quarta-feira, 5 de março de 2025

Beata Maria Luísa (Madre Saint-Louis), Esposa, Mãe, Viúva, Fundadora - 4 de março

      Maria Luísa Elisabeth de Lamoignon nasceu em Paris, França, no dia 3 de outubro de 1763. Seu pai era então Guarda dos Selos da França sob Luís XVI. Ela tinha três irmãs e quatro irmãos. Crescendo em uma família aristocrática, ela recebeu uma boa educação.
     O Padre Plácido Levé, jesuíta, que foi seu primeiro biografo, escrevia em 1857: “Muito jovem, aos prazeres brilhantes que atraiam suas irmãs, ela preferia uma vida retirada e estudiosa. A oração era o principal atrativo e o mais caro alimento de sua alma. O estudo era sua maior ocupação. Seu espírito vivo e penetrante se abria sem dificuldade a todo o conhecimento. Ela cultivava as artes com o mesmo sucesso e o mesmo gosto. Aluna de Rameau, este a admirava e ia à sua casa, dizia ele, não para aperfeiçoá-la na arte do cravo, mas para ouvi-la tocar e se exercitar com ela”.
     O Cardeal Amato se recorda da vocação especial desta nova Beata: “A Beata Madre Saint-Louis fez frutificar os seus dotes naturais e da graça, falando a língua da caridade evangélica, que convida concretamente a dar de comer aos famintos, de beber aos sedentos, a servir e a ajudar os pobres, instruir os ignorantes, educar os pequenos nas vias da virtude”. 
     Terna e sensível, mas ao mesmo tempo uma natureza “forte, generosa, capaz dos mais duros e dos maiores empreendimentos”, era dotada de um julgamento sólido e pleno de “sabedoria e bondade”. 
     Segundo o costume da época, casou-se muito jovem com o Conde Molé de Champlâtreux, Francisco Eduardo Molé de Champlâtreux. "Meus pais me uniram ao homem o mais virtuoso como também o melhor”, escreveu ela. Assumindo as obrigações de sua posição – a fortuna dos esposos Molé era imensa – ela fez, de acordo com seu marido, a escolha de uma simplicidade de vida e do serviço dos pobres.
     O casal teve cinco filhos, três deles falecidos em tenra idade. Ela teve que suportar uma das maiores dores: o esposo foi guilhotinado injustamente durante o Terror, o período mais terrível da Revolução Francesa. O casal fora aprisionado, mas ela foi liberada devido ao seu estado de saúde. O esposo foi guilhotinado no dia de Páscoa de 1794. No mesmo ano ela enfrentou a morte de sua filha de quatro anos. Além disso, seus bens foram confiscados pela Revolução. Ela enfrentou a miséria, a fome e as provações da alma.
     Após o choque brutal causado pela morte de Francisco Eduardo, a chaga de seu coração cicatrizou docemente, sem que Luísa Elisabeth, que se tornaria mais tarde Mère Saint-Louis, se esquecesse de seu esposo diante de Deus. “Todos os dias eu renovo a Deus o sacrifício inicial”, assegurava a seu filho, lhe indicando o retrato de seu pai. No testamento que escreveu em 1810, ela diz: “Ao me separar de vocês, meus queridos filhos, para me revestir de um retiro profundo, eu fiz a Deus o maior sacrifício”.
     Ficando sozinha, seu coração foi consolado pelo Senhor, que havia sacrificado o Seu Filho dileto, e perdoou os assassinos do marido. Foi assim que se aproximou ainda mais da Cruz, de quem se sentia filha, e, a exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo, a amar “os seus que estavam no mundo, até o fim”. Isto ela pedia às suas Irmãs das Filhas da Caridade, congregação por ela fundada: formar-se segundo o modelo de Maria aos pés da Cruz.
     Em abril de 1803, Mme. Molé tendo chegado a Vannes, Mons. de Pancemont, Bispo de Vannes, condoído com a situação das meninas, convidou-a a dirigir uma obra de caridade e de educação, que ele chamara Casa do Pai Eterno.
