Do nascimento da gloriosíssima Mãe de
Deus, Maria, Senhora nossa, a Santa Igreja tem, em uma antífona, estas
palavras: “Vossa natividade, ó Virgem e Mãe de Deus, trouxe gozo e alegria
ao mundo inteiro. Porque de vós nasceu o Sol de justiça, Cristo nosso Deus, o
qual, desfazendo a maldição (debaixo da qual estávamos compreendidos), lançou
sua copiosa bênção sobre nós e, vencendo e matando a morte, nos deu a vida
sempiterna e perdurável”. Com efeito, “festejando solenemente o
nascimento da Virgem Maria, a Igreja canta a aurora da Redenção, a aparição, no
mundo, daquela que devia ser a Mãe do Salvador”.
“Recordando tudo o que anunciava este
nascimento, a Igreja exulta e pede a Deus um aumento de graças de paz, trazidas
aos homens pelo mistério da Encarnação” (Missal romano quotidiano, D.
Gaspar Lefebvre).
Onde nasceu Nossa Senhora?
Essa pergunta, versando sobre tema muito
caro aos católicos, por diversas razões não encontra fácil resposta.
Para entender a escassez de informações nos primeiros séculos da Igreja, sobre
a vida de Nossa Senhora, convém levar em conta as particularidades daquela
época.
O mundo pagão, por efeito da decadência em que se encontrava, era politeísta,
ou seja, os homens adoravam simultaneamente vários deuses. Os pagãos não
achavam ilógico nem absurdo que houvesse várias divindades, ou que elas não
fossem perfeitas. Pior ainda. Consideravam normal que os deuses dessem exemplo
de devassidão moral, sendo, por exemplo, adúlteros, ladrões ou bêbados.
Obviamente, nem todos os deuses eram apresentados como subjugados por esses
vícios, mas o fato de haver vários deles nessas condições tornava imensamente
árduo para os pagãos entender a noção católica do verdadeiro e único Deus, de
perfeição infinita.
Por isso a primitiva Igreja teve muito cuidado ao apresentar Nossa Senhora como
Mãe de Deus, pois aqueles povos, com forte influência do paganismo, rapidamente
tenderiam a transformá-la numa deusa. Somente após a queda do Império Romano do
Ocidente e a sucessiva cristianização dos povos começou a Igreja – que nunca
negou a importância fundamental da Virgem Santíssima na história da salvação –
a colocar Nossa Senhora na evidência que lhe compete e a exaltar suas
maravilhas. E com isso, a fazer um bem indescritível às almas dos fiéis.
É fácil compreender por que nesse longo período, cerca de 400 anos, muitas
informações a respeito da Santíssima Virgem tenham se perdido e outras se
encontrem em fontes não inteiramente confiáveis. Não obstante, a Tradição da
Igreja conservou fielmente aqueles atributos d’Ela que eram necessários para a
integridade da fé dos católicos. O essencial foi transmitido, e, para um filho
que ama sua Mãe, qualquer dado a respeito d’Ela é importante.
Entre esses dados, sobre os quais um véu de mistério permaneceu, está o local
em que nasceu Nossa Senhora.
Belém, Seforis ou Jerusalém
Três cidades disputam a honra de ter sido o local de nascimento da Mãe de Deus.
(1) A primeira é Belém. Deve-se essa tradição ao fato de Nossa Senhora ser de
estirpe real, da casa de Davi. Sendo Belém a cidade de Davi, foi essa a razão
pela qual São José e a Virgem Santíssima – ambos descendentes do Profeta-Rei –
dirigiram-se àquela localidade, por ocasião do censo romano que ordenava a
todos registrarem-se no lugar originário de suas famílias. Por isso, o Menino
Jesus nasceu em Belém, e é aclamado, no Evangelho, como Filho de Davi. O
principal argumento dos que sustentam a tese de que Nossa Senhora nasceu em
Belém encontra-se num documento intitulado De Nativitate S. Mariae,
incluído na continuação das obras de São Jerônimo.
