sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Santas Marana e Cira, Virgens penitentes - 28 de fevereiro


     Martirológio Romano: Comemoração das santas virgens Marana e Cira, que em Berea, na Síria, viviam num lugar estreito e cercado, expostas aos elementos, sem sequer um modesto abrigo, observando o silêncio e recebendo por uma janela os alimentos de que necessitavam.
     As santas faleceram por volta do ano 450. 
Etimologia:  Marão, Marana = aportuguesamento de Maron, Marum, do sobrenome do fundador do rito católico maronita (Líbano e Síria) São Marão.
Cira(o) = do grego Kyros, derivado de Kyrios: "o poderoso, o senhor".
 
     Nosso Senhor Jesus Cristo viveu com seus discípulos uma forma de vida comunitária que inaugurou um ascetismo cristão diferente daquele das tradições dos rabinos de seu tempo, ou mesmo dos profetas do Antigo Testamento.
     A expressão "vita apostolica" na literatura monástica primitiva significou primeiramente esta vida dos Apóstolos com Jesus, que fazia exigências àqueles que desejavam segui-Lo. Depois da morte de Jesus, alguns cristãos desejaram adotar como modo permanente de vida os apelos de Jesus para o celibato, a renúncia total, a pobreza, etc.. Eles tinham o exemplo de Jesus e também se inspiravam nas formas de ascese de seu tempo.
     Após o término das perseguições aos cristãos, homens e mulheres se retiravam das grandes cidades em busca do silêncio e do isolamento para alcançar a perfeição e união com Deus.
     O ascetismo se desenvolveu muito depressa; pouco a pouco foi se desenhando as várias formas de ascetismo, pois nem todos eram chamados a seguir Nosso Senhor pelo mesmo caminho. Quando lemos os escritos dos monges cristãos do século IV fica claro que eles foram para o deserto, ou se agruparam em fraternidades urbanas para segui-Lo e, sob a ação do Espírito Santo, se deixar transformar à imagem dEle.
     Os Padres do Deserto, por exemplo, era um grupo de eremitas e cenobitas que no século IV se estabeleceu no deserto egípcio. Eles viviam em ermidas primitivas e comunidades religiosas.
     A fama de santidade desses primitivos monásticos atraia grande número de seguidores aos seus austeros retiros. Sob sua direção espiritual seus discípulos foram crescendo.
     O monaquismo foi nascendo um pouco por toda parte e ao mesmo tempo sob formas muito variadas, e dependendo da vitalidade própria de cada Igreja local, tanto no Oriente como no Ocidente. Desde suas primeiras manifestações, o monaquismo apareceu simultaneamente em formas as mais diversas: cenobitismo e eremitismo, monaquismo do deserto e monaquismo das cidades etc.
     São Bento não foi o fundador do monaquismo cristão, pois viveu quase três séculos depois do seu surgimento no Egito, na Palestina e na Ásia Menor, mas acabou dando-lhe novos e frutuosos rumos. Isto fica evidente na Regra que escreveu para os mosteiros e que ainda hoje é usada em inúmeros mosteiros e conventos no mundo inteiro. A "escola do serviço divino", como São Bento chamava o monaquismo, compunha-se de dois elementos “ora et labora”, reza e trabalha.
     No mundo grego, o trabalho físico era considerado a ocupação dos escravos. O sábio, o homem verdadeiramente livre, dedica-se unicamente às realidades espirituais; o trabalho físico era considerado algo inferior, deixado àqueles homens que não são capazes da existência superior no mundo do espírito. A exemplo de São Paulo, que era tecelão de tendas e se sustentava com o trabalho das próprias mãos, o trabalho manual tornou-se parte constitutiva do monaquismo cristão.
     Acompanhar o caminhar das várias formas de dedicação inteira a Santa Igreja e, por meio dela, a Nosso Senhor Jesus Cristo durante os séculos seguintes é uma tarefa das mais edificantes; as almas fiéis, guiadas pelo Espírito Santo, foram criando as mais belas formas de dedicação a Deus e ao próximo, muitas das quais florescem ainda nos dias de hoje.
     É bom venerarmos essas primeiras e tão distantes Santas, das quais tão pouco se sabe, vítimas expiatórias regando com seu sangue e preces o solo que se tornaria fértil e produziria ainda mais belas testemunhas do Amor de Deus.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Beata Piedade da Cruz Ortiz Real, Fundadora - 26 de fevereiro

    
     Tomasa Ortiz Real nasceu em Bocairente, Valência (Espanha), no dia 12 de novembro de 1842, tendo sido batizada no dia seguinte. Recebeu a Primeira Comunhão aos dez anos, sacramento que despertou nela o desejo de pertencer inteiramente a Nosso Senhor e viver para Ele.