     No dia 21 de novembro de 1803, Festa da Apresentação de Maria no Templo, Mme. Molé foi oficialmente nomeada superiora da Casa em presença de Mons. de Pancemont. A partir de então ela passou a ser conhecida como Madre São Luís (Mère Saint-Louis). As religiosas tomam a denominação de Irmãs da Caridade de São Luís.
Madre São Luis jovem
     Ela escolheu São Luís IX como protetor de sua fundação por ser ele o patrono da França. À sua Congregação, que deve trabalhar junto aos mais humildes, ela dá por guia o santo que oferece os mais belos exemplos de uma vida comprometida com o temporal: “Um místico que mantinha os pés na terra, brilhava das mais belas virtudes humanas: lealdade, coragem, senso de honra, equidade, franqueza e delicadeza. Um místico cuja fé intrépida se refletia nos atos os mais simples e no dever de cada dia”.
     Ela mandou instalar oficinas de tecelagem mecânicas para fiação de algodão, o trabalho da lã e a fabricação de rendas, porque tem gosto pelo progresso e sonhos de tornar essas oficinas modelos de sua espécie. É um sucesso! As pessoas se apressam para admirar o trabalho e especialmente para ver a transformação social das meninas. "As crianças mudam visivelmente". Falam do Pai Eterno por toda a região, e outras cidades também querem ter uma Casa de educação social segundo aquele modelo. 
     Em 1º de março de 1816, os estabelecimentos de educação gratuita e de caridade, legalmente fundados em Vannes e em Auray por Madre São Luís, são aprovados.
     Madre São Luís convidava suas Irmãs a "considerar Maria como o modelo no qual nos devemos formar", não A separando jamais de seu Filho, nem de sua missão. Sua piedade marial ia o mais das vezes a Nossa Senhora das Dores que, "malgrado a ternura de seu coração, consentiu no sacrifício e na morte de seu Filho”, Nossa Senhora da Compaixão, próxima de todos os calvários do mundo, “cheia de zelo pelos interesses de Deus e pela salvação dos homens”.
     Madre São Luís não para: em 1816 abre uma casa de caridade em Pléchâtel, e em 1818 uma casa de retiro espiritual em Auray, depois, em 1820, um noviciado em Saint Gildas de Rhuys. Como Santa Teresa d’Ávila ela funda sobre os alicerces da caridade e da confiança. Tudo é por Deus.
     No dia 3 de novembro de 1824, a fundadora adquiriu a Abadia de Rhuys, onde as Irmãs se instalaram em maio de 1825.
     Estreitando ao peito o crucifixo do qual não se separava jamais, Madre São Luís morreu em Vannes, no dia 4 de março de 1825, rodeada das filhas de sua alma. Ela morreu suavemente, como uma criança que adormece no regaço de sua mãe; apagou-se a lâmpada luminosa de caridade e bondade, capaz de indicar a todos o caminho a seguir, como só os Santos o sabem.
     A notícia correu por toda a cidade de Vannes. A multidão se comprimiu na capela do Padre Eterno para ver a santa, e foi na capela do Seminário Maior que teve lugar as exéquias. Ainda hoje ela repousa na capela do jardim do Padre Eterno de Vannes.
     Madre São Luís foi beatificada em Vannes pelo delegado do Papa Bento XVI, no dia 27 de maio de 2012.
     Quase dois séculos após o seu falecimento, a Congregação das Irmãs da Caridade de São Luís conta com 145 casas: França, Inglaterra, Canadá, Estados Unidos, Haiti, Madagascar etc.
     Embora tenha sido beatificada como religiosa fundadora, Madre São Luís se santificou em vários estados de vida: jovem de inteligência brilhante, esposa de coração generoso, mãe extremosa, religiosa exemplar, fundadora. 
 
