sábado, 3 de junho de 2017

Frances Margaret Allen, Religiosa Hospitaleira de São José


 
     Nascida em 13 de novembro de 1784, Frances Margaret Allen foi a filha mais velha do patriota americano Ethan Allen e sua segunda esposa, Frances Montresor Brush Buchanan Allen. Ela nasceu em uma casa construída por seu pai ao lado do Batten Kill em Sunderland, Vermont (Estados Unidos).
     Seu pai morreu de repente em 12 de fevereiro de 1789 quando ela contava apenas 4 anos. Após a morte de seu pai, a família mudou-se para Westminster para viver com sua avó materna. Foi em Westminster que sua mãe se casou com o Dr. Jabez Penniman em 1793. Penniman cuidou de Fanny (como era chamada) como se fosse sua própria filha, mostrando um grande interesse em sua educação.
    Na sua adolescência, Fanny teve uma experiência misteriosa que mais tarde seria um fator importante na sua decisão de entrar na vida religiosa católica. A história, em suas próprias palavras, é a seguinte:
     Quando eu tinha doze anos, estava caminhando um dia nas margens do rio que não fluía muito longe de nossa casa. A água, embora muito clara, rolava em torrentes. De repente, percebi que emergia do rio um animal mais parecido com um monstro que um peixe, pois era de tamanho extraordinário e forma horrível. Ele estava vindo diretamente para mim e tive um arrepio de terror. O que agravou o meu perigo foi que eu não podia me afastar desse monstro. Parecia paralisada e arraigada no chão. Enquanto eu estava nessa situação torturante, vi avançando para mim um homem com um semblante venerável e impressionante, vestindo uma capa marrom e carregando um bastão na mão. Ele segurou meu braço suavemente e me deu forças para me mover enquanto ele me dizia com bondade: "Minha filha, o que você está fazendo aqui? Apresse-se". Então corri o mais rápido que pude. Quando eu estava a uma certa distância, eu me virei para olhar para aquele homem venerável, mas eu não o vi em nenhum lado.
     Ao voltar para casa, Fanny descreveu a experiência para sua mãe, que enviou um servo para procurar o homem para agradecer por sua bondade. O homem nunca foi encontrado.
     Fanny foi educada no Middlebury Seminary e teve interesse em ciência. Ela não foi criada com respeito pela religião, em sua educação não havia espaço para isto. Seu pai era um cético da religião e seu padrasto considerava as afeições do povo religioso de seu tempo com ceticismo.
     Em 1801, Penniman foi nomeado Coletor de Alfândega para Vermont, momento em que a família se mudou para Swanton. Quando tinha 19 anos, Fanny pediu permissão de seus pais para ir para Montreal (Canadá). Ela afirmou que sua intenção era continuar sua educação ao estudar francês, mas seu verdadeiro motivo era talvez uma curiosidade intelectual sobre as crenças e práticas da Igreja Católica, mesmo que nunca tivesse ouvido nada além de observações depreciativas.
     Seus pais concordaram em enviá-la para Montreal, mas primeiro exigiram que ela fosse batizada pelo Rev. Daniel Barber, um sacerdote anglicano de Claremont, New Hampshire, que depois se converteu ao Catolicismo. Fanny que era fortemente irreligiosa na época, opôs-se fortemente, mas consentiu para agradar a sua mãe. No entanto, ela foi repreendida por Barber por rir durante toda a cerimônia.
  
