quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

‘NOITE FELIZ’, a história de sua origem

     
     Cada povo tem suas canções, seus próprios cânticos de Natal. Entretanto existe uma canção de Natal interpretada praticamente no mundo inteiro, em todas as línguas, “Noite Feliz” ou “Stille Nacht”, conforme seu título em alemão.
    Há mais de 200 anos, no dia 11 de dezembro de 1792, um ano depois da morte de Mozart, um menino pobre nasceu na mesma cidade do célebre compositor, em Salzburgo, Áustria. Era o terceiro filho de Ana Schoiber, uma costureira que remendava e fabricava meias. O pai dele chamava-se Joseph Mohr, um soldado que legou o nome ao filho antes de desertar e desaparecer, deixando a família na miséria. As autoridades de Salzburgo acharam que 3 filhos naturais era demais. Ana Schoiber foi condenada a pagar uma multa de 9 florins.
     Naquele momento surgiu a salvação na pessoa de Joseph Wohlmuth, um homem que afirmou querer pagar a multa de Ana Schoiber se pudesse ser o padrinho do pequeno Joseph. Visto que Wohlmuth era o carrasco oficial de Salzburgo, ele não podia entrar na igreja para o batismo da criança, e mandou sua cozinheira substitui-lo na cerimônia. Foi assim que começou a vida difícil do menino Joseph Mohr: sem pai, vivendo na miséria com a mãe e dois irmãos, tendo um padrinho que era o carrasco da cidade.
     A pequena família morava perto do Monte dos Capuchinhos, num apartamento invadido pela umidade: tal situação foi a origem da tuberculose de Joseph. Em condições tão precárias como essas, na Salzburgo do início do século 18, era impossível prever um futuro para um menino que nem sequer tinha a oportunidade de aprender um oficio. Muitas vezes, sentado na escada da casa, Joseph pensava cantando em voz alta. Um dirigente do coro da Catedral de Salzburgo descobriu essa voz e convenceu a mãe que deixasse o filho cantar na igreja. Abriram-se assim para Joseph as portas de uma vida melhor.
     Uma certa amargura surgiu depois daquela felicidade: nos registros da escola Joseph Mohr teve de ser declarado órfão, medida tomada para proteger o menino, visto que na época filhos de mães solteiras não eram admitidos em nenhum lugar. Apesar de tudo, aos 7 anos de idade, Joseph foi para a escola primária e alguns anos mais tarde terminou o curso secundário. Já tocava violino e cantava no coro da Igreja de São Pedro de Salzburgo.
     Em 1810 encontramos Joseph Mohr estudando filosofia e preparando-se para o sacerdócio. Um ano mais tarde entrou no seminário. No dia 15 de julho de 1815 foi ordenado numa cerimônia solene na Catedral de Salzburgo. É incrível o caminho percorrido por esse menino pobre de Salzburgo. A partir de um berço cercado por tantas privações tornou-se um sacerdote da Igreja.
     Pouco tempo depois da sua ordenação o novo sacerdote teve que se apresentar como vicário em Mariapfarr, um povoado longe de Salzburgo. Foi em Mariapfarr que seu pai tinha nascido. Joseph tinha o pressentimento que ali ele iria encontrar alguns parentes, e, que teria de abandonar o anonimato de seu estado civil de órfão. Esse povoado se encontra a mais de 1000 metros de altitude e só era acessível no verão, em razão da neve invernal. O pároco de Mariapfarr contou ao novo vigário que muitas casas da região haviam sido construídas com pedras de lugares sagrados dos romanos e dos celtas e que ainda existiam muitas tradições em matéria de medicina e nos costumes dos habitantes em geral.
     Joseph Mohr visitou essas construções perdidas nas montanhas. Os passeios nos bosques, o ar puro e a vida sadia fizeram desaparecer quase que completamente os seus problemas pulmonares. Em Mariapfarr, Joseph Mohr encontrou o seu avô. Era um homem sábio, conhecedor de todas as tradições e da vida dos camponeses da região. Ninguém perguntou nada a Joseph sobre sua origem: todo mundo aceitou-o como padre e como neto do velho Mohr. Na sua paróquia, Joseph viveu um Natal extraordinário. Quando estudante assistira a festas solenes e frias que não haviam tocado o seu coração. Em Mariapfarr Joseph viu que com canções populares podem existir festas alegres e profundas que despertam calor humano e sentimentos de caridade nos corações.

