segunda-feira, 27 de abril de 2020

Santa Gianna Beretta Molla, Mãe, Esposa, Médica – 28 de abril

     
     Gianna era ardorosa defensora da vida, sobretudo das crianças, nascituras ou já nascidas. Defendia corajosamente o direito de a criança nascer. Dizia: "O médico não se deve intrometer... O direito à vida da criança é igual ao direito à vida da mãe. O médico não pode decidir. É pecado matar no seio materno!"
      Gianna Beretta nasceu em Magenta (Milão, Itália) aos 4 de outubro de 1922, dia de São Francisco de Assis, filha de Alberto Beretta e Maria Michelli, ambos da Ordem Franciscana Secular; era a 12ª filha do casal Beretta.
     Desde muito pequena, Gianna acompanhava sua mãe à Missa diária e – no fervor da norma dada pelo Papa São Pio X para que as crianças pudessem receber o Senhor Jesus na Eucaristia – e devido ao cuidado em seus estudos religiosos por seus pais e sua irmã mais velha Amélia, Gianna foi autorizada a fazer sua 1ª. Comunhão aos 5 anos e meio. Em 4 de abril de 1948 ela recebeu sua 1ª. Comunhão na paróquia de Santa Grata em Bérgamo. Dois anos depois, ela foi confirmada na Catedral. A partir daí, Gianna ia à missa e recebia a Comunhão diariamente, qualquer que fosse o clima ou seus estudos.
     Aos 15 anos, depois de um retiro segundo o método de Santo Inácio de Loyola, tomou o propósito de “mil vezes morrer a cometer um pecado mortal”. Era muito devota da Virgem, tanto que, quando sua mãe morreu, disse a Maria: “Confio em Vós, doce Mãe, e tenho a certeza de que nunca me abandonará”. Costumava falar da Mãe de Deus em seus encontros com as meninas da Ação Católica e nas cartas ao seu noivo que logo se tornou seu marido.
      Durante os anos de estudos e na Universidade, enquanto se dedicava diligentemente aos seus deveres, exercia generoso apostolado entre os jovens da Ação Católica e de caridade para com os idosos e os necessitados nas Conferências de São Vicente. Nunca deixou de rezar nem de demonstrar a sua fé por meio das obras.
1a./Comunhão de Gianna
     Laureada com louvor em Medicina e Cirurgia em 1949 pela Universidade de Pavia (Itália), especializou-se em Pediatria. No exercício da Medicina tinha um firme propósito: “Não esqueçamos que no corpo de nosso paciente existe uma alma imortal. Sejamos honestos e médicos de fé”. Por isso, incentivava as grávidas a terem seus filhos como um presente de Deus e a recusar o aborto.
     Em 1950 abriu seu consultório médico em Mêsero (nos arredores de Milão). Especializou-se em pediatria na Universidade de Milão em 1952 e, entre seus clientes, demonstrava especial cuidado para as mães, crianças, idosos e pobres.
     Pretendia unir-se ao seu irmão, Padre Alberto, médico e missionário no Brasil, que havia fundado um hospital na cidade de Grajaú, no Estado do Maranhão, mas foi desaconselhada por seu Bispo.
     No ano de 1954, conheceu o engenheiro Pietro Molla. Noivaram em 11 de abril de 1955 e casaram-se no dia 24 de setembro do mesmo ano, tendo a cerimônia sido presidida por seu outro irmão, Padre José, na Basílica de São Martinho, em Magenta. Durante o noivado escreveu ao seu noivo: "Quero formar uma família verdadeiramente cristã; um pequeno cenáculo onde o Senhor reine nos nossos corações, ilumine as nossas decisões, guie os nossos programas".
      Em novembro de 1956, já é a radiosa mãe de Pedro Luís; em dezembro de 1957 de Mariolina e, em julho de 1959, de Laura. Com simplicidade e equilíbrio, harmoniza os deveres de mãe, de esposa, de médica e da grande alegria de viver. Depois do nascimento de Laura, a médica perdeu, por causas não bem explicadas pela Medicina de então, na quinta e na sexta gravidez, dois de seus filhos sempre no segundo mês de gestação.
     Em 1961, aos 39 anos, no entanto, engravidou pela sétima vez, e descobriu-se que tinha um fibroma no útero. Três opções lhe foram apresentadas naquele momento: retirar o útero doente, o que ocasionaria a morte da criança; abortar o feto, ou, a mais arriscada, submeter-se a uma cirurgia de risco e preservar a gravidez. Ela optou pela última alternativa.
     Alguns dias antes do parto, sempre com grande confiança na Providência, demonstrava-se pronta a sacrificar sua vida para salvar a do filho: “Se deveis decidir entre mim e o filho, nenhuma hesitação: escolhei - e isto o exijo - a criança. Salvai-a!”.
     Deu entrada, para o parto, no hospital de Monza, na sexta-feira da Semana Santa de 1962. Na manhã de 21 de abril de 1962 nasceu Joana Manuela, a quem teve por breves instantes em seus braços. Sempre afirmou: “Entre a minha vida e a do meu filho salvem a criança!”. 
    Apesar dos esforços para salvar a vida de ambos, na manhã de 28 de abril, em meio a atrozes dores e após ter repetido a jaculatória “Jesus eu te amo, eu te amo”, morreu santamente. Tinha 39 anos. Seus funerais transformaram-se em grande manifestação popular de profunda comoção, de fé e de oração.
     O milagre para a beatificação aconteceu no Brasil, em 1977, na cidade de Grajau, no Maranhão, naquele mesmo hospital onde Gianna queria ser missionária.
     Foi beatificada em 24 de abril de 1994; e canonizada no dia 16 de maio de 2004, quando recebeu de João Paulo II o sugestivo título de "Mãe de Família". Na cerimônia estavam presentes o seu marido Pietro Molla, as filhas Gianna Emanuela e Laura, e o filho Pierluigi. Mariolina faleceu com seis anos, dois anos após a mãe.
     A Santa repousa no cemitério de Mêsero, distante 4 quilômetros de Magenta, nos arredores de Milão (Itália).