     Completou a sua formação humana e espiritual no Colégio de Loreto, que as religiosas da Sagrada Família de Burdeos tinham em Valência. Pediu várias vezes para ingressar no noviciado desse Instituto, mas seu pai, considerando a situação política da época e a pouca idade da menina, obrigou-a a voltar para casa.
     Esta etapa da sua vida em Bocairente foi caracterizada por três aspectos: o espírito de piedade e de oração, a sua dedicação em fazer o bem às crianças pobres, aos idosos e aos doentes, e o empenho em dar uma resposta àquilo que sentira no seu íntimo no dia da Primeira Comunhão.
     Tomasa fez sem sucesso algumas tentativas para ingressar em um convento de clausura. Ela intuiu depois que Deus não queria que ela seguisse aquele caminho. Ela então pediu a Ele que lhe indicasse claramente a Sua vontade e, retirando-se em oração, recitava assim: "Tua, meu Jesus, desejo ser tua, porém, diz-me onde".
     Tendo a certeza de sentir-se chamada para uma vida de especial consagração, mas com a dúvida de onde Deus a queria, Tomasa dirigiu-se para Barcelona. Depois de muitas dificuldades, ali o Senhor respondeu à sua busca vocacional, fazendo-a viver uma profunda experiência mística na qual o Coração de Jesus, mostrando-lhe o seu lado esquerdo ensanguentado, lhe disse: "Olha como me deixaram os homens com a sua ingratidão. Queres ajudar-me a levar esta cruz?". Tomasa respondeu: "Senhor, se tens necessidade de uma vítima e me queres, estou aqui". Então, o Redentor disse-lhe: "Funda, minha filha, que sobre ti e sobre a tua Congregação concederei sempre misericórdia".
     Esta experiência foi determinante para Tomasa, dando-lhe uma certeza tão grande que nunca a tirou de sua mente e do seu coração. Naquele momento ela compreendeu que Deus lhe pedia para dar vida a um novo Instituto. A pergunta agora era: “onde fundar?”. O Bispo D. Jaime Catalá indicou-lhe que abrisse seu coração com seu confessor e fizesse o que ele mandasse.
     No mês de março, acompanhada de três postulantes, Tomasa saiu de Barcelona a caminho de Puebla de Soto, a 1 km de Alcantarilla, para fundar ali, com a autorização do Bispo de Cartagena-Murcia, a primeira Comunidade de Terciárias da Virgem do Carmelo.
    Após a tragédia das inundações de 1884, eclodiu a cólera. Tomasa, que então havia tomado o nome de Piedade da Cruz, e suas Filhas se desdobraram no cuidado dos doentes e a das meninas órfãs em um hospitalzinho que ela chamou de “A Providência”.
     Foram chegando mais jovens atraídas pelo modo de viver daquelas primeiras Terciárias Carmelitas. A Casa tornou-se pequena e foi preciso comprar a de Alcantarilla. Uma nova comunidade se estabeleceu em Caudete. Tudo fazia pensar que finalmente ela havia encontrado o lugar onde levaria a cabo sua vocação.
     Entretanto, uma nova cruz: no mês de agosto as irmãs de Caudete foram para Alcantarilla e levaram as noviças, deixando Madre Piedade da Cruz somente com a Irmã Alfonsa. Foram dias de muita dor. A Fundadora, como sempre, se refugiou na oração; prostrando-se diante de Nosso Senhor Jesus Cristo ali permanecia horas e horas a seus pés.
     Depois de imensas dificuldades e tribulações, no dia 8 de setembro de 1890, chegou para ela a hora de Deus. Nascia na Igreja a Congregação das Irmãs Salesianas do Sagrado Coração de Jesus na qual se devia amar, servir e reparar, ver o rosto do Senhor nas meninas órfãs, nas jovens operárias, nos doentes, nos idosos abandonados e ajudá-los a levar a cruz.
     Embora toda a vida de Madre Piedade tivesse sido uma renúncia do mundo, ela não deixou o mundo, continuou nele fazendo o bem e lutando contra o mal. São testemunha disto casamentos que ela impediu que se desfizessem, jovens que ela ia buscar nas fábricas para formá-las na escola dominical, meninas sem lar que amou entranhadamente, idosos solitários, doentes...
     Viveu pobre e morreu pobre, sentada em uma cadeira, porque “Aquele – dizia indicando o Crucifixo – morreu na cruz e eu não devo morrer na cama, se não na terra”.
     Madre Piedade da Cruz expirou com o crucifixo nos lábios e na santa paz de Deus, num sábado, dia 26 de fevereiro de 1916.
     Depois de um estudo exaustivo sobre as virtudes praticadas por Madre Piedade da Cruz, em 1º de julho de 2000 elas foram reconhecidas como heroicas; e a 21 de março de 2004, Madre Piedade foi beatificada em Roma.
 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Beata Ascensão do Coração de Jesus, Cofundadora - 24 de fevereiro

    
Florentina Nicol Goñi nasceu em 14 de março de 1868 numa família de comerciantes de Tafalla, cidade da província de Navarra, Espanha e recebeu o nome de baptismo Florença.