“Tout est grand quand c'est l'amour qui le fait”. - Mère Saint-Louis

domingo, 2 de março de 2025

Nossa Senhora das Aparições - Dia da Festa 2 de março

     

     O Abade Orsini escreveu: "Nossa Senhora das Aparições, em Madri, assim chamada porque, no ano de 1449, a Santíssima Virgem apareceu durante oito dias seguintes a uma jovem chamada Yves, e ordenou-lhe que construísse uma igreja em sua honra, no local onde ela deveria encontrar uma cruz plantada para Nossa Senhora". 
     Cubas de la Sagra é um município da Espanha na província e comunidade autónoma de Madrid. As aparições aprovadas de Nossa Senhora em 1449 que ocorreram lá são agora quase inexplicavelmente desconhecidas, mal mencionadas de passagem, ou tratadas como uma lenda em alguns livros, se é que são reconhecidas como um ponto em algum mapa antigo. É verdade que as hostes de Napoleão saquearam e destruíram o santuário e o mosteiro ali construídos, e que a guerra de 1936 não deixou pedra sobre pedra, mas a memória do que aconteceu lá em 1449 não deve ser esquecida, pelo menos pelos católicos. 
     No ano de 1449, Cubas era apenas uma vila com uma igreja simples dedicada a Santo André. A população de Cubas, no entanto, vivia bastante esquecida de seus deveres para com Deus, e seus pecados eram tantos que parecia até mesmo para eles que a mão de Deus deveria estar pairando sobre a terra, pronta para puni-los. 
     As Crônicas falam então de uma jovem de 12 anos chamada Inês (às vezes Yves ou Agnes) que era apenas de origem humilde. Ainda assim, havia algo nela que a tornava diferente das outras garotas de sua idade. Ela jejuava, confessava regularmente e rezava diariamente os 15 mistérios do Rosário. Talvez sua profunda fé e religiosidade possam explicar o que aconteceu a seguir. 
     Na segunda-feira, 3 de março de 1449, Inês estava cuidando de porcos nos arredores da cidade em um lugar chamado Cecília, quando ao meio-dia apareceu uma mulher, uma senhora brilhante e bonita vestida com um tecido de ouro. Ela estava cercada de luz e perguntou a Inês o que ela estava fazendo lá. Inês afirmou que estava cuidando dos porcos. A Senhora então disse que as pessoas não estavam mais mantendo os jejuns e disse a Inês a necessidade de jejuar. A senhora disse que o povo de Cubas deve mudar seus caminhos, confessar e cessar sua devassidão e ofensas contra Deus, ou Ele logo os punirá. Haveria uma grande pestilência que viria sobre eles, da qual muitos morreriam. 
Igreja de Sto. André em Cubas
     Talvez conhecendo a dureza de coração do povo, Inês perguntou se ela também, ou sua mãe e seu pai, morreriam dessa pestilência. Foi-lhe dito apenas que seria como Deus desejava. A senhora então desapareceu. 
     A princípio, Inês não contou a ninguém sobre o incidente, pois achava que ninguém acreditaria no que havia acontecido. 
     Na terça-feira, 4 de março, Inês estava novamente cuidando dos porcos, desta vez perto do riacho de Torrejon. Mais ou menos na mesma hora do dia, ao meio-dia, assim como no dia anterior, a Senhora reapareceu. Ela perguntou a Inês se ela havia dito às pessoas o que lhe dissera para dizer, mas Inês respondeu que não ousava fazê-lo, pois suspeitava que não acreditariam nela. A Senhora então ordenou a Inês que avisasse o povo e que, se eles não acreditassem, ela lhes daria um sinal. Inês perguntou à Senhora quem ela era, mas ela disse que não contaria ainda, antes de desaparecer novamente. 