Oração:
     “Senhor, que seja Tua Vontade. Amamos a Cruz e temos que refletir que não a carregamos sozinhos(as), se não que é Jesus que nos ajuda a carregá-la e que Nele somos capazes de fazê-lo, já que Ele nos dá a força necessária para isso”. (Gianna Beretta Molla

Filha de Santa Gianna Beretta Molla conta qual o “segredo” da santidade de sua mãe

     O que foi que levou Santa Gianna Beretta Molla a escolher a vida de sua filha à custa de sua própria quando confrontada com a decisão? O que foi que a permitiu louvar e agradecer a Deus mesmo morrendo depois de dar à luz ao seu saudável bebê, deixando quatro crianças pequenas e um marido amoroso?
     O segredo da santidade de Santa Gianna foi revelado ao LifeSiteNews em uma entrevista com a própria pessoa para quem a santa deu sua vida: a sua filha Gianna Emanuela Molla.
     Gianna Emanuela, 54 anos, disse que se a vida de seus pais a ensinou algo é que o “caminho da cruz” é “seguramente o caminho certo” que os cristãos devem seguir “para poder um dia desfrutar da alegria de estar no paraíso diante de Deus, para sempre”.
     Gianna Emanuela disse que o “sim” de sua mãe a Deus em meio às complicações e a agonizante dor em torno da gravidez e do parto permitiram que Deus levantasse algo belo daquilo que a maioria das pessoas consideraria uma situação de desespero.
     “Minha Santa Mãe ao dizer o seu ‘sim’ a Deus permitiu que Deus realizasse (trouxesse ao cumprimento) a minha própria vida de maneira completa”.
    Ela disse que a chave para abraçar a cruz de forma que isso se transforme em fonte de alegria é “continuamente” agradecer a Deus por tudo, de bom e de ruim, que acontece em nosso caminho.
     “Mamãe e papai sofreram muito em suas vidas… E mesmo sofrendo muito, eles tinham uma grande alegria no coração. Eles continuamente agradeciam a Deus, isso era o segredo deles. Se pensarmos que Jesus foi à cruz, não é possível pensar num caminho diferente para nós [como cristãos]. Este caminho da cruz, é também o caminho da alegria”.

Fontes:

Postado neste blog em 28 de abril de 2012

sábado, 25 de abril de 2020

Santa Huna, Viúva na Alsácia – 25 de abril

     As informações sobre Santa Huna constam da “Vita Deodati” escrita entretanto três séculos e meio depois de sua existência; esta “Vita” narra as obras de São Deodato (St. Dié), bispo escocês peregrino e de certa forma também legendária.
     De acordo com Ruyr e Riguet, Huna pertencia à família real da Borgonha. Um manuscrito preservado na freguesia de Hunawihr sublinha que ela nasceu em torno de 620, e descendia de São Sigismundo, rei da Borgonha. O sangue de Santa Odila corria nas veias desta nobre dama.
     Ela viveu no século VII, aos pés do Vosges, na aldeia da Alsácia que deve a ela o seu nome, Hunawihr. Ela se casou com um piedoso senhor alsaciano chamado Hunon. As ruínas do seu castelo ainda são visíveis a três léguas de Colmar, numa encantadora região entre Zellenberg e a 1 km ao sul de Ribeauvillé.
     Eles construíram uma igreja em honra de São Tiago Maior, que mais tarde legaram para a Abadia de St-Dié. O nascimento de um filho iria colocar a castelã em relacionamento com São Deodato.
     É muito provável que os senhores de Hunawihr estivessem estáveis em terras que haviam pertencido a uma colônia romana, e nas quais havia um pequeno estabelecimento termal. Isto permitiu-lhes cuidar dos doentes e dos pobres que tinham se refugiado nas ruínas dos antigos banhos.
     Os seus parentes, os Duques da Alsácia, protegiam os monges escoceses de São Columbano, itinerantes naquela região (o território ao longo dos séculos pertenceu, de acordo com os acontecimentos políticos, de vez em quando à França ou à Alemanha, hoje é francês). Entre eles havia o já mencionado São Deodato, Bispo de Nevers, que morava então na Alsácia.
     Como uma outra Santa Ana, Huna pediu a Deus uma posteridade. O Senhor atendeu seus pedidos e ela deu à luz um filho. Huna o ofereceu ao Eterno e o consagrou ao serviço do altar. Este jovem rebento de uma ilustre família foi batizado por São Deodato. O santo prelado lhe deu seu nome e o recebeu mais tarde no número de seus religiosos em Ebersmunster, onde ele morreu em odor de santidade. A história quase não fala dele.
     São Deodato, que governava então as abadias de Ebersmunster e de Jointure, na Lorena, visitava com frequência o castelo de Huna e contribuía, pelo seu exemplo e suas exortações, para o progresso desta humilde serva de Deus.
     Como seu único filho ingressara no convento de Ebersheimmünster, ela transferiu toda sua ternura para os pobres e infelizes, dedicando-se à provê-los de alimento e vestimenta, tratando dos doentes, inclusive lavando suas roupas de cama, muitas vezes purulentas, na fonte próxima ao castelo.
     Seu castelo era asilo onde se refugiavam os necessitados, porque ela não só lhes dispensava dinheiro, mas cuidava de seus enfermos fazendo os serviços mais humildes; muito tempo após sua morte as pessoas mostravam a fonte onde ela não se envergonhava de ir lavar as roupas dos pobres, o que lhe valeu o sobrenome de Santa Lavadeira.
     Diz-se que seu castelo frequentemente estava repleto de uma multidão de pobres que vinham lhe expor suas penas. Huna os recebia sempre com uma extrema boa vontade que a todos tocava, procurando consolá-los, melhorar sua situação e contribuindo para isto de todas as maneiras. A confiança que o povo punha nela ia a tal ponto, que muitas vezes a colocavam como árbitro de contendas, e que se submetiam às suas decisões sem murmurar.
     A “Vita Deodati” considera Hunon como o principal benfeitor da Abadia de St-Dié; Huna é nomeada apenas como sua esposa. Mais tarde, na tradição popular, Huna assumiria o papel mais importante dentre os piedosos cônjuges por sua intensa vida de caridade, continuada ao longo dos anos de sua viuvez até sua morte em 679.
     Huna mereceu o nome de princesa santa durante sua vida e sua morte colocou de luto e de aflição todos que a haviam conhecido.
      Em 1520, a pedido de Ulrich, Duque de Württemberg, senhor do lugar, do bispo de Basileia e dos cônegos de St-Dié, o Papa Leão X autorizou a ‘elevação’ dos restos mortais de Huna conservados em Hunawihr (no primeiro milênio a cerimônia era considerada a canonização do personagem reverenciado, sendo proclamado santo no âmbito da diocese requerente).
     Mas pouco tempo depois o Duque Ulrich (1487-1550), aderiu à Pseudo-Reforma Protestante, e já em 1540 as relíquias de Santa Huna foram profanadas e espalhadas pelos moradores que se tornaram seguidores do pseudo-reformador protestante Zwinglio (1484-1531).
     Em 1865, a diocese de Estrasburgo, a atual capital do departamento francês do Baixo Reno, que inclui a Alsácia, pode inscrever no Livro Litúrgico a festa da santa viúva no dia 25 de abril, o dia da comemoração da ‘elevação’ de 1520. Outras regiões da Alsácia a recordam em dias diferentes, como o dia 15 de abril.
     Pelo milagre operado por São Deodato, que fez jorrar água de uma fonte para ajudar Huna, que lavava pessoalmente as roupas dos pobres, ela é considerada a padroeira das lavadeiras na Alsácia.
     A representação mais venerável de Santa Huna é a dos vitrais da Catedral de Saint-Dié, único precioso vestígio do final do século XIII. Santa Huna aí é representada com seu marido, ao lado de São Deodato com a cruz e a mitra.