     Ainda adolescente, entrou no Colégio Santa Rosa de Lima, na cidade de Huesca. O contato assíduo com a vida religiosa dominicana levou-a a interrogar-se imediatamente sobre a sua vocação, que pouco a pouco começou a definir-se na sua alma.
     Em 22 de outubro de 1885, aos 17 anos de idade, entrou no noviciado das Dominicanas de Huesca, fez profissão no ano seguinte e tomou o nome de Ascensão do Coração de Jesus. As devoções ao Sagrado Coração e à Virgem do Rosário serão o seu apoio na sua vida de sacrifício e de apostolado.
     Depois de ter emitido os primeiros votos, começou a trabalhar como professora, no colégio onde fora aluna, o qual passou a ser o seu campo de apostolado que duraria 28 anos. As testemunhas guardavam dela a recordação de uma excelente educadora, ao mesmo tempo suave e forte, compreensiva e exigente. A partir desta época, com outras Irmãs, desejou ocupar-se dos mais pobres, mesmo nos países remotos dos quais recebia notícias pelas revistas missionárias.
     Um acontecimento negativo permitiu-lhe realizar as suas aspirações. O Estado anticlerical fechou a escola em 1912, as religiosas perderam uma boa parte do seu trabalho e das suas atividades de apostolado. Desejando trabalhar em favor das missões, as Irmãs escreveram cartas para a América Latina e para as Filipinas propondo os seus serviços. Madre Ascensão estava "pronta para qualquer sacrifício".
     O Servo de Deus Frei Ramón Zubieta, O.P., perito em viagens missionárias difíceis, missionário no Peru, foi para a Espanha e aceitou a sua proposta.
     Em 1913, aos 45 anos, Madre Ascensão partiu com a primeira expedição, formada por cinco religiosas e três missionários, estabelecendo-se primeiro em Lima, onde ficou à espera de poder partir para o Vicariato Apostólico de Urubamba y Madre de Dios (atualmente, Porto Maldonado), na selva peruana.
     Para as pessoas de Lima parecia ser impossível elas atingirem este objetivo: nunca ninguém tentara tal itinerário, porque era necessário passar pela Cordilheira dos Andes e viajar por rios perigosos. No entanto, após 24 dias de viagem, para a admiração de todos, elas conseguiram atingir o local situado na confluência de dois grandes rios, Madre de Dios e Tambopata, através dos quais então se realizavam todas as comunicações locais.
     Depois de poucos dias, as religiosas abriram um colégio para meninas e um internato para as jovens mais pobres e deserdadas, dando a sua preferência às nativas. Logo começaram a chegar enfermos graves em busca de ajuda e as religiosas passaram a abrir as portas da sua casa também para eles, enquanto esperavam uma solução melhor. Depois, elas mesmas começaram a visitar os doentes e a prestar-lhes os primeiros socorros, abrindo sempre novos campos de apostolado.
     Madre Ascensão manifestava uma grande fé e vivia as práticas de oração em estreita observância. Estava sempre unida a Deus durante as viagens de barco, no dorso de um burro, de canoa ou a pé, enquanto descobria as belezas da Cordilheira dos Andes e da selva. A sua experiência de Deus era tão arrebatadora, que ela chegava a dizer: "Não posso explicar o que a minha alma experimenta... Nunca me senti tão próxima de Deus, como nos meus 16 meses na montanha".
     No início, nem Madre Ascensão, nem D. Zubieta tinham a intenção de fundar um Instituto religioso, mas terminaram por tomar tal decisão, seguindo o conselho que receberam de um Padre dominicano. O dia 5 de outubro de 1918 foi escolhido como data para dar início à vida da nova Congregação, os Missionários Dominicanos do Santíssimo Rosário, com uma cerimônia solenemente celebrada na Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio, em Lima.
     A Congregação nascente contava com quatro casas, das quais uma era a sede do noviciado. Madre Ascensão foi nomeada a primeira Superiora-Geral e dedicou à congregação o resto da sua vida terrena, exercendo uma verdadeira maternidade espiritual muito perpassada de doçura, sendo ao mesmo tempo uma combatente cheia de coragem.
     Gradualmente a sua Congregação tornou-se internacional. Madre Ascensão fez numerosas viagens no Peru e na Espanha, indo mesmo por duas vezes até a China. Pode-se dizer que "a Beata Ascensão do Coração de Jesus é uma das maiores missionárias do século passado" (Cardeal Saraiva Martins).
     Deste apostolado frutuoso, a cruz é o preço: "não se salvam as almas sem se sacrificar a si mesma", dizia ela frequentemente às Irmãs. Ela mesma ofereceu-se como vítima ao amor misericordioso de Deus (pode pensar-se aqui na oferta de Santa Teresinha em 1895). Pouco depois ter sido eleita uma terceira vez como Superiora Geral caiu doente e morreu em Pamplona (Navarra) a 24 de fevereiro de 1940.
     Foi declarada venerável em 12 de abril de 2003 e beatificada em Roma no dia 14 de maio de 2005.
 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Madre Helena do Espírito Santo - 23 de fevereiro