Hotel-Dieu de Montreal onde Fanny professou (em 1826)
 Ela se tornou aluna das Irmãs da Congregação de Notre Dame em Montreal em 1807. Logo se converteria ao Catolicismo romano, sua conversão resultando de uma experiência sobrenatural. Conta-se que uma freira pediu a Fanny que colocasse algumas flores no altar da capela da congregação, pedindo também que ela fizesse uma oração em reconhecimento da Presença Real de Jesus Cristo no tabernáculo. Ela sorriu diante do pedido e não tinha intenção de honrá-lo. Quando ela tentou entrar no santuário, não foi capaz de fazê-lo, como se estivesse bloqueada por uma força invisível. Após três tentativas inúteis, ela ficou convencida da Presença Real e caiu de joelhos em adoração. No entanto, ela não informou isto imediatamente a seus professores, mas esperou algum tempo antes de fazer uma confissão e uma rejeição formal de seu protestantismo.
     Na festa da Natividade, 9 de setembro de 1807, ela pediu para ser instruída na fé. Fanny recebeu instrução na fé católica e foi rebatizada pelo Pe. L. Saulnier, um pároco de Montreal, uma vez que se determinou que seu batismo anterior era inválido devido à falta de disposição adequada para receber o sacramento. Foi na sua Primeira Comunhão que ela concebeu a ideia de ingressar na vida religiosa.
     Sua conversão ao catolicismo foi considerada como notável em Vermont, uma área na qual a Igreja Católica não tinha influência naquela época; foi ainda mais notável por sua decisão de se tornar freira. Em reação, seus pais imediatamente retiraram-na do convento e tentaram distraí-la da ideia de vida religiosa com festas pródigas e pretendentes bonitos. Eles até buscaram a ajuda da Igreja Episcopal para tentar convencê-la de que era a igreja que melhor combinava para ela.
    Fanny estava tão determinada em sua nova fé quanto antes estava em sua descrença. Ela rompeu seu noivado com Archibald Hyde. Todas as tentativas de dissuadir Fanny tiveram pouco efeito, no entanto ela concordou com o pedido de seus pais de esperar um ano antes de agir, durante o qual ela moraria com eles em Swanton. 
     Ao fim de um ano, ela voltou para Montreal, mas não tinha ainda ideia em que congregação religiosa ingressaria. Quando visitou o Hôtel-Dieu de Montreal com sua mãe, ela imediatamente foi atraída por uma pintura que estava pendurada acima do altar da capela. A imagem era uma representação da Sagrada Família. Atônita, comentou com sua mãe que a imagem de São José correspondia exatamente à aparência do homem que a salvara da criatura do rio aos 12 anos. "Ó grande São José", exclamou ela, "sois vós mesmo, o pai adotivo de Jesus, o marido de Maria, que veio me salvar daquele monstro, para me preservar da morte para que eu pudesse conhecer, amar e servir meu Deus. É aqui mesmo, mãe, é com as Irmãs de São José que desejo passar o resto da minha vida!
     Ela então ingressou no Hotel-Dieu, no hospital e no convento fundado pelo Venerável Jerônimo Le Royer, pela Venerável Marie de la Ferre e por Jeanne Mance cerca de 200 anos antes.
Vida religiosa
     Em 29 de setembro de 1808 foi recebida no noviciado das Religiosas Hospitalares de São José. Seus pais, que imaginavam que os conventos católicos não eram "melhores do que muitas prisões", após uma visita na primavera de 1809 ficaram satisfeitos por ver que Fanny estava feliz no convento e notaram também a felicidade das freiras ali e a felicitaram por sua escolha de vida. Quando ela fez sua profissão religiosa em 18 de maio de 1811, a Enciclopédia Católica relata que "a capela do convento estava cheia, muitos amigos americanos vieram testemunhar o estranho espetáculo de a filha de Ethan Allen se tornar uma freira católica". Fanny Allen tornou-se a primeira freira católica da Nova Inglaterra e um farol para muitos personagens célebres de Vermont que se converteram ao Catolicismo.
     Por onze anos Irmã Fanny Allen cuidou dos doentes e dos moribundos. Era um modelo de serviço e de oração enquanto cuidava de soldados feridos em Montreal, servindo de intérprete para os pacientes de língua inglesa, em meio a uma grande pobreza e ameaça iminente de doença durante a Guerra de 1812. Naquele período, ela cuidou de soldados britânicos que tinham sido feridos durante as lutas contra seus compatriotas americanos. Eles não sabiam que uma famosa americana estava cuidando deles.
     Ela passou o resto de sua vida como enfermeira, trabalhando no boticário do hospital. De acordo com relatos contemporâneos, Irmã Allen era frequentemente convocada por americanos que visitavam Montreal, "implorando para ver a linda jovem freira do Hotel-Dieu, que foi a primeira filha que a Nova Inglaterra deu ao recinto sagrado e que eles reivindicavam como pertencendo especialmente a eles por sua conexão com seu herói favorito". Essas interrupções eram aparentemente tão frequentes, que Irmã Allen pediu a permissão de sua Madre Superiora para recusar todas essas visitas, exceto as feitas por amigos da juventude.
     A Irmã Frances Margaret (Fanny) Allen das Religiosas Hospitaleiras de São José morreu em 10 de setembro de 1819 em Montreal no Hotel-Dieu. Tinha 35 anos, e foi enterrada na cripta abaixo da capela do Hotel-Dieu.
Legado
     Ela nunca veria o hospital que leva seu nome até hoje. O Hospital Fanny Allen em Colchester, Vermont, construído em 1879 e administrado pelas Religiosas Hospitalares de São José, recebeu este nome em sua homenagem. Este hospital, agora chamado Fletcher Allen, se fundiu em 1995 com outro hospital e foi reconstruído como o centro de atendimento no oeste de Vermont. Perto do campus deste hospital ainda existe um cemitério que mantém o nome de Fanny Allen
     Suas coirmãs, as Religiosas Hospitaleiras, nunca esquecerem de sua amada irmã na fé, e então, quando o bispo D. João Michaud as convocou para servir os doentes em Vermont, elas se lembraram da Irmã Fanny e aceitaram a oferta. Quando perceberam que a terra onde o hospital deveria ser estabelecido tinha pertencido originalmente à família Allen, elas ficaram mais convencidas a ir a Vermont. Na carta de aceitação ao bispo D. Michaud, elas lembram a primeira freira americana daquela ordem, dizendo: "nossa querida Irmã Allen, de memória doce e piedosa".
 
Hospital Fanny Allen em 1915
    Um de seus biógrafos observa que depois de sua morte vários familiares e amigos se tornaram católicos inspirados por seu testemunho. Seu ex-noivo, Archibald Hyde, ajudou a construir a primeira igreja em Burlington, Vermont (que foi incendiada por anticatólicos). Um dos seus cunhados, William Brayton, e uma amiga da família de longa data, Cynthia Martin, que se casou com Jabez Penniman depois da morte da mãe de Fanny, também seguiram o seu exemplo e optaram pela Igreja Católica. O ministro anglicano que batizou Fanny, Daniel Barber, se converteu e morou perto de seu filho Victor após sua conversão.
     (Obs.: A vida do Pe. Victor Barber, SJ, é digna de nota: ele era casado, com filhos, quando deixou a Igreja Episcopal. Sua esposa, Jerusha, tornou-se freira da Visitação, ele ingressou na Sociedade de Jesus e todos os seus filhos ingressaram em ordens religiosas.)
    Como todos os convertidos, Fanny Allen teve que superar muitos obstáculos, incluindo o medo e o ódio quase inato ao Catolicismo de sua família e de seu Estado. Sua conversão surpreendeu muitos amigos na época porque achavam que ela era muito inteligente para aceitar o que eles chamavam “superstição católica”. Mas ela abraçou a verdade quando encontrou mistérios que não podiam ser explicados somente pelo oráculo da razão. 

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