Fontes: (Segundo a história dos santos de Vosges, obra do Cônego Laurent "Eles são nossos antepassados" - Diocese de Saint-Die); www.santiebeati.it/
Les Petites Bollandistes: Vies des saints, tome 6.

Postado neste blog em 24 de abril de 2015

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Santa Oportuna de Séez, Abadessa - 22 de abril

 
“A taumaturga da Normandia”
Martirológio Romano: Na região de Séez, na Nêustria, Santa Oportuna, abadessa, célebre por sua abstinência e austeridade (c. 770).
Etimologicamente: Oportuna = Aquela que nos conduz ao porto, é de origem latina

     Uma Vita et miracula Sanctae Opportunae foi escrita cerca de um século após sua morte (ca. 885-88) por Santo Adelmo, bispo de Séez (*).
     Santa Oportuna nasceu na outrora importante Exmes, na diocese de Séez, próximo de Argentan, numa data desconhecida. Seu pai governava esta região com o título de conde; seu irmão, Santo Crodegran, ocupava a sede episcopal de Séez; e sua tia, Santa Lantilde, era abadessa das beneditinas de Almenèches, fundada dois séculos antes.
     Muito jovem Oportuna decidiu ingressar no convento. Embora a abadia beneditina de Almenèches governada por sua tia ficasse mais próxima, ela preferiu a solidão de Montreuil, pequeno mosteiro no vale do Auge, célebre por sua estrita observância. Oportuna recebeu o véu pelas mãos de seu irmão, Crodegran, alguns dias após sua entrada na abadia.
     Após o falecimento da abadessa, as religiosas escolheram-na para sucedê-la. A nova abadessa mudou de condição, mas não de conduta, aumentou suas devoções e penitências. Ela dormia sobre a terra nua e tinha por coberta um simples cilício; alimentava-se apenas de pão e aos domingos comia um pouco de peixe; jejuava nas 4as e 6as feiras.
     Oportuna primava pela prudência e pela caridade com os pobres; tinha uma maneira muito peculiar para instruir suas filhas, ou para corrigi-las, sempre temperando a justiça com a misericórdia, por suas orações e exemplo. Ela fazia isto tão bem, que as mais recalcitrantes se tornavam dóceis aos movimentos do espírito de Deus que a conduzia.
     Contudo, como a vida dos justos é cheia de cruzes para estar conforme a de Jesus Cristo, Deus permitiu que ela as tivesse e a maior foi a seguinte:
     Seu irmão, Crodegran, fez uma viagem a Roma e a Palestina para visitar os lugares santos. Ele deixou como vigário geral Godoberto. Este, ao invés de agir como o bom pastor, tornou-se um lobo por suas injustiças, especialmente contra as pessoas religiosas da diocese e em particular contra Oportuna. Sua ambição, tão alta quanto violenta, o fez se consagrar bispo de Séez. Oportuna rezava pedindo o fim de tanta desordem.
     Finalmente, sete anos depois de sua partida, o Santo voltou a sua diocese e restabeleceu a ordem. Furioso com sua deposição, Godoberto conspirou contra a vida do santo bispo e o mandou assassinar durante o trajeto de uma visita que ele faria a irmã. Pessoas piedosas desejavam dar sepultura ao bispo, mas sua irmã, que chegara ao local do crime, o levou para seu mosteiro, onde ele foi solenemente sepultado.
     Algumas fontes dizem que Oportuna morreu de uma doença causada pelo sofrimento após a morte de seu irmão, que ocorreu dia 3 de setembro de 769. Embora ela tivesse previsto sua morte numa visão profética, nada pode fazer para impedi-la.
     Antes de sua morte a Santa teve uma visão: recebeu a visita das Santas Luzia e Cecília, cuja presença inundou sua cela de uma brilhante claridade e de um odor muito agradável; elas asseguraram que a Rainha dos céus logo viria buscá-la. Oportuna recebeu o santo viático e a Ssma. Virgem lhe apareceu para levá-la em seus braços. Era o dia 22 de abril de 770. Seu corpo foi sepultado próximo ao de seu irmão.
     Devido aos inúmeros milagres que ocorriam junto a sua sepultura, muito numerosas eram as visitas que lhe fazia o povo rogando por sua intercessão. Foram tantos os milagres alcançados, que Santa Oportuna ficou conhecida como “a taumaturga da Normandia”.
     A vida de Santa Oportuna relata que certa vez um camponês roubou um jumento do convento e recusava admitir seu crime. Oportuna deixou o caso nas mãos de Deus e no dia seguinte o campo do homem estava coberto de sal. O camponês arrependido atirou-se aos pés da santa abadessa e pediu perdão pelo que fizera; não apenas devolveu o animal, como doou as terras para as religiosas, que passou a chamar-se Campo Salgado. Tempos mais tarde, ali se construiu uma capela, pequenina e graciosa que se dedicou à Santa.
     Oportuna também recebeu de Deus o poder de submeter os animais e as aves à sua vontade. Certa vez, foram dizer-lhe que uma nuvem de passarinhos se abatera sobre as hortas das redondezas e estava causando um estrago terrível. Oportuna foi-lhes ao encontro. E dizendo às avezinhas que se considerassem suas prisioneiras, passou, suavemente, a reprovar o que andavam fazendo.
     Nem bem chegara de volta à abadia, e alguém veio contar-lhe que as aves, portando-se estranhamente, voando e piando tristemente, não abandonavam um determinado lugar. Tornou então ao local e tendo descoberto que haviam matado um deles, por isso que chilreavam tão compungidamente e não se iam, Oportuna, tomando ternamente nas mãos a avezinha morta, rogando a Deus, restituiu-lhe a vida. Num grande bando que empanou a luz do sol, os pássaros, agora cantando alegremente, desapareceram e jamais voltaram.
     A Santa é muito venerada entre as monjas beneditinas de Almenèches-Argentan, que a invocam para os casais estéreis que desejam um filho, e é a patrona das antigas igrejas paroquiais de Lessay.
     Em 1374, seu braço direito e uma costela foram colocados num relicário em uma pequena igreja dedicada a ela em Paris, próxima da ermida chamada Notre Dame des Bois. Conforme a cidade crescia, o mesmo se dava com a igreja. Seu relicário de Paris é levado em procissão junto com as relíquias dos Santos Honório e Genoveva.         