Co-fundadora do Mosteiro da Luz
 
     Helena nasceu em 2 de maio de 1736, filha de Francisco Calaça e Maria Leme, na região de Paranapanema, sul do Estado de São Paulo. Santo Antônio Galvão fez um breve relato de sua vida:
     Nasceu Helena em Paranapanema. Freguesia pertencente naquele tempo ao bispado de São Paulo; nela criou-se até a idade de 17 anos; em todo esse tempo eram notáveis os seus procedimentos dando já indícios de sua futura santidade; exercitava-se em obras de caridade, obediência e mansidão para com os domésticos; mui frequente no exercício da Santa Oração, Via-Sacra e outros atos religiosos, que deixo de os referir por evitar prolixidade; dizendo somente que, entre noite e dia, tinha sete horas de oração. As suas penitências eram contínuas, anos inteiros usou cilícios, dormindo com eles em terra fria, digo sobre a terra; usava de disciplina de sangue procurando o silêncio e oportuno tempo da noite. Algumas vezes encontrou-se com feras, entre as quais em certa ocasião uma onça. Invocando o nome de Jesus, com estranha velocidade fugiu o tigre. etc. (Maristela, p.49-50)
     Com os pais, Helena veio a São Paulo e entrou como servente no Recolhimento de Santa Teresa, recolhimento feito sob a inspiração da Ordem Carmelita Descalça, de Santa Teresa de Ávila. Vestiu o hábito de religiosa em 25 de janeiro de 1769, pela doação do dote feita pelo Pe. Dr. Manoel José Vaz, seu confessor, por quinze anos. Fez profissão dos votos simples em 25 de janeiro de 1770. Prossegue o Santo Frei Galvão:
     "A sua pobreza era extrema e voluntária porque rejeitava esmolas oferecidas de alguns devotos e de seus próprios confessores; só possuía um hábito e uma caixinha velha com algumas coisinhas sem valor. Era admirável na compostura dos olhos, que por nunca os levantar não conhecia nem ainda o confessor senão pela fala, que pela experiência que tive, observei era sem a mínima exageração. Neste Recolhimento lhe apareceu o diabo tomando a forma de alguns de seus Confessores, que a dirigiam; pelo discernimento grande de que era dotada, e auxílio do Céu, nunca este a iludiu e sempre dele triunfou, porque com seus atos de humildade que fazia dava ele demonstração de sua soberba. Outras muitas coisas poderia referir, que por brevidade as deixo". (Maristela, p. 50)
     Como Santo Antônio Galvão era seu confessor, Madre Helena expôs-lhe que Nosso Senhor lhe pedia que fundasse um novo Recolhimento. Por prudência, a princípio Frei Galvão negou sua aprovação. Com ela insistisse, ele examinou a questão, consultou-se com vários eclesiásticos. Jesus apareceu a Madre Helena novamente, mostrando-se como o Bom Pastor, rodeado de muitas ovelhas, umas nos ombros, outras nos braços, outras procurando subir-lhe pelo corpo e disse-lhe: "Eis aqui estas minhas ovelhas que procuram um aprisco para se recolherem e não o encontram, pois, vós podendo, não quereis subministrar-lhes um, fundando um convento em cumprimento de minha vontade". (Maristela, p. 52).
     Convencido que era realmente vontade Deus, Santo Antônio Galvão procurou com todos os meios as permissões necessárias, mesmo em meio às seríssimas restrições a que todas as ordens religiosas estavam submetidas pelo governo real português.
     Desde 1764 o Marquês de Pombal, perseguindo a Igreja, proibia às ordens de receber noviços e realizar novas fundações com o objetivo de extingui-las. Proibidos os Conventos de Ordens religiosas, tolerava-se, em regime de exceção, um ou outro Recolhimento, onde senhoras piedosas se reuniam para viver retiradas, sem emitir oficialmente os votos religiosos. Embora praticassem a vida religiosa em toda a perfeição, não eram consideradas religiosas propriamente ditas nem o estabelecimento verdadeiro convento.
