sexta-feira, 21 de julho de 2017

Santa Maria Madalena – 22 de julho

Maria Madalena, uma grande santa escondida sob lendas infundadas
Ela é uma das pessoas mais importantes da história do cristianismo, mas muitos cristãos só conhecem versões erradas a seu respeito
     [...] Maria Madalena fazia parte do grupo dos discípulos de Jesus, seguiu-o até a Cruz e, no jardim em que se encontrava o sepulcro, foi a primeira testemunha da ressurreição. O Evangelho de João a descreve chorando porque não tinha encontrado o corpo do Senhor no sepulcro. Ela procurou-o no jardim com angústia e sofrimento, com as lágrimas que Santo Anselmo definiu como “lágrimas da humildade”. São Tomás a chamou de “apóstola dos apóstolos” porque foi ela quem anunciou aos discípulos atemorizados e trancados no cenáculo o que eles teriam que anunciar por todo o mundo.
Confusões comuns em torno a Maria Madalena e outras mulheres
     O cardeal Gianfranco Ravasi escreveu a respeito dela:
     “A tradição, repetida mil vezes na história da arte e que perdura até os nossos dias, fez de Maria uma prostituta. Isto aconteceu somente porque na página evangélica precedente (o capítulo 7 de Lucas) é narrada a história da conversão de uma anônima ‘pecadora conhecida naquela cidade’, aquela que havia untado os pés de Jesus com óleo perfumado, quando hóspede na casa de um conhecido fariseu; molhou-os com suas lágrimas e secou-os com seus cabelos. E assim foi identificada Maria Madalena, sem nenhuma relação textual real, com aquela prostituta sem nome. Pois bem: este mesmo gesto de veneração será repetido com Jesus por outra Maria, a irmã de Marta e Lázaro, em outra ocasião (Jo 12, 1-8). E consumou-se com isto mais um equívoco em relação a Maria Madalena: algumas tradições populares a identificam com esta Maria de Betânia, depois de já ter sido confundida com a prostituta da Galileia”.
Relação entre Maria Madalena e Jesus: lendas sem base histórica
     A partir dos relatos do Evangelho, percebe-se que Maria Madalena sentia um grande amor por Jesus. Ela tinha sido livrada por Ele de sete demônios, seguia-O como discípula, assistia-O com seus bens (Lc 8, 2-3) e esteve com Maria, a Mãe de Jesus, e as outras mulheres quando Jesus foi crucificado (Mc 15, 40-41).
     Ela foi, segundo os Evangelhos, a primeira pessoa a quem Jesus apareceu após a Ressurreição, depois de buscá-lo entre lágrimas (Jo 20, 11-18). Daí a veneração que ela recebeu na Igreja como testemunha do Ressuscitado.   
    Dessas passagens não se pode deduzir nem que ela foi pecadora, nem muito menos que foi “a mulher de Jesus”, como diriam os fãs de “O Código Da Vinci“. Os que defendem que ela foi esposa de Jesus se baseiam no testemunho de alguns evangelhos apócrifos: todos eles, talvez com exceção apenas do evangelho de Tomé, são posteriores aos evangelhos canônicos e não têm caráter histórico, sendo, antes, instrumentos para transmitir ensinamentos gnósticos.
     Segundo estas obras que apesar do nome não são evangelhos propriamente, mas revelações particulares de Jesus aos seus discípulos após a Ressurreição, Maria Madalena é quem melhor entendeu tais revelações. Por isso, é a preferida de Jesus e a que recebeu uma revelação especial.
     Alguns textos (Evangelho de Tomé, Diálogos do Salvador, Pistis Sophia, Evangelho de Maria) mostram certa oposição dos apóstolos em relação a Maria Madalena pelo fato de ela ser mulher, e isso reflete a concepção negativa que alguns gnósticos tinham do feminino e da condição de Maria como discípula importante.
     No entanto, alguns pretendem ver nesta oposição um reflexo do que chamam de “postura oficial” da Igreja de então, que seria supostamente contra a liderança espiritual da mulher. Nada disso é demonstrável. Esta oposição poderia ser entendida como um conflito de doutrinas: a de Pedro e dos demais apóstolos diante da doutrina desses grupos gnósticos, expostas em nome de uma certa “Mariam”, que seria a Madalena.
     Em todo caso, o fato de recorrerem a Maria é uma tentativa de justificar sua abordagem gnóstica. Em outros evangelhos apócrifos, especialmente no de Felipe, “Mariam” é modelo do ser gnóstico, precisamente pela sua feminilidade. Ela é um símbolo espiritual do seguimento de Cristo e de união perfeita com Ele. Nesse contexto, tais escritos falam de um beijo entre Jesus e Maria, simbolizando uma espécie de sacramento superior ao Batismo e à Eucaristia.
     É muito relevante observar que nem sequer esses textos apócrifos atribuem conotações sexuais a tais símbolos, a ponto de que nenhum estudioso sério os interpreta como “testemunho histórico” de suposta relação sexual entre Jesus e Maria Madalena. Esta é uma suposição sem qualquer fundamento histórico: nem mesmo os cristãos da época se viram obrigados a polemizar a respeito, pois é uma tese relativamente recente – e que ganha força de tempos em tempos, em particular quando se pretende vender livros de ficção.
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Com informações históricas a partir de texto de Juan Chapa (cf. Aleteia, abril de 2014)

