Florença nasceu na Frígia, de pais imersos nas trevas do paganismo, e
que a tinha educado nos mesmos erros. Seus pais eram colonos romanos
estabelecidos na Ásia Menor, ao longo da estrada que da Frigia conduzia a
Selêucia. Florença é citada na “Vita Hilarii” do século VII, que narra a vida
de Santo Hilário, primeiro Doutor da Igreja Latina.
Em 359, Santo Hilário, exilado há quatro anos, e defendendo a fé nos
locais entregues ao arianismo, foi para a Selêucia, cidade da Isauria onde a
heresia tinha inspirado um concilio para o final de setembro (Sínodo dos
Orientais de 359).
Um domingo, passando por uma pequena cidade que, infelizmente, a
história não diz o nome, ele entrou na igreja católica no momento em que as
pessoas já estavam reunidas para a oração. De repente, no meio da multidão, uma
menina corre e entra nas fileiras cerradas, ela clama que um grande servo de
Deus está ali e, prostrada a seus pés, implora que pelo Sinal da Cruz ela
ingresse no rebanho de Cristo, ela protesta que não vai se erguer senão após
ter seu pedido atendido.
Era Florença, que um movimento do Espírito Santo enviava para o grande doutor,
cujo nome ilustre não era conhecido no Oriente, e Ele fazia conhecido
misteriosamente. Hilário deu-lhe sua bênção, que era um símbolo do Santo Batismo
que ela recebeu alguns dias depois. A piedosa criança não teve só aquela
felicidade. Instruída sobre as verdades da fé, durante o curto tempo que lhe
podia dar o grande bispo, o pai de Florença, sua mãe e sua família toda se
deram a Deus, e foram lavados na mesma regeneração.
Nós não sabemos o que aconteceu com esta conquista de toda uma família,
onde "a salvação foi introduzido pelo ministério de um Santo e pelo
exemplo tocante da inocente virgem”. Para ela, uma via milagrosa foi traçada, e
ela a seguiu.
Alguns meses mais tarde, na primavera do ano 360, como Santo Hilário era
vencedor dos inimigos de Jesus Cristo e devastador da sua causa, estes
reconheceram a necessidade de livrar-se dele no Oriente; ele retornou ao
Ocidente após uma ordem de Constantino.
Tomando conhecimento do fato, Florença obteve de seus pais a liberdade
de segui-lo, atravessando com ele os mares que separam a Grécia da Itália;
cruzou os Alpes, atravessou as várias províncias da Gália, emocionadas ainda pela
rápida passagem do grande doutor, e chegou a Poitiers, quando todos comemoravam
o seu retorno.
A fervorosa viajante foi recebida de todo o coração pelo Santo, que ela
chamava de pai, a mais justo título, dizia ela, do que aquele que lhe tinha
dado a vida, pois ela tinha uma segunda vida mil vezes mais preciosa.
Os ensinamentos que ela recebeu e o modelo de santidade que ela tinha
diante dos olhos, levaram-na logo a uma grande piedade, a um coração dócil à
graça que o tinha tão admiravelmente preparado. O conhecimento de Deus e de seu
divino Filho, a meditação das verdades reveladas, produziram nela um amor
profundo pelas coisas do Céu e uma rejeição proporcional as da terra. Este
sentimento tendo aumentado continuamente, levou-a a solicitar a fuga do mundo numa
solidão absoluta, e o santo bispo, cedendo às seus rogos, após ter provado a
sua perseverança, deu-lhe em Comblé (Vienne), perto de sua terra Celle-L’Evescault,
uma cela estreita e um pequeno jardim, onde ela se fixou para ali entregar-se
continuamente aos piedosos exercícios da vida solitária. Na mesma ocasião,
Santa Triaise abraçou em Poitiers o igual tipo de perfeição. O grande homem
ficou satisfeito de ter colocado perto de todas suas casas anjos visíveis cujas
virtudes o consolavam das impiedades de seus inimigos.
O bom Pai não abandonava a si mesma na solidão esta menina criada por
ele para a graça. Ele a visitava, a enchia de Deus, dirigia sua alma, e,
voltando em seguida às suas viagens ao campo, deixava-a progredir sob a ação do
Espírito Santo. Esses avanços foram em breve notados por este grande mestre que
os tinha demarcado em sua sabedoria providencial. A oração contínua da santa
virgem, suas vigílias frequentes, seus jejuns e outras austeridades apressaram
o momento em que o Céu se deveria abrir para esta vida angelical. Ela viveu
pouco mais de seis ou sete anos desde sua reclusão voluntária, e sua alma se uniu
ao Senhor em 1º de dezembro de 366, na idade de 29 anos.
O Santo Bispo, que ela precedeu de um ano, deu-lhe uma sepultura digna
dela e dele, no mesmo lugar em que ela se havia santificado por tão admiráveis
sacrifícios. Seu corpo foi homenageado por muito tempo, e graças milagrosas
atraíam os fiéis. Uma igreja foi construída pouco tempo depois, e tornou-se um
priorado da abadia vizinha de NouaiIIe.
Quando os séculos trouxeram guerras sucessivas ao Poitou, com todas as
calamidades que as acompanham, o pequeno edifício teve o destino de uma série
de outros muito mais importantes, e durante tantos anos infelizes, as relíquias
da Virgem humilde e gloriosa foram perdidas e completamente esquecidas.
Como o domínio do Celle-L’Evescault não tinha deixado de pertencer aos
bispos de Poitiers, de quem derivava seu nome, somente no século XI Isambert 1º,
um de seus sucessores (1028-1047) as descobriu em Comblé e as transportou
solenemente até Poitiers. Colocados na catedral, no pavimento entre o altar da
Virgem Maria e de Santa Madalena, uma capela foi anexada a este último, sob o
patrocínio de Santa Florença.
No entanto, os seus despojos não permaneceram enterrados por muito
tempo, eles que se tornaram tão valiosos para os habitantes do Poitou. Um
bonito relicário de prata foi dado a eles. A cada ano, nas célebres procissões
das Rogações, esse belo relicário era usado ao lado do que continha os restos
mortais de São Pedro. Recorriam também a Santa em secas e outras calamidades
públicas, “para ter”, como diz um velho historiador, “chuva ou tempo sereno
desde o dia ou no dia seguinte à procissão, como eu vi fazer por várias regiões”.
Mas, o dia 27 de maio de 1562 chegou. Naquele dia, as hordas bárbaras
que protestavam contra a fé e os templos, saquearam todas as igrejas de
Poitiers. Santa Florença não obteve graças para aqueles que queimaram todas as
relíquias, e as suas foram envolvidas pelas chamas como as outras.
Felizmente, em 1698, uma descoberta veio compensar a Igreja Matriz desta
perda que pensavam irreparável. Uma parte do corpo santo havia sido deixada em
sua segunda sepultura, atrás do coro da catedral, e a sua autenticidade pode
ser reconhecida. A igreja então não tinha recursos suficientes para mandar
fazer um relicário adequado. Preferiram depositar os santos ossos sob o
altar-mor, onde eles ainda estão; é por isso que o capítulo faz a cada ano, no
dia 1º de dezembro, a festa de Santa Florença.