     Para definir o melhor lugar para a nova fundação foram então tomadas as primeiras medidas com o Governador do bispado, o Cônego Antônio de Toledo Lara e o Governador da Capitânia, o Capitão-General (o que equivale ao título de governador) D. Luiz Antônio de Souza Botelho e Mourão, o "Morgado de Mateus".
     Em 1774 existia nos "Campos do Guaré", atual bairro da Luz, uma capela em homenagem a Nossa Senhora da Luz construída por Domingos Luís, o Carvoeiro, em 1603. O Morgado de Mateus já tinha conhecimento desta capela, pois quando chegou a São Paulo em 1765 a encontrou totalmente abandonada e ordenou seu restauro, bem como a construção de algumas casas ao seu redor para a celebração da festa de Nossa Senhora dos Prazeres. Para a fundação do Recolhimento, doou o terreno através de uma Carta de Sesmaria.
     As casas foram ocupadas em 2 de fevereiro de 1774 sob o nome de Recolhimento de Nossa Senhora da Conceição da Divina Providência, mas não segundo os moldes da Ordem Carmelita, como desejava Madre Helena. O novo bispo, Dom Manuel da Ressurreição, franciscano, decidiu que ele se conformaria à Ordem das Concepcionistas, fundada por Santa Beatriz Silva, para não se repetir a Ordem Carmelita já existente na cidade de São Paulo.
     O novo Recolhimento se distingue pela devoção à Imaculada Conceição, "Laus Perenis", isto é, a adoração perpétua ao Santíssimo Sacramento, além do espírito de contínua penitência e de extrema pobreza.
     Madre Helena foi constituída regente e mestra de suas primeiras oito filhas espirituais: a obra desejada por Cristo estava assim iniciada!
     O aprisco de Madre Helena do Espírito Santo passou aos poucos a crescer notadamente. O convento era paupérrimo, estreito e mal provido de qualquer recurso material. Nele abundava porém a consolação divina. Viviam felicíssimas as irmãs, em meio a muitas austeridades, embora muitas delas proviessem de famílias ricas da Capitania de São Paulo. Então, de improviso, uma provação se abate sobre elas: apenas um ano e vinte dias depois de fundado, morre Madre Helena! Sofrera por oito dias fortes cólicas, descrição que faz suspeitar ter sido vítima de apendicite aguda. Conta-nos Beato Frei Galvão:
     “... Faleceu  a 23 de fevereiro de 1775. ... o seu corpo ficou flexível de tal sorte, que falecendo ela no dia 23, em o seguinte dia 24 estalavam os dedos quando eram comprimidos. Eu mesmo com a minha diligência dei 25 estalos em os referidos dedos, e tão altos, que foram ouvidos por todos os que se achavam na Igreja. O sangue de uma pequena incisão que se fez oito horas depois do seu trânsito, sem ser em veia, saiu fluido, dele se serviu a piedosa devoção dos circunstantes, e de algumas relíquias que se puderam decorosamente extrair; está sepultada na Capela-mor da mesma Igreja; dizem que tem feito muitos prodígios, eu sou testemunho de vários, porém, de um com admiração notável". (Maristela, p. 76)
     Daí por diante caberá a Santo Antônio de Santana Galvão continuar a obra iniciada, mas agora com a ajuda de uma santa no Céu, Madre Helena do Espírito Santo. Frei Galvão tornou-se o único sustentáculo das Recolhidas, missão que exerceu com humildade e grande prudência.
     Pouco tempo depois Frei Galvão decidiu providenciar uma nova construção, pois a capela ameaçava ruir e as casas estavam inabitáveis. Projetou um novo edifício. Durante sua construção, além dos taipeiros e dos escravos emprestados pelas famílias das freiras, pôs mãos à obra e convidou as irmãs para que fizessem o mesmo.
     Em 25 de março de 1788, as religiosas se transferiram para o novo prédio. No entanto foram precisos mais 14 anos para terminar a Igreja.
     Durante toda a construção, Frei Galvão viajava constantemente para o interior arrecadando fundos. De acordo com o Padre Alberto Ortmann "... o convento da Luz é obra exclusiva de Frei Galvão. Foi ele o único diretor da construção e continuamente lhe assistia aos serviços, auxiliando-a com suas próprias mãos".
 