     Por fim, Inês decidiu contar ao pai, Alfonso Martinez, que não deu importância aos acontecimentos contados pela filha, mas achava que era uma história infantil, uma história inventada na imaginação de uma jovem. Ele disse a Inês para ficar quieta quando ela tentasse contar a alguém sobre o aviso. 
     Na sexta-feira, 7 de março, Inês estava mantendo os porcos em Novo Prado, quando a Senhora reapareceu novamente como antes. Ela perguntou a Inês se ela havia dito o que lhe fora ordenado a dizer. Inês respondeu que havia contado à mãe e ao pai e a muitos outros. A Senhora disse a Inês para publicar o que ela havia dito a todas as pessoas sem medo ou apreensão. 
     Quando Inês foi para casa no final do dia, ela contou aos pais o que havia acontecido. Seu pai disse que ela estava mentindo e para "calar a boca", mas sua mãe encorajou Inês, dizendo: "Bem, ainda assim, diga". 
     No domingo, 9 de março, a notícia se espalhou. Um padre, Juan Gonzalez, com alguns outros homens, foi à casa de Inês e conversou com seus pais. Depois, o padre foi rezar a missa. Inês saiu com os porcos, acompanhada por seu irmão João, para um lugar chamado A Ciroleda. O pai de Inês os deixou e foi à missa. A Ciroleda era um prado aquoso que os porcos gostavam. Inês deixou seu irmão depois de um tempo procurando por um dos porcos que haviam escapado, e logo perdeu de vista seu irmão. Sozinha, ela se ajoelhou na terra fofa, pedindo à senhora que voltasse, embora estivesse com medo. 
     A Senhora apareceu novamente como antes, dizendo a Inês para se levantar. "Senhora, quem sois?", Inês perguntou. "Eu sou a Virgem Maria", respondeu a senhora, e aproximando-se de Inês, pegou sua mão direita e apertou os dedos e o polegar, fazendo algum tipo de sinal. Ela então disse a Inês para ir à igreja e mostrar o sinal às pessoas quando saíssem da missa. Inês disse ao irmão para cuidar dos porcos e foi à igreja, chegando quando a missa estava terminando. Ela estava chorando e foi se ajoelhar diante do altar de Maria. Lá, ela contou a todos o que havia acontecido. 
     Não consigo decifrar o que era o sinal na mão de Inês, mas o que quer que fosse, as pessoas examinaram sua mão e muitos acreditaram. No dia seguinte, o padre conduziu os notáveis da cidade e os fiéis em procissão até o local das últimas aparições, carregando uma cruz de madeira. Quando chegaram, Inês caminhou sozinha com a cruz. A própria Virgem Maria tomou a cruz, dizendo a Inês para construir uma igreja em sua homenagem. 
Mosteiro de Sta. Maria da Cruz
     A cruz foi colocada permanentemente onde a Virgem, Nossa Senhora das Aparições, foi vista pela última vez, e muitos milagres ocorreram lá, incluindo 11 pessoas que foram trazidas de volta à vida. 
     Uma igreja foi iniciada logo após a aprovação das aparições da Virgem. Permaneceu por quase cinco séculos, quando foi destruído no incêndio de 1936, causado durante a Guerra Civil. Muitas das freiras foram martirizadas. Em 1949, a reconstrução foi concluída em parte pelas Regiones Devastadas, que colocaram a cruz atual no mesmo lugar onde a primeira estava. 
     Segundo a tradição, Inês terminou sua vida no mosteiro de Santa Maria de la Cruz depois de ter filhos e ficar viúva. Diz-se que quem vai visitar o local, com fé, recebe graças especiais, e que milagres ainda acontecem lá. 