História da Abadia de Almenèches-Argentan

     Uma das mais antigas abadias femininas da França, com Poitiers e Jouarre, sua origem é bastante obscura; os mais antigos arquivos datam do século XII. Sempre modesta, a abadia atravessou séculos e enfrentou muitas vicissitudes, com duas interrupções: durante um século e meio, após as invasões vikings do século IX, e durante 30 anos após a Revolução Francesa.
     Segundo a tradição, no final do século VII, o monge Santo Evroul († 707) fundou 15 mosteiros na região, entre eles o de Almenèches, a 10 km sudoeste de Argentan, governado por Santa Lantilde no século VIII, e um outro, o Monasteriolum, a 17 km ao norte de Argentan. Neste foi abadessa Santa Oportuna notável por sua grande caridade fraterna e por sua devoção mariana.
     No fim do século IX, os dois mosteiros foram destruídos pelas invasões normandas. As relíquias de Santa Oportuna foram colocadas em segurança na região de Paris, sinal que ela já era objeto de uma grande veneração.
1060: Uma restauração difícil
     Rogério II de Montgomery, parente de Guilherme o Conquistador e “amigo dos monges”, reconstruiu Almenèches em 1060, e dotou a abadia de muitas ricas possessões na Normandia e na Inglaterra. Sua filha, Ema, aí se tornou abadessa em 1074. Uma parte das relíquias de Santa Oportuna retornaram então a Almenèches, que a acolhe como patrona. Envolvidos, apesar deles, nas lutas opositoras dos Montgomery, os mosteiros foram incendiados por duas vezes, em 1103 e 1118, e ficaram muito empobrecidos.
Do século XII ao século XV, a decadência
     O Registro de Visitas do arcebispo de Rouen, de 1250 a 1260, menciona 33 religiosas que cantavam o Ofício. A decadência vai se acentuando no decorrer do século XIV, em seguida a um novo incêndio, em 1318, e das circunstâncias difíceis da época: a Guerra dos 100 anos, peste e problemas na Normandia. Em 1455, o bispo de Séez constata que o capítulo fora transformado em estábulo e que as religiosas se alojam como podiam nas ruínas e arredores.
Nos séculos XV e XVI, uma renovação sob o signo de Fontevrault
     A ajuda da Abadia de Fontevrault tornou possível a necessária renovação da vida monástica. Um primeiro desenvolvimento foi dado por uma jovem abadessa vinda de Fontevrault, Maria de Alençon. Em 1517, 16 monjas de Fontevrault chegam a Almenèches para uma segunda reforma. O culto de Santa Oportuna começa então a se desenvolver, em seguida a um milagre.
     Com a Pseudo-reforma protestante a existência do mosteiro se tornou precária: em 1563, os huguenotes saquearam a abadia e o fervor se torna morno.
As grandes abadessas do período clássico
     Uma nova vitalidade foi dada pela jovem abadessa, Luisa Rouxel de Médavy (1593-1652), que se revelou uma grande abadessa: ela restaurou o claustro e adotou as Constituições de Poitiers, próximas da observância de Fontevrault. A vida no mosteiro se tornou profundamente religiosa, mas de uma austeridade relativa. Ela também fundou o priorado de Exmes em 1629, e participou do estabelecimento de muitos mosteiros, entre os quais o de Verneuil (1627). O impulso dado à comunidade se mantém sob as duas abadessas que a seguiram.
     Em 1736, a abadessa Helena Marta de Chambray se vê obrigada por Luis XV a fechar Almenèches e transferir o mosteiro para o antigo priorado Notre-Dame de la Place de Argentan, para facilitar o recrutamento.
     Às vésperas da Revolução Francesa, a comunidade contava com trinta monjas: todas se recusaram a prestar juramento a constituição civil do clero. Mas em 1792, elas foram dispersas. Duas delas foram aprisionadas.
A segunda restauração em 1822
     Em 1822, Carlota Bernart de Courmesnil conseguiu reagrupar as sobreviventes dos dois mosteiros, Argentan e Exmes, a princípio em Vimoutiers, depois, em 1830, em Argentan. Notre-Dame de la Place estando irrecuperável, a comunidade renascente se instalou nas modestas construções do Quarteirão São Joaquim. Pouco a pouco elas vão crescendo no século XIX, com a abertura de um pensionato, de um orfanato e de uma escola gratuita, e, em 1874, de uma escola de rendas destinada a retomar a tradição esquecida do “ponto de Argentan”. As múltiplas tarefas educativas, desejadas pelo contexto político, afastam um pouco as religiosas do ideal monástico.
As leis de 1901 e o retorno à vida contemplativa