Fonte: Mosteiro da Luz, São Paulo-SP
 
Mosteiro da Luz, 240 anos: 1774-2014

Mosteiro da Luz por Benedito Calixto, 1860
 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Beata Amada de Assis, Clarissa - 20 de fevereiro


Afresco do Convento São Damião representando Sta. Clara e suas monjas
 

     Esta sobrinha de Santa Clara nasceu em Assis em fins do ano 1200. Havia sido destinada ao casamento com um nobre de sua cidade natal; orgulhosa de sua beleza, levava uma vida frívola. Ao visitar sua tia no Convento de São Damião, ficou impressionada com a sua humilde e serena pobreza. Mudou de ideais, renunciou ao casamento e em 1213 ingressou no Mosteiro de São Damião.
     O Martirológio Franciscano a recorda com este elogio: "Quae puritate et innocentia vitae ferventique in Christum sponsum amore excelluit". (Sua vida de pureza e inocência se distinguiu no ardente amor a Cristo Esposo.)
     Devido às severas penitências que se infringia adoeceu de hidropisia: por treze meses sofreu de uma tosse violenta e foi curada por sua santa tia com um simples Sinal da Cruz. Presente na morte de Santa Clara, foi por esta interpelada, conforme narra Celano, com estas palavras: "Vides tu, filia, regem gloriae quem ego aspicio?" (Tu vês, ó filha, o rei da glória que eu vejo?)
     Amada faleceu em 1254. Quando em 1260 as monjas abandonaram o velho mosteiro de São Damião para entrar na cidade de Assis, os despojos de Amada foram levados para o Convento de São Jorge.
     Em 1602, Crescêncio, Bispo de Assis, transferiu suas relíquias, as da Beata Inês (irmã de Santa Clara) e as da Beata Benta (primeira abadessa depois de Santa Clara) para uma urna de pedra sob um altar da igreja.
     A Beata Amada é celebrada no dia 20 de fevereiro.
 
Fonte: santiebeati.it

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Santa Juliana de Nicomedia, Virgem e mártir - 16 de fevereiro

    
     No Martirológio Jeronimiano encontramos sua memória celebrada nos dias 13 e 16 de fevereiro. Na memória do dia 13, se lê Juliana ou Juliano, o que deu origem ao mártir imaginário de Lyon do Martirológio Romano no mesmo dia. Esta fonte, no entanto, comemora mais justamente Juliana, mártir da Nicomédia, no dia 16 de fevereiro, e menciona sua trasladação em Campania, como já fora mencionado tanto no Martirológio de São Beda, o Venerável, bem como nos Martirológios de Floro e de Adonis.

     De acordo com o texto das Paixões, Juliana nasceu por volta de 285 em Nicomédia, hoje Izmit, na Turquia. Em sua família de origem era a única cristã. Seu pai, em particular, era um seguidor zeloso dos deuses pagãos. Com nove anos de idade, foi prometida em casamento ao prefeito da cidade, um pagão chamado Evilásio. De acordo com as negociações das duas famílias, o casamento seria celebrado quando Juliana completasse 18 anos. Mas, naquele dia, a jovem disse que somente aceitaria se casar se Evilásio fosse batizado.
     Irritado com as exigências da jovem, Juliana foi denunciada pelo noivo como cristã praticante e a fez comparecer diante do tribunal. Nada foi capaz de fazê-la revogar sua decisão: nem os tormentos, nem a prisão. Finalmente, ela foi condenada a ser decapitada, consumindo assim seu martírio. Isto ocorreu na época de Maximiano, no ano 305.
     Tentou-se explicar a divergência dos dias de celebração de Juliana entre o Oriente e o Ocidente propondo ver a data de 16 de fevereiro como a do dia da trasladação (talvez a segunda) das relíquias da santa mártir: estas teriam sido transferidas primeiro de Nicomédia à Pozzuoli; em seguida, no tempo da invasão dos lombardos (cerca de 568) teriam sido colocadas em segurança em Cuma, e, finalmente, em 25 de fevereiro de 1207, foram transportadas para Nápoles. Isto explica a propagação do culto desta santa em toda a região de Nápoles, bem como a sua presença no calendário marmóreo do século IX.
     Certamente seria difícil esclarecer o problema das trasladações parciais que poderiam justificar as reivindicações de muitas igrejas na Itália, Espanha, Holanda, e outros países, de possuirem relíquias de Juliana.
     A iconografia a representa junto ao diabo, que a atormenta, mas muitas vezes há representações da tortura que sofreu em vida, como ser pendurada pelos cabelos, ou atormentada com o fogo.
 