Jesus, casado com Maria Madalena?
Parte dessa lenda se escora num manuscrito apócrifo do ano 570
     Foi lançado em 2014 um dos vários livros que tratam da suposta relação amorosa entre Jesus e Maria Madalena e da família que eles teriam constituído. Os autores de “The Lost Gospel” disseram, na época, ter descoberto um documento do ano 570 segundo o qual Jesus teria se casado e tido filhos com Maria Madalena. Um dos filhos, grande seguidor de Cristo, teria presenciado os momentos da crucificação e da descoberta do sepulcro vazio. Esse manuscrito tinha sido composto em siríaco, língua usada no Oriente Médio entre os séculos IV e XVIII, com trechos em aramaico, a língua de Jesus.
José e Aseneth
     O livro, escrito por Barrie Wilson, professor canadense de estudos religiosos, e Simcha Jacobovici, escritor israelense, suscitou muitas polêmicas. Após anos de estudos, os autores afirmaram que existiria parte de verdade naquele manuscrito que, durante anos, ficou nos arquivos da British Library de Londres. Os dois personagens principais, José e Aseneth, seriam Jesus e Maria Madalena.
Dois filhos
     O texto descreve um casamento que durou sete dias e que teve a bênção do faraó do Egito. Olhando para Aseneth, o faraó teria declarado: “Bem-aventurada pelo Senhor Deus de José, porque ele é o primogênito de Deus, e serás chamada a Filha do Deus Altíssimo e a esposa de José, agora e para sempre”. Nos anos sucessivos, Aseneth teria concebido dois filhos: Manasseh e Ephraim. Segundo Jacobovici, depois que o imperador romano Constantino ordenou destruir todos os evangelhos, sobraram apenas os de Marcos, Lucas, Mateus e João. Dos demais que havia não se tem mais traços – e justamente nesses outros haveria relatos sobre Jesus e Maria Madalena.
O estado civil do Messias
     O padre Rinaldo Fabris, biblista, declarou a Aleteia que “a ausência de informações sobre a infância de Jesus e sobre o seu estado civil instigou a fantasia de muitos narradores cristãos e não cristãos. Esse mesmo vazio dá origem a todos os textos apócrifos”. Por “apócrifos”, a propósito, entende-se um grupo de textos de caráter religioso que se referem à figura de Jesus Cristo, mas que não foram reconhecidos como canônicos.
     “Na verdade – prossegue o padre Fabris – o problema da dificuldade em aceitar um casamento de Jesus não depende de motivos dogmáticos. Se Ele tivesse sido casado e tivesse tido dois filhos, não haveria nada de estranho à fé cristã: casar-se e ter filhos é a história da maior parte dos seres humanos”. E o casamento e a família estão entre os mais excelsos valores defendidos pelos cristãos. Se a Igreja não reconhece tal suposto casamento de Jesus, não é porque tenha algo contra o casamento: é simplesmente porque não existe fundamentação histórica alguma que possa ser levada a sério no sentido de embasar tal hipótese. O alegado “casamento de Jesus” nunca foi documentado, a não ser nesses textos que, segundo o biblista, até podem conservar alguns dados históricos, mas contam algo muito isolado e incompatível com a grande maioria dos relatos históricos mais amplamente aceitos sobre o estado civil do Messias. Além disso, o manuscrito do ano 570 apresenta consideráveis acrobacias fantasiosas ao tratar do relacionamento entre Jesus e Maria Madalena.
A verdadeira Madalena
     Um dos muitos equívocos que persistem no tocante a Maria Madalena é a interpretação de que ela tenha sido prostituta. “É um mito ocidental”, corrige o padre Fabris. “Quem decifra a história de maneira fiel são os textos gregos. Ela era uma pessoa próspera, que estava doente e foi curada por Jesus. Junto com outras mulheres prósperas, ela ‘financia’ Jesus em dados momentos, para ajudar os pobres, comprar um cordeiro para a Páscoa etc. O oitavo capítulo do Evangelho de Lucas menciona este assunto. Essas mulheres apoiavam os discípulos em suas obras”.

Gelsomino Del Guercio / Aleteia Brasil

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