     Com as leis anti-congregacionistas do início do século XX, a existência do mosteiro é ameaçada. Em 1904, se procede ao inventário de seus bens: graças ao prestígio da escola de rendas, foi obtido um sursis. O pensionato foi fechado em 1907. Em 30 de junho de 1914, aparece o decreto de fechamento do mosteiro, mas a guerra o suspende oficialmente: uma parte do mosteiro é transformada em ambulatório e as religiosas ficam no local.
     A supressão do pensionato leva as monjas a retornar para a grande tradição monástica. Em 1912, o Ofício monástico substitui o Ofício romano e o título abacial é restaurado pela Santa Sé. A nova igreja abacial é dedicada em 1933.
     Durante a 2ª Guerra Mundial, o mosteiro sofre o bombardeiro de 6 de junho de 1944. Três monjas sucumbem, as outras encontram asilo na “Antiga Misericórdia” de Séez durante 14 anos. Foi a Madre São Leão Chaplain, abadessa de 1940 a 1964, que assegurou a unidade da comunidade nessas circunstâncias difíceis e pode reconstruir o mosteiro. Em 26 de julho de 1958, retornam a Argentan, em uma construção nova, situada às margens do Orne. A dedicação da igreja teve lugar no dia 17 de setembro de 1962.
     A comunidade conta agora com 46 monjas, que desejam cultivar a herança dos séculos passados e continuar a servir a Deus Nosso Senhor.
     É impressionante que após 1.250 anos de seu falecimento, Santa Oportuna continue tão presente. Que ela inspire o seu ideal monástico em muitas jovens almas de nossos dias!


(*) Diocese que ainda hoje existe em França.
Fontes:
(Livro Vida dos Santos, Padre Rohrbacher, Volume VII, p. 178 à 181)

Postado neste blog em 22 de abril de 2011

terça-feira, 21 de abril de 2020

Santa Ema da Saxônia, Viúva - 19 de abril

     
     Duas são as santas com esse nome: Ema de Gurk (Áustria) e Ema da Saxônia (Alemanha). Muitos detalhes de suas vidas são semelhantes. Viveram no mesmo século (XI), ambas de nobre família, ambas se casaram e enviuvaram ainda jovens, repartiram seus bens com os pobres e levaram vida austera, dedicadas à oração e a obras de caridade.
     Ema de Gurk, fundadora de dois mosteiros, morreu a 27 de maio de 1045, enquanto Ema da Saxônia a precedeu cinco anos, uma vez que morreu a 19 de abril de 1040. No mosteiro de São Liutgero em Werden, no Ruhr, perto de Dusseldorf, inexplicavelmente longe da Saxônia, conserva-se uma relíquia da santa: uma mão prodigiosamente intacta.
     Um cronista alemão do mesmo século, Adão de Bremen, na sua História eclesiástica, nos dá informação sobre uma “nobilíssima Ema”, irmã de Meinverk, Bispo de Paderbom (morto em 1036 e também canonizado), e esposa do Conde Ludgero da Saxônia.
     O conde morreu muito precocemente. Ema, apesar de ser muito jovem, bela, inteligente e com muitos pretendentes, livremente decidiu consagrar sua viuvez inteiramente ao Senhor.  Sem filhos, se manteve constante em seu novo programa de vida, baseado na total dedicação às obras de caridade.
     Generosa nas doações e no socorrer os outros, mas austera e intransigente consigo mesma, procurou a perfeição no difícil estado de viuvez, uma condição bastante incômoda para uma mulher que ficou só, exposta a mil insídias porque sem apoio e tornada alvo dos cálculos interesseiros de parentes próximos e afastados.
     “Tu és jovem? – lê-se numa fervorosa prédica de São Bernardino de Sena dirigida às viúvas cristãs. Faze com que tua carne seja disciplinada. Quero que aprendas a viver como religiosa. Sê autêntica em tua alma. Queres marido? Toma-o em nome de Deus, livra-te dele. Mas nunca mais terás consolação... Assim seria melhor permaneceres viúva, servir a Deus do melhor modo que puderes, enquanto durar a tua vida”.
     Ema havia escolhido esta última maneira de servir a Deus, a mais difícil e rara. Sua mão, que chegou intacta até nós, nove séculos e meio após sua morte, é sinal certo da sua mais característica virtude: a generosidade.
      Sem filhos naturais, Santa Ema tornou-se mãe espiritual de uma multidão de pessoas. Verdadeira serva de Cristo, serviu o seu esposo celestial com a oração e a caridade, merecendo a devoção não de um marido, mas de milhões de cristãos que já há mais de nove séculos a honram com um culto público.
     Ema faleceu em 19 de abril de 1040; ganhou o Céu como prêmio de quem soube rejeitar as propostas do mundo para viver a castidade e o amor aos pobres. Seu corpo, sem aquela mão de que se falou, repousa na catedral de Bremen.