Etimologia: Juliana = do Latim, pertencente à 'gens Julia', ilustre família romana.
Fonte: santiebeati.it


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Santa Alexandra do Egito, a Reclusa, Penitente - 14 de fevereiro


Túmulo antigo

     Alexandra viveu na segunda metade do século IV. As primeiras informações que se tem sobre ela são encontradas em Paladio de Helenópolis (363 - ca. 437) na “Historia Lausiaca”. Também a matrona romana Santa Melânia a Jovem (383-439), faz menção a ela e conta a visita feita à reclusa.
     Nos primeiros séculos da Igreja os penitentes sentiam a necessidade de encontrar formas de mortificação do corpo para purificar sempre mais o espírito, para assim chegar a uma união mais íntima com Deus, sem distrações decorrentes das necessidades materiais e os cuidados com o corpo.
     Assim, aqueles cristãos buscavam formas de penitência que hoje nos parecem incompreensíveis, como viver sobre uma coluna, em uma gruta, no deserto, sem falar com ninguém, ou como no caso de nossa Santa, de se recolher em um ambiente exíguo, com apenas uma pequena abertura para que o alimento pudesse ser introduzido por almas caridosas, com jejuns mais ou menos forçados. Condições de vida que hoje chamaríamos de “extremas” tinham como resultado que às vezes a existência do penitente era curta.
     Alexandra foi uma destas figuras de eremitas, já rara por se tratar de uma mulher. Ela nasceu no Egito, era uma jovem criada que, perseguida pelas importunidades de um jovem, preferiu se encerrar em uma espécie de túmulo, não muito distante de Alexandria. Uma simples janela como abertura era utilizada para que lhe dessem alimento. Ela viveu nestas condições por dez anos, até sua morte, ocorrida no dia 14 de fevereiro, muito jovem, presumivelmente com trinta anos.
     Santa Melânia a Jovem (vide um relato de sua vida neste blog, em 31 de dezembro de 2011), que a tinha visitado, informa que Alexandra havia deixado o mundo para fugir das tentações vindas de um homem, acreditando assim salvar a sua alma e a alma de outros. Ela empregava seu tempo rezando, trabalhando e meditando sobre a vida dos patriarcas, profetas, apóstolos e mártires. Ela fiava o linho e rezava as horas canônicas.
     Em um “Sinassario” podemos ler que Santa Melânia a servia, isto é, levava alimento e bebida para a reclusa, vestida com um capuz de criada, e esta obra de misericórdia ela estendia também aos outros penitentes do lugar.
 
Bibliografia: Lucot, A. Palladius: Histoire lausiaque. Textos e documentos 15. Paris, 1912.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Santa Sotera, Virgem e Mártir - 11 de fevereiro


Via Appia Antica, Roma
 

     Santo Ambrósio, o célebre pastor da Igreja de Milão, que era sobrinho-neto desta Santa, felicitava sua família por ter produzido esta ilustre mártir e a considerava o seu mais belo ornamento. Ele celebrava o martírio de sua parente que descendia como ele da gens Aurelia (1)
     Sotera contava entre seus ancestrais com uma longa linhagem de cônsules, prefeitos e governadores de províncias. Mas sua verdadeira glória consiste em ter desprezado, por amor de Jesus Cristo, a nobreza de nascimento, o brilho de sua beleza, as vantagens da fortuna, enfim, todos os seus bens, que atraem os desejos dos mundanos.
     Ela fez o sacrifício de sua virgindade a Deus e, como sua grande beleza a expunha a grandes perigos, ela negligenciava o cuidado de sua aparência e dispensava o uso de todo ornamento criado para atrair a atenção. Foi assim que ela se preparou para dar um glorioso testemunho da divindade de Jesus Cristo.
     A ocasião se apresentou imediatamente após a publicação dos editos bárbaros que Diocleciano e Maximiano promulgaram contra os fieis. Sotera foi aprisionada, conduzida diante dos magistrados, que fizeram com que ela fosse rudemente golpeada no rosto. Ela se alegrou por ser tratada como seu Salvador e recebeu com paciência admirável os golpes que lhe foram dados na face. “O perseguidor esperava que ao menos a vergonha a fizesse ceder, mas ela se alegrava em perder a beleza perecível, a fim de colocar seu pudor ao abrigo do perigo. Podiam ferir seu rosto; a beleza interior permaneceu intacta” (2).
     Assim”, continua Santo Ambrósio, “por causa de tratamentos injuriosos reservados aos escravos, ela atingiu o cume de sua paixão, tão corajosa e tão doce que o verdugo se cansou de bater em sua face antes que a mártir se fatigasse de sofrer seus ultrajes. Não a viram baixar a cabeça, nem virar a fronte; ela não deu um gemido, não verteu uma lágrima. Enfim, após sofrer todos os tormentos, ela recebeu da espada o golpe desejado”. (3)
     O juiz, vendo que o suplício não produzia o efeito desejado, ordenou novos golpes que não foram mais eficazes. Santa Sotera os sofreu sem sequer dar o menor suspiro e sem deixar correr uma só lágrima.
     Esta constância tão heroica em uma frágil virgem cobriu o magistrado de confusão. E porque não podia mais suportar sua vergonha e raiva, ordenou que ela fosse decapitada. Seu martírio ocorreu por volta do ano 304.
     Sotera foi sepultada no cemitério que leva o seu nome, vizinho ao cemitério de Calisto. Esta área não foi confiscada provavelmente porque era de direito privado, não tendo ainda sido dada a Igreja quando a perseguição eclodiu. (4)
     O Martirológio Jeronimiano menciona que Sotera foi sepultada inicialmente na Via Ápia e somente depois o Papa Sérgio II trasladou suas relíquias para a igreja de São Martino ai Monti.
     Esta ilustre mártir é mencionada em antigos martirológios.
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(1) Sobre a família e a nobreza de Santa Sotera, Roma sotterranea, p. 23-29.
(2) Santo Ambrósio, De Exhortatio virginis, 12.
(3) Santo Ambrósio, De Virginibus, III, 6