Fonte:
Nossa Senhora das Aparições – A África do Sul precisa de Nossa Senhora

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Santa Ana Line, Viúva, mártir inglesa – 27 de fevereiro

 

Padroeira dos casais sem filhos, convertidos e viúvas
 
     Desde a instauração do anglicanismo pelo rei Henrique VIII, em 1531, os países da Comunidade Britânica viviam dias difíceis. Os católicos eram perseguidos, os sacerdotes ou eram expatriados ou condenados à morte. Muitos retornavam clandestinamente à Inglaterra para dar assistência religiosa aos leigos e corriam o risco de serem presos e condenados. Vários mosteiros e igrejas foram queimados. Foram anos de intensa perseguição e muitos foram os mártires da Fé católica, leigos e eclesiásticos. Tal situação perdurou ainda pelo século XVII.
     Ana viveu nesta época. Ela nasceu no ano de 1567 em Dunmow, no Condado de Essex, segunda filha de William Heigham e de Ana Alien. Ana havia se convertido ao catolicismo junto com seu irmão Guilherme. Depois de tentar sem sucesso fazê-la apostatar, o pai, um abastado e rigoroso calvinista, deserdou-a e ao irmão, e expulsou-os de casa.
     Pouco tempo depois, provavelmente em 1586, Ana desposou Roger Line, ele também um jovem católico convertido, deserdado pelo mesmo motivo. Mas Ana logo ficou sozinha e sem recursos, porque seu esposo e seu irmão foram presos quando assistiam à Missa, naquele tempo uma grave transgressão. Depois de pagarem uma multa, foram banidos do país. Roger foi para Flandres onde recebia uma pequena pensão do Rei da Espanha, Felipe II, parte da qual enviava para a esposa em Londres. Ana pode contar com aquele auxílio até 1594, ano da morte de Roger Line.
     Ana ficou viúva num momento em que sua saúde estava bastante afetada. Mais do que nunca teve que confiar na Divina Providência para o seu sustento.
Sta. Ana Line jovem
     Quando em 1595 o jesuíta Pe. João Gerard instituiu em Londres uma casa de refúgio para os sacerdotes que retornavam secretamente à cidade, ou que já exercitavam o ministério, Ana foi chamada para governá-la e administrá-la, encargo que ela desenvolveu dia a dia com o afeto de uma mãe e a devoção de uma criada. O sacerdote, cuja autobiografia descreve sua prisão, tortura e fuga posterior da Torre de Londres, que naquela época era uma prisão, confiou em Ana porque ela era "uma mulher de grande prudência e bom senso" e precisava se refugiar na casa, tanto quanto os sacerdotes que iam para lá.
     Em 1597, como esta casa se tornara insegura após a fuga do Pe. Gerard da prisão da Torre, um novo local foi escolhido e Ana nele continuou a desempenhar suas funções. 
     No dia 2 de fevereiro de 1601, Festa da Purificação, o altar e os paramentos para a Missa estavam prontos e o jesuíta Pe. Francis Page foi investido para iniciar a procissão e a bênção das velas, e para rezar a Missa das Candeias na casa administrada por Ana Line, quando guardas vieram prendê-lo. Um vizinho o havia delatado. O padre conseguiu esconder-se num local especialmente preparado por Ana para isto, tirou as vestes para não ser preso e evitar a morte, e depois fugiu. Mas, as autoridades viram o altar e prenderam Ana Line por suspeita de ajudar algum presbítero, já que era sua residência. Ana e dois leigos foram capturados e levados para a prisão de Newgate.
     No dia 26 de fevereiro de 1601 ela foi levada ao tribunal de Old Bailey. Ana estava tão fraca, que foi necessário conduzi-la sobre uma cadeira, tão grave eram suas condições de saúde. O juiz Popham a processava sob a alegação de ter dado refúgio e assistência aos padres missionários. As autoridades não tinham provas de que ela tivesse ajudado algum sacerdote, já que nenhum padre foi preso durante a invasão de domicílio.
     Ela disse à corte que longe de arrepender-se de haver ocultado um padre, ela somente se entristecia por “não poder receber mil”. Foi acusada segundo a ata 27 da Rainha Isabel, quer dizer, por dar albergue a um sacerdote, ainda quando isto não pudesse provar-se, e condenada pelo juiz John Popham a pena capital: seria enforcada no dia seguinte em Tyburn.
     No dia seguinte foi levada à forca e valentemente proclamando sua fé alcançou o martírio pelo que havia rogado. No mesmo dia foram executados dois sacerdotes, o Beato Mark Barkworth, O.S.B. e o Beato Roger Filcock, S.J. O Pe.  Roger Filcock havia sido por muito tempo amigo e frequente confessor da Sra. Line. Sendo mulher, foi poupada do esquartejamento que eles sofreram.
     No cadafalso, antes de colocar a cabeça no laço, declarou em voz alta dirigindo-se à multidão que assistia as execuções: “Fui condenada à morte por ter concedido refúgio a um padre católico; contudo estou tão longe de arrepender-me, que desejaria de todo coração ter hospedado mil em vez de um só”.
     O Pe. Filcock, ainda pendurado na forca proclamou: "Ó bendita Senhora Line, que agora recebeu sua recompensa, vai à nossa frente, mas nós te seguiremos rapidamente nas bem-aventuranças se for do agrado do Todo-Poderoso".
     Antes de morrer, o Pe. Filcock rezou com o Pe. Mark Barkworth, que depois foi enforcado e esquartejado. Por sua parte, Pe. Francis Page, que fugiu no dia da festa da Apresentação do Senhor, foi executado pelo crime de "ser sacerdote" em 20 de abril de 1602.
     Ana Line foi beatificada pelo Papa Pio XI em 15 de dezembro de 1929, e canonizada pelo Papa Paulo VI em 25 de outubro de 1970, junto com os 40 Mártires da Inglaterra e Gales.
     O Pe. Mark Barkworth e o Pe. Francis Page foram beatificados entre um grande grupo de mártires em 1929 pelo Papa Pio XI, já o Pe. Roger Filcock foi beatificado entre os 85 mártires de Inglaterra e País de Gales pelo Papa João Paulo II em 1987.
     A Santa é comemorada no dia 27 de fevereiro. Sua festa com os outros 39 Mártires é em 25 de outubro. Algumas dioceses católicas da Inglaterra, tal como a Diocese de Leeds, comemoram-na com as Santas mártires Margarida Clitherow e Margarida Ward no dia 30 de agosto.
     Graças a mulheres de seu calibre a fé foi preservada na Inglaterra e os riscos que ela enfrentou foram pequenos e grandes. Hoje, há duas igrejas em Essex sob a invocação de Santa Ana Line - modernas e muito feias -, mas com verdadeira devoção à Santa. Percebe-se que existe um verdadeiro culto local que reflete a gratidão pelo dom da fé católica que foi passado para os contemporâneos.
     Santa Ana Line é patrona dos casais sem filhos, dos convertidos, das viúvas.