Etimologia: Ema = gentil, fraterna, nutriz, do alemão antigo.

Fontes:

Postado neste blog em 19 de abril de 2016

sábado, 18 de abril de 2020

Beata Mariana de Jesus (Navarro), Religiosa Mercedária - 17 de abril

     

     Ana Maria Guevara Navarro Romero, conhecida como Mariana de Jesus (Madrid, 1565-1624) foi uma freira espanhola da Ordem das Mercês e não deve ser confundida com Santa Mariana de Jesus, do século XVII, religiosa equatoriana chamada o Lírio de Quito, ou Ana de Jesus, religiosa de Valladolid do final do século XVI e cujo processo de beatificação está em curso em Roma.
     Mariana de Jesus nasceu em Madrid em 17 de janeiro de 1565, no seio de uma família rica associada aos círculos judiciais. Seu pai era um negociante de peles ao serviço do Rei Filipe III.
     Mariana cedo se sentiu atraída para a vida religiosa. Para fazê-la aceitar o matrimônio, o pai a colocou na cozinha sob o controle de uma serva de caráter difícil; depois da morte da mãe, a esta humilhação veio ajuntar-se os maus tratos por parte da mulher que seu pai desposara. Mariana, entretanto, manteve-se inabalável no seu propósito.
     Obrigada a viver na casa paterna, passou nela uma vida de retiro e de rigorosas austeridades. Deus a encheu de favores extraordinários. Naquele período, Mariana era dirigida no caminho da perfeição pelo padre mercedário João Batista Gonzales, tendo ele feito isto até sua morte em 1598.
     Em 1598, ela retirou-se como penitente na ermida de Santa Bárbara da capital do reino, ajudada pelo religioso mercedário e outras pessoas piedosas. Em 1606 entrou para a Ordem das Mercês, ali recebendo em 1613, o hábito de terceira.
     Mariana visitava muitas vezes a rainha da Espanha, edificando a corte inteira com a sua humildade e sua devoção a Santíssima Virgem e ao Santíssimo Sacramento. Um dia em que contemplava a Paixão do Senhor, recebeu uma coroa de espinhos de Cristo, O qual muitas vezes lhe falava a partir do tabernáculo.
     A fama das suas virtudes e as aparições sobrenaturais e milagres que a acompanhavam espalhou-se rapidamente pela cidade de Madrid. Os seus superiores ordenaram que ela escrevesse sobre essas experiências. Nestes escritos, Mariana conta, entre outras coisas, as visões que teve de Jesus Cristo e da Virgem Maria e os êxtases místicos.
     A Beata aplicava todas as suas orações e mortificações a três classes de desafortunados: os pecadores, as almas do Purgatório e os cristãos cativos na África.
     Aos 59 anos foi assaltada por uma grave forma de pleurite que a fazia exercitar a paciência e a submissão à vontade de Deus, e a levou ao túmulo no dia 17 de abril de 1624, no Convento de Santa Bárbara. O Cardeal Di Trejo, Arcebispo de Málaga, que por 14 anos conheceu a Beata Mariana de Jesus, escreveu dela uma longa e pormenorizada vida, detalhando suas virtudes.
     Se já em vida Mariana tinha alcançado um grande prestígio pela sua piedade e milagres de toda espécie, que lhe eram atribuídos, após a sua morte, este prestígio aumentou ainda mais.
     O seu corpo foi exposto publicamente durante dois dias durante os quais houve grande afluência. O artista Vicente Carducho fez várias máscaras mortuárias da defunta. No mesmo ano de sua morte iniciou-se o processo canônico de beatificação, incentivado pelas pessoas simples, a nobreza e o próprio rei Felipe IV.
     Em 31 de agosto de 1627 o seu túmulo foi aberto, e perante o espanto geral, o corpo estava intacto, com a carne fresca e os membros flexíveis, e exalando um perfume agradável. Apenas o rosto estava um pouco desfigurado por causa das manipulações que tinham sido feitas para obter a máscara mortuária. Este facto inexplicável foi verificado todas as vezes que os restos mortais de Mariana foram inspecionados: em 1627, 1731, 1765, 1924 e 1965, permanecendo sempre incorrupto e perfumado.
      Em 25 de maio de 1784 foi declarada beata pelo papa Pio VI. Tal era o fervor que a figura de Mariana despertava entre o povo, que o governo civil da cidade de Madrid a declarou co-padroeira da cidade, com Santo Isidro.
     O corpo incorrupto da Beata é venerado na igreja do Convento de Dom João de Alarcón de Madrid, já que o antigo convento de Santa Barbara, onde ela fora monja, foi destruído. O túmulo onde repousa foi doado pela II rainha Isabel II.
     Sua festa litúrgica é celebrada em 17 de abril.