     É possível que naquela atmosfera, tão diferente da Catedral de Salzburgo, tenha surgido a primeira semente da poesia da canção “Noite Feliz”. Quando todos os fiéis saíram da igreja, os coroinhas acenderam as velas das lanternas para iluminar o caminho das casas. “Noite silenciosa, noite santa. Todos dormem. Só o santíssimo casal vela com carinho. Gracioso menino de cabelo anelado: durma na paz celeste”. Assim começa a primeira estrofe da poesia que escreveu Joseph Mohr. Recentemente, encontramos em Salzburgo um fac-símile do ano de 1816 da canção “Noite Feliz” para duas vozes e violão, com letra de Joseph Mohr, música de Franz Xaver Gruber. 1816 foi o ano da morte do avô de Joseph em Mariapfarr. O texto foi escrito quando a guerra havia terminado na Áustria.
     A tuberculose reincidiu. Depois de um período de convalescença em Salzburgo, Joseph viu que não podia viver na montanha. Como vigário encontrou outra paróquia a 20 km ao norte de Salzburgo, no povoado de Oberndorf, à margem do rio Salzach. Foi ali que ele conheceu o maestro Franz Xaver Gruber, organista, músico.
     Os dois amigos começaram a tocar juntos na igreja e em casa. Joseph Mohr ficou muito feliz em reencontrar o rio e os bosques de sua juventude. Foi bem aceito pelos fiéis, porque um padre que podia ficar em posição reta e de pé numa embarcação era uma pessoa merecedora de respeito. Mas o padre do povoado ficou com ciúmes da ascendência espiritual do jovem vigário entre os fiéis. Ele descobriu que Joseph era filho natural e começou a amargar a sua vida.
     Estamos perto do Natal de 1818. O maestro e amigo Franz Xaver Gruber tentou uma reconciliação organizando uma vigília de Natal. O Pe. Joseph visitou seu amigo, que morava num apartamentinho acima da escolinha da vizinha aldeia de Arnsdorf. Mostrou-lhe o poema que havia escrito em Mariapfarr e os dois amigos trabalharam na composição. Assim, em 25 de dezembro de 1818, nasceu a canção de Natal que hoje em dia é interpretada no mundo inteiro, em todas as línguas “Noite Feliz”.
     Quando aqueles dois homens acompanhados pelo coro cantavam por vez primeira em pé diante do altarzinho da capela de São Nicolau, o “Stille Nacht! Heiligen Nacht!”, não faziam ideia da repercussão que o fato teria no mundo.
Franz Xaver Gruber e Pe. Joseph Mohr
     Karl Mauracher, mestre construtor e reparador de órgãos viajou várias vezes a Oberndorf para consertar o órgão. Numa das viagens obteve a partitura e a levou para sua terra. Foi assim, também despretensiosamente, que começou a difusão.
     De início, nem tinha nome e era chamada de “canção folclórica tirolesa”. Duas famílias que viajavam cantando canções populares do vale do Ziller incorporaram a peça a seu repertório e a entoaram em dezembro de 1832 em Leipzig num concerto de música folclórica. A partir de então a difusão progrediu como mancha de azeite.  
     Por fim, a família Rainer cantou o Stille Nacht na presença do imperador da Áustria Francisco I e do czar da Rússia Alexandre I. A canção natalina passou a ser a preferida do rei Frederico Guilherme IV da Prússia.
     O Pe. Joseph morreu pobremente na cidadezinha de Wagrain, nos Alpes, como pároco. Ele doou todos os seus bens para a educação das crianças.
     O inspetor escolar de São Johann, num relatório ao bispo, descreve o Pe. Joseph como um amigo dos fiéis, sempre perto dos pobres e um pai protetor. Seu nome foi esquecido por todos até ser recuperado posteriormente.
     A família de Franz Xaver Gruber conservou alguns dos humildes móveis do músico e o violão daquela noite abençoada, hoje peça histórica. O túmulo de Franz é decorado com uma árvore de Natal todos os meses de dezembro.
     A imagem dos dois coautores está nos vitralzinhos da capelinha de São Nicolau.
     Assim é a riqueza insondável da Igreja: faz nascer no coração dos humildes e despretensiosos frutos de graça, perfeição e beleza que os gênios naturalmente mais dotados do mundo jamais conseguem superar.



Fontes: Autor: Peter Schuler; Tradução: Magda Bonetti; Versão brasileira: Torquato Leitãohttp://queridosfilhos.org.br/Natal_noite_feliz_historia.html; catedraismedievais.blogspot.com/

A capela do "Stille Nach" em Oberndorf

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