Fontes:
MORRIS, Life of Fr. John Gerard; CHALLONER, Memoirs, I, 396; FOLEY, Records S.J. I, 405; VII, 254; Douay Diaries, p. 219, 280; Hist. MSS. Com. Rep. Rutland Coll. Belvoir Castle, I, 370; GILLOW, Bibl. Dict. Eng. Cath.
STANLEY J. QUINN (Catholic Encyclopedia)

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Santa Valburga, Princesa, Abadessa – 25 de fevereiro

     

     Nasceu em Devonshire, por volta de 710; morreu em Heidenheim, 25 de fevereiro de 777. Ela é a padroeira de Eichstadt, Oudenarde, Furnes, Antuérpia, Gronigen, Weilburg e Zutphen, e é invocada como padroeira especial contra a hidrofobia, em tempestades e também por marinheiros. 
     Valburga era filha de São Ricardo, um dos sub-reis dos saxões ocidentais, e de Winna, irmã de São Bonifácio, apóstolo da Alemanha, e tinha dois irmãos, São Willibaldo e São Winibaldo.
     São Ricardo, ao iniciar com seus dois filhos uma peregrinação à Terra Santa, confiou Valburga, então com onze anos, à abadessa de Wimborne. Na escola claustral e como membro da comunidade, ela passou vinte e seis anos se preparando para o grande trabalho que realizaria na Alemanha. O mosteiro era famoso pela santidade e disciplina austera. Havia um alto padrão em Wimborne, e a criança era treinada em aprendizado sólido e em realizações adequadas à sua posição. 
     Graças a isso, ela mais tarde pôde escrever a Vida de São Winibaldo e um relato em latim das viagens de São Willibaldo na Palestina. Ela é, portanto, vista por muitos como a primeira autora feminina da Inglaterra e da Alemanha. Apenas um ano após sua chegada, Valburga recebeu a notícia da morte de seu pai em Lucca.
     Durante este período, São Bonifácio estava lançando as bases da Igreja na Alemanha. Viu que na maior parte esforços dispersos seriam inúteis, ou exerceriam apenas uma influência passageira. Ele, portanto, determinou colocar todo o país sob um sistema organizado. À medida que avançava em suas conquistas espirituais, estabeleceu mosteiros que, como fortalezas, deveriam abrigar as regiões conquistadas, e de cujas torres de vigia a luz da fé e do aprendizado deveria irradiar longe e perto.
     São Bonifácio foi o primeiro missionário a chamar as mulheres em seu auxílio. Em 748, em resposta ao seu apelo, a abadessa Tetta enviou para a Alemanha Santa Lioba e Santa Valburga com muitas outras freiras. Elas navegaram com bom tempo, mas de repente surgiu uma terrível tempestade. Em seguida, Valburga orou, ajoelhando-se no convés, e imediatamente o mar se acalmou. Ao desembarcar, os marinheiros proclamaram o milagre que haviam testemunhado, de modo que Valburga foi recebida em todos os lugares com alegria e veneração.
     Há uma tradição na Igreja de Antuérpia, que a caminho da Alemanha Valburga fez alguma estadia lá; e na igreja mais antiga daquela cidade, que agora leva o título de Santa Valburga é apontada uma gruta na qual ela costumava rezar. Esta mesma igreja, antes de adotar o Ofício Romano, costumava celebrar a festa de Santa Valburga quatro vezes por ano. Em Mainz, ela foi recebida por seu tio, São Bonifácio, e por seu irmão, São Willibaldo.
A viagem para a Alemanha