Postado neste blog em 16 de abril de 2012

quarta-feira, 15 de abril de 2020

A Heroína do Titanic – 15 de abril de 1912

Em 14 de abril de 1912, às 23h40, o Titanic, o transatlântico que supostamente "o próprio Deus não podia afundar", atingiu um iceberg no Atlântico Norte. Em menos de três horas, o navio de 46.328 toneladas afundou sob as ondas para se fixar no fundo do oceano.

A Condessa de Rothes
     Noëlle, Condessa de Rothes, era uma passageira que ia para os Estados Unidos para se juntar ao seu marido, o 19º Conde de Rothes, que estava comprando um laranjal na Califórnia.
     Selecionada junto com outras senhoras para entrar no bote salva-vidas nº 8, as qualidades de liderança da Condessa rapidamente se mostraram, de modo que uma vez na água, o marinheiro Thomas William Jones pediu-lhe para assumir o leme e dirigir o pequeno barco naquela noite escura e congelada.
     A Esfera citou o marinheiro Jones dizendo: "Quando eu vi o jeito que ela estava se comportando e ouvi a maneira calma e determinada como ela falou com os outros, eu sabia que ela era mais um homem do que qualquer outro que tínhamos a bordo".
     Lady Rothes dirigiu por cerca de uma hora, depois entregou o posto à prima de seu marido, Srta. Gladys Cherry, e assumiu um lugar de remo ao lado de Dona Maria Josefa Perez de Soto y Vallejo Peñasco y Castellana, para confortar a mulher de 22 anos que tinha acabado de se tornar viúva, pois seu marido, Don Víctor, se afogou no naufrágio.
     Ela remou até a manhã seguinte, quando foram resgatados pela RMS Carpathia. Durante toda a noite terrível ela acalmou e encorajou os outros passageiros. Então, a bordo do Carpathia, ela continuou a sacrificar-se, não descansando, mas ajudando e consolando os outros sobreviventes. Um relato no London Daily Sketch afirmou: "Sua Senhoria ajudou a fazer roupas para os bebês e ficou conhecida entre a tripulação como a 'pequena condessa corajosa'".
     Surpreendida na tragédia do Titanic, a Condessa fez o que todos os nobres são chamados a fazer: liderar e sacrificar-se pelo bem comum.
     Ao chegar em Nova York, ela deu a entrevista abaixo para o New York Herald, que foi publicada em 21 de abril de 1912:
     "A lamentável tristeza de nossa travessia, remando em direção às luzes de um navio que desapareceu. Nós no barco nº 8 vimos os faróis de mastro de um, e então vimos o brilho vermelho enquanto ele balançava em nossa direção por alguns minutos. Então escuridão e desespero". Lady Rothes ontem, no Ritz Carlton, contou sobre sua experiência a bordo do Titanic.
     "Fui para a cama às sete e meia", disse ela, "e minha prima, Srta. Gladys Cherry, que dividia o quarto comigo — nº 77 no deck B — também se recolheu. Estava muito frio. Fui acordada por um pequeno frasco e depois um barulho de grade. Acendi a luz e vi que eram 11:46, e me surpreendi com o silêncio repentino. Gladys não havia acordado e eu a chamei e perguntei se ela não achava estranho que os motores tivessem parado.
     Quando abri a porta da cabine, vi um comissário. Ele disse que tínhamos atingido um iceberg. Nossos casacos de pele sobre nossas camisolas eram toda a roupa que tínhamos. Meu primo perguntou ao comissário-chefe se havia algum perigo e ele respondeu: "Oh não, nós apenas arranhamos um pouco de gelo e isso não equivale a nada".
A chamada para os coletes salva-vidas
     "Enquanto saiamos apressadamente, Lambert Williams veio e explicou que os compartimentos à prova d'água certamente suportariam. Então um oficial passou correndo. "Todos vocês obterão seus coletes salva-vidas! Vistam-se com roupas quentes e venham até o deck A! Bastante atordoados com a ordem, todos nós fomos. Quando eu estava indo para o nosso camarote minha empregada disse que a água estava entrando. Dei a ela um pouco de conhaque, amarrei o colete salva-vidas nela e disse-lhe para ir direto para o convés. Tivemos que perguntar a um comissário onde nossos coletes salva-vidas poderiam ser encontrados. O homem disse que tinha certeza de que eram desnecessários até que lhe dissemos que tínhamos sido ordenados a usá-los. "Nós nos vestimos o mais aquecido que pudemos e fomos até o deck A.
     O Sr. Brown, o comissário, tirou seu chapéu quando passamos, dizendo: - "Está tudo bem, mas não se apressem! Que noite adorável foi essa! Eu estava perto da Sra. Astor. Ela estava esperando sob o estibordo da biblioteca e seu marido conseguiu uma cadeira para ela. Ela estava bem calma. A última vez que vi o Coronel Astor foi quando ele estava ao lado de sua esposa tentando consolá-la. "O Capitão Smith ficou ombro a ombro comigo quando entrei no bote salva-vidas, e as últimas palavras foram para o hábil marinheiro - Tom Jones - 'Reme direto para aquelas luzes de navio ali; deixe seus passageiros a bordo dele e volte assim que puder’. Toda atitude do Capitão Smith foi de grande calma e coragem, e tenho certeza que ele pensou que o navio, cujas luzes podíamos ver claramente, iria nos pegar e que nossos barcos salva-vidas seriam capazes de fazer o duplo dever de transportar passageiros para a ajuda que brilhava tão perto.