Outra tradição assinala a pequena localidade de Seforis, poucos quilômetros ao
norte de Belém, como o local do nascimento da Virgem. Tal opinião tem como base
que, já na época do Imperador Constantino, no início do século IV, foi
construída uma igreja nessa localidade para celebrar o fato de ali terem
residido São Joaquim e Santa Ana, pais de Nossa Senhora. Santo Epifânio menciona
tal santuário. Os defensores de outras hipóteses assinalam que o fato de os
genitores da Virgem Santíssima terem morado lá não indica necessariamente que
Nossa Senhora haja nascido naquela localidade.
A hipótese que congrega maior número de adeptos é a de que Ela nasceu em
Jerusalém. São Sofrônio, Patriarca de Jerusalém (634-638), escrevendo no ano
603, afirma claramente ser aquela a cidade natal de Maria Santíssima. (2) São
João Damasceno defende a mesma posição.
A festa da Natividade
Na Igreja católica celebramos numerosas festas de santos. Havendo, felizmente,
milhares de santos, comemoram-se milhares de festas. Ocorre que não se celebra
a data de nascimento do santo, mas sim a de sua morte — correspondendo ao dia
da entrada dele na vida eterna. Somente em três casos comemoram-se as festas no
dia do nascimento: Nosso Senhor Jesus Cristo (Natal); o nascimento de São João
Batista; e a natividade da Santíssima Virgem.
A festa da Natividade era celebrada no Oriente católico muito antes de ser
instituída no Ocidente. Segundo uma bela tradição, tal festa teve início quando
São Maurílio a introduziu na diocese de Angers, na França, em consequência de
uma revelação, no ano 430. Um senhor de Angers encontrava-se na pradaria de
Marillais, na noite de 8 de setembro daquele ano, quando ouviu os anjos
cantando no Céu. Perguntou-lhes qual o motivo do cântico. Responderam-lhe que
cantavam em razão de sua alegria pelo nascimento de Nossa Senhora durante a
noite daquele dia. (3)
Em Roma, já no século VII, encontra-se o registro da comemoração de tal festa.
O Papa Sérgio tornou-a solene, mediante uma grande procissão.
Posteriormente, Fulberto, Bispo de Chartres, muito contribuiu para a difusão
dessa data em toda a França. Finalmente, o Papa Inocêncio IV, em 1245, durante
o Concilio de Lyon, estendeu a festividade para toda a Igreja.
Comemoração na atualidade
Por uma série de motivos curiosos, a festa da Natividade é celebrada muito
especialmente na Itália e em Malta. Sendo o povo italiano muito vivo e propenso
a celebrações familiares, não surpreende esse fato.
Em Malta, a principal comemoração da festa consiste numa solene procissão na
localidade de Xaghra. (4)
Na cidade de Florença, no dia da festa, numerosas crianças dirigem-se ao rio
Arno levando pequenas lanternas, que são colocadas na água e lentamente vão
atravessando a cidade.
Na Sicília, na localidade de Mistretta, a população celebra a festa
representando um baile entre dois gigantes. À primeira vista, pareceria que isto
nada tem a ver com o fato histórico. Mas ele corresponde a uma tradição: foi
encontrada uma imagem de Santa Ana com Nossa Senhora ainda menina. Levada à
cidade, a imagem misteriosamente retornou ao local onde havia sido achada, e os
habitantes julgaram que só poderia ter sido levada por gigantes. Proveio dessa
lenda o costume.
Em Moliterno, ao contrário, existe o lindo e pitoresco costume de as meninas da
localidade fixarem pequenas candeias nos chapéus de seus trajes típicos. Em
determinado momento desaparecem as outras luzes e só permanecem as das meninas,
que executam uma dança regional.
Curiosamente, em muitas localidades as luzes desempenham papel determinante na
festa. Podemos conjeturar uma razão para o fato: a Natividade de Nossa Senhora representou
o prenúncio da chegada ao mundo da Luz de Justiça, Nosso Senhor Jesus Cristo.
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Notas:
1. www.enciclopediacatolica.com
2. Nuevo Diccionario de Mariologia, Ediciones
Paulinas.
3. La fête angevine N.D. de France, IV, Paris, 1864, 188.
4. http://www.gozo.gov.mt/generalactivity (The Nativity of Our Lady in Xaghra
Fontes: www.catolicismo.com.br - Valdis Grinsteins;
https://ipco.org.br/08-09-natividade-de-nossa-senhora/
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