(4) Roma sotterranea, t. III, p. 36
 
Fontes : Vies des pères, des martyrs, et des autres principaux saints, volume 2, par Alban Butler, Jean François Godescard, Charles Butler, Lactantius, 1828. et Histoire universelle de l'Église catholique, tome 3, par René François Rohrbacher, 1866.
 
Etimologia: Sotero (a), do grego Sotér: "salvador".

Nossa Senhora de Lourdes - 11 de fevereiro


 

Só Santa Bernadette viu, ouviu e falou com Nossa Senhora. Porém, as multidões, acorrendo à gruta, vendo-a e imitando os seus gestos de piedade, tinham uma certeza inabalável da realidade das aparições.
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Uma pátina celeste cobre Lourdes
Gregório Vivanco Lopes (*)
 
     Naquele dia 2 de março de 1858, na gruta da Massabielle, Nossa Senhora disse à jovem Bernadette Soubirous, ajoelhada a seus pés: “Que venham aqui em procissão”.
     Essas palavras simples pareciam significar um desejo vago, uma aspiração momentânea. No entanto, elas estavam dotadas de uma potência insuspeitada, porque ditas pela Mãe de Deus. O pedido ecoou por toda a Terra e atraiu para Lourdes multidões pressurosas vindas de todos os continentes, dos vales e dos montes, das geleiras e das regiões tórridas, das ilhas mais afastadas, dos recantos mais ignorados.
     A procissão das velas que na primavera e verão se realiza em Lourdes todas as noites é um espetáculo digno de ser visto. Quando estive em Lourdes, pude aquilatar a multidão que, numa ordem perfeita e com uma compenetração impressionante, desembocava na esplanada em frente à Basílica, vinda de uma rua adjacente. Como as águas de um rio caudaloso e solene, vagas e vagas de fiéis sucediam-se empunhando velas acesas, que se erguiam todas ao céu quando os cânticos repetiam o refrão Ave, Ave, Ave Maria!
     A imagem de Nossa Senhora de Lourdes os precedia como rainha bondosa e muito amada. Enfermos em suas cadeiras de rodas, conduzidas por voluntários uniformizados, eram em número incontável. Durante o dia eles são vistos também na gruta das aparições, nas duas basílicas superpostas, no local dos banhos com água da fonte, por toda parte enfim.
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     O ambiente é impregnado de fé, seriedade e elevação moral. Nota-se naqueles rostos sofridos e chicoteados pelos infortúnios da vida um estado de espírito que, de modo coletivo, só em Lourdes pude constatar. Naquele abençoado lugar, Deus opera, é certo, curas estupendas por intercessão de Nossa Senhora. Mas o maior milagre não são os coxos que andam nem os cegos que veem.
     O maior milagre é a conformidade sobrenatural daquelas almas. Há nelas uma esperança viva de que a Virgem Imaculada as cure; mas, ao mesmo tempo, uma disposição de espírito pela qual desde já aceitam resignadamente, sem revolta, sem acrimônia e mesmo sem tristeza, aquilo que for o desígnio de Deus.
     A graça impregna o ambiente de Lourdes como uma névoa clara e benfazeja; pousa sobre a gruta, sobre as pessoas, difunde-se sobrenaturalmente pelo ar. Após mais de 150 anos de milagres constantes, uma delicada camada de pátina celeste parece ter-se estendido por todos os recantos que circundam o lugar das aparições.
     Sente-se em Lourdes que o olhar da Virgem Santíssima pousa sobre nós, os necessitados e estropiados deste vale de lágrimas, produzindo uma paz de alma profunda, uma resignação perfeita, uma elevação sobrenatural.
     Lourdes tem comunicação direta com o Céu.
 
(*) Gregório Vivanco Lopes é advogado e colaborador da ABIM
Fonte: Agência Boa Imprensa – (ABIM)