     "Havia dois comissários conosco no barco nº 8 e trinta e uma mulheres. O nome do comissário era Crawford. Fomos abaixados silenciosamente na água, e quando nos afastamos do lado do Titanic perguntei ao marinheiro se ele se importaria que eu pegasse o leme, pois eu sabia algo sobre barcos. Ele disse: "Certamente, senhora!". Subi na popa e pedi ao meu primo para me ajudar. A primeira impressão que tive quando deixamos o navio foi que acima de tudo não deveríamos perder nosso autocontrole. Não tínhamos nenhum oficial para assumir o comando do nosso barco, e o pequeno marinheiro tinha que assumir toda a responsabilidade. Ele fez isso nobremente, alternadamente nos aplaudindo com palavras de encorajamento, em seguida, remando obstinadamente. Então a Sra. de Soto de Peñasco começou a gritar pelo marido. Foi horrível demais. Deixei o leme para minha prima e fui para o lado dela para ser de todo conforto que pude. Pobre mulher! Seus soluços rasgavam nossos corações e seus gemidos eram indescritíveis em sua tristeza. Cherry ficou no leme do nosso barco até que a Carpathia nos pegou.
     "A parte mais terrível de toda a coisa foi ver as fileiras de orifícios desaparecendo um por um. Vários de nós – e Tom Jones – queríamos remar para trás e ver se não havia alguma chance de resgatar alguém que possivelmente tivesse sobrevivido, mas a maioria no barco decidiu que não tínhamos o direito de arriscar suas vidas com a chance de encontrar alguém vivo após o mergulho final. Eles também disseram que as ordens do próprio capitão tinham sido para "remar em direção daquelas luzes de navio", e que nós que queríamos tentar encontrar outros que poderiam estar se afogando não tínhamos que interferir em suas ordens. Claro que isto resolveu o assunto, e nós remamos. "Na verdade, eu vi - todos nós vimos - luzes de um navio não mais do que a três milhas de distância!" Voltando-se para Lord Rothes, Lady Rothes disse: - "Eu sou boa em julgar distâncias, não sou?" Ele respondeu: "Sim, você é".
As luzes desaparecem
     Continuando, Lady Rothes disse: - "Durante três horas, seguimos constantemente em direção às duas luzes de mastro que se mostravam brilhantemente na escuridão. Por alguns minutos vimos a luz do navio, então ela desapareceu, e as luzes do mastro ficaram mais fracas no horizonte até que elas também desapareceram. "A Sra. Smith fez o serviço de yeoman. Ela remou por cinco horas com Tom Jones sem descansar. Na verdade, ela era magnífica, não só em sua atitude, mas em toda a maneira elevada com que trabalhava. "A Sra. Pearson também remou, e minha empregada, Roberta Maioni, remou na última metade da noite. Eu não conhecia o Sr. Ismay, até que uma noite no jantar no restaurante ele chegou tarde, e alguém o apontou para mim como sendo o diretor da linha.
          Não houve nenhum tipo de excitação, exceto uma vez em que os passageiros da terceira classe se tornaram desagradáveis, mas foram imediatamente descartados. "Quando o fim terrível chegou, eu tentei o meu melhor para evitar que a mulher espanhola ouvisse o som agonizante de angústia. Ele parecia continuar para sempre, embora não teria levado mais de dez minutos até que o silêncio de um mar solitário caiu. A solidão indescritível, o horror dos nossos sentimentos nunca poderão ser contados. Tentamos manter contato com os outros barcos gritando e conseguimos muito bem. Nosso barco estava mais longe porque perseguimos as luzes fantasmas por três horas. Sim, eu remei por três horas”.
     Roberta Maioni, a empregada, disse: - "Eu não estava de todo assustada. Todo mundo estava dizendo quando saímos do navio que 'ele estava bem por doze horas ainda' e eu estava muito entorpecida para perceber o terror de tudo aquilo até que ficamos seguros a bordo do Carpathia". "Homens corajosos, tudo o que ficou para trás para que as mulheres tivessem pelo menos uma chance de viver!", disse Lady Rothes. "Suas memórias devem ser consideradas sagradas na mente do mundo para sempre".


Contos sobre honra, cavalheirismo e o Mundo da Nobreza — nº 531

     Lucy Noël Martha Leslie, Condessa de Rothes (nascida Dyer-Edwardes; 25 de dezembro de 1878 – 12 de setembro de 1956) foi a esposa de Norman Leslie, 19º. Conde de Rothes. Notável filantropa e líder social, ela foi uma das heroínas durante o naufrágio do Titanic, famosa por tomar o leme de seu bote e posteriormente ajudar nos remos até serem resgatados pelo navio Carpathia. A condessa foi por muitos anos uma figura popular na sociedade londrina, conhecida por sua beleza, personalidade brilhante, dança graciosa e diligência com a qual ela ajudou a organizar generosos eventos patrocinados pela realeza inglesa e membros da nobreza. Esteve durante muito tempo envolvida em trabalhos de caridade por todo o Reino Unido, mais notavelmente ajudando a Cruz Vermelha com angariação de fundos e como enfermeira no Coulter Hospital em Londres durante a 1ª Guerra Mundial. Lady Rothes foi também uma das benfeitoras líder da Queen Victoria School e no The Chelsea Hospital for Women, conhecido hoje como Queen Charlotte and Chelsea Hospital.