venerada entre as monjas beneditinas de Almenèches-Argentan, que a invocam para os casais estéreis que desejam um filho, e é a patrona das antigas igrejas paroquiais de Lessay.
Em 1374, seu braço direito e uma costela foram colocados num relicário em uma pequena igreja dedicada a ela em Paris, próxima da ermida chamada Notre Dame des Bois. Conforme a cidade crescia, o mesmo se dava com a igreja. Seu relicário de Paris é levado em procissão junto com as relíquias dos Santos Honório e Genoveva.
História da Abadia de Almenèches-Argentan
Uma das mais antigas abadias femininas da França, com Poitiers e Jouarre, sua origem é bastante obscura; os mais antigos arquivos datam do século XII. Sempre modesta, a abadia atravessou séculos e enfrentou muitas vicissitudes, com duas interrupções: durante um século e meio, após as invasões vikings do século IX, e durante 30 anos após a Revolução Francesa.
Segundo a tradição, no final do século VII, o monge Santo Evroul († 707) fundou 15 mosteiros na região, entre eles o de Almenèches, a 10 km sudoeste de Argentan, governado por Santa Lantilde no século VIII, e um outro, o Monasteriolum, a 17 km ao norte de Argentan. Neste foi abadessa Santa Oportuna notável por sua grande caridade fraterna e por sua devoção mariana.
No fim do século IX, os dois mosteiros foram destruídos pelas invasões normandas. As relíquias de Santa Oportuna foram colocadas em segurança na região de Paris, sinal que ela já era objeto de uma grande veneração.
1060: Uma restauração difícil
Rogério II de Montgomery, parente de Guilherme o Conquistador e “amigo dos monges”, reconstrói Almenèches em 1060, e dota a abadia de muitas ricas possessões na Normandia e na Inglaterra. Sua filha, Ema, aí se tornou abadessa em 1074. Uma parte das relíquias de Santa Oportuna retorna então a Almenèches, que a acolhe como patrona. Envolvidos, apesar deles, nas lutas opositoras dos Montgomery, os mosteiros foram incendiados por duas vezes, em 1103 e 1118, e ficaram muito empobrecidos.
Do século XII ao século XV, a decadência
O Registro de Visitas do arcebispo de Rouen, de 1250 a 1260, menciona 33 religiosas que cantavam o Ofício. A decadência vai se acentuando no decorrer do século XIV, em seguida a um novo incêndio, em 1318, e das circunstâncias difíceis da época: a Guerra dos 100 anos, peste e problemas na Normandia. Em 1455, o bispo de Séez constata que o capítulo fora transformado em estábulo e que as religiosas se alojam como podem nas ruínas e arredores.
Nos séculos XV e XVI, uma renovação sob o signo de Fontevrault
A ajuda da Abadia de Fontevrault tornou possível a necessária renovação da vida monástica. Um primeiro desenvolvimento foi dado por uma jovem abadessa vinda de Fontevrault, Maria de Alençon. Em 1517, 16 monjas de Fontevrault chegam a Almenèches para uma segunda reforma. O culto de Santa Oportuna começa então a se desenvolver, em seguida a um milagre.
Com a Pseudo-reforma protestante a existência do mosteiro se tornou precária: em 1563, os huguenotes saquearam a abadia e o fervor se torna morno.
As grandes abadessas do período clássico
Uma nova vitalidade foi dada pela jovem abadessa, Luisa Rouxel de Médavy (1593-1652), que se revelou uma grande abadessa: ela restaura o claustro e adota as Constituições de Poitiers, próximas da observância de Fontevrault. A vida no mosteiro se torna profundamente religiosa, mas de uma austeridade relativa. Ela também funda o priorado de Exmes em 1629, e participa do estabelecimento de muitos mosteiros, entre os quais o de Verneuil (1627). O impulso dado à comunidade se mantém sob as duas abadessas que a seguiram.
Em 1736, a abadessa Helena Marta de Chambray se vê obrigada por Luis XV a fechar Almenèches e transferir o mosteiro para o antigo priorado Notre-Dame de la Place de Argentan, para facilitar o recrutamento.
Às vésperas da Revolução Francesa, a comunidade contava com trinta monjas: todas se recusaram a prestar juramento a constituição civil do clero. Mas em 1792, elas foram dispersas. Duas delas foram aprisionadas.
A segunda restauração em 1822
Em 1822, Carlota Bernart de Courmesnil conseguiu reagrupar as sobreviventes dos dois mosteiros, Argentan e Exmes, a princípio em Vimoutiers, depois, em 1830, em Argentan. Notre-Dame de la Place estando irrecuperável, a comunidade renascente se instala nas modestas construções do Quarteirão São Joaquim. Pouco a pouco elas vão crescendo no século XIX, com a abertura de um pensionato, de um orfanato e de uma escola gratuita, e, em 1874, de uma escola de rendas destinada a retomar a tradição esquecida do “ponto de Argentan”. As múltiplas tarefas educativas, desejadas pelo contexto político, afastam um pouco as religiosas do ideal monástico.
As leis de 1901 e o retorno à vida contemplativa
Com as leis anti-congregacionistas do início do século XX, a existência do mosteiro é ameaçada. Em 1904, se procede ao inventário de seus bens: graças ao prestígio da escola de rendas, foi obtido um sursis. O pensionato foi fechado em 1907. Em 30 de junho de 1914, aparece o decreto de fechamento do mosteiro, mas a guerra o suspende oficialmente: uma parte do mosteiro é transformada em ambulatório e as religiosas ficam no local.
A supressão do pensionato leva as monjas a retornar para a grande tradição monástica. Em 1912, o Ofício monástico substitui o Ofício romano e o título abacial é restaurado pela Santa Sé. A nova igreja abacial é dedicada em 1933.
Durante a 2ª Guerra Mundial, o mosteiro sofre o bombardeiro de 6 de junho de 1944. Três monjas sucumbem, as outras encontram asilo na “Antiga Misericórdia” de Séez durante 14 anos. Foi a Madre São Leão Chaplain, abadessa de 1940 a 1964, que assegurou a unidade da comunidade nessas circunstâncias difíceis e pode reconstruir o mosteiro. Em 26 de julho de 1958, retornam a Argentan, em uma construção nova, situada às margens do Orne. A dedicação da igreja teve lugar no dia 17 de setembro de 1962.
A comunidade conta agora com 46 monjas, que desejam cultivar a herança dos séculos passados e continuar a servir a Deus Nosso Senhor.
É impressionante que após 1.241 anos de seu falecimento, Santa Oportuna continue tão presente. Que ela inspire o seu ideal monástico em muitas jovens almas de nossos dias!
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