     Depois de viver algum tempo sob o governo de Santa Lioba em Bischofsheim, ela foi nomeada abadessa de Heidenheim e, portanto, foi colocada perto de seu irmão favorito, São Winibaldo, que governava uma abadia lá. Após a morte de São Winibaldo ela governou o mosteiro dos monges, bem como o seu próprio. 
     Sua virtude, doçura e prudência, somadas aos dons da graça e da natureza com os quais ela foi dotada, bem como os muitos milagres que ela realizou, a tornaram querida por todos. Foi sobre essas monjas que Ozanam escreveu: "O silêncio e a humildade velaram os trabalhos das monjas dos olhos do mundo, mas a história lhes atribuiu seu lugar no início da civilização alemã: a Providência colocou as mulheres sempre ao lado do berço". 
     Em 23 de setembro de 776, ela ajudou na transladação do corpo de seu irmão São Winibaldo por São Willibaldo, quando se descobriu que o tempo não havia deixado vestígios nos restos sagrados. Pouco depois disso, ela adoeceu e, tendo sido assistida em seus últimos momentos por São Willibaldo, expirou.
     São Willibaldo a colocou para descansar ao lado de São Winibaldo, e muitas maravilhas foram feitas em ambos os túmulos. São Willibaldo sobreviveu até 786 e, após sua morte, a devoção a Santa Valburga diminuiu gradualmente, e seu túmulo foi negligenciado. 
     Por volta de 870, Otkar, então bispo de Eichstadt, decidiu restaurar a igreja e o mosteiro de Heidenheim, que estavam caindo em ruínas. Tendo os trabalhadores profanado o túmulo de Santa Valburga, ela uma noite apareceu ao bispo, repreendendo-o e ameaçando-o. Isso levou à trasladação solene dos restos mortais para Eichstadt em 21 de setembro do mesmo ano. Eles foram colocados na Igreja de Santa Cruz, agora chamada de Sta. Valburga. 
     Em 893, o bispo Erchanbold, sucessor de Otkar, abriu o santuário para retirar uma parte das relíquias para Liubula, abadessa de Monheim, e foi então que o corpo foi descoberto pela primeira vez imerso em um óleo precioso ou orvalho, que daquele dia até hoje (exceto durante um período em que Eichstadt foi colocado sob interdição, e quando o sangue foi derramado na igreja por ladrões que feriram gravemente o sineiro) continuou a fluir dos restos sagrados, especialmente do peito. 
     Este fato fez com que Santa Valburga fosse contada entre os Elaephori, ou santos produtores de óleo. Porções das relíquias de Santa Valburga foram levadas para Colônia, Antuérpia, Furnes e outros lugares, enquanto seu óleo foi levado para todos os cantos do globo.
     As várias transladações das relíquias de Santa Valburga levaram a uma diversidade de festas em sua homenagem. No Martirológio Romano, ela é comemorada em 1º de maio, seu nome está ligado ao de Santo Asafe, dia em que seu principal festival é celebrado na Bélgica e na Baviera. No Breviário Beneditino, sua festa é atribuída a 25 (no ano bissexto 26) de fevereiro. 
     Ela é representada no hábito beneditino com um pequeno frasco ou garrafa; como abadessa com um báculo, uma coroa a seus pés, denotando seu nascimento real; às vezes ela é representada em um grupo com São Filipe e São Tiago, o Menor, e São Sigismundo, rei da Borgonha, porque se diz que ela foi canonizada pelo Papa Adriano II em 1º de maio, a festa desses santos. Se, no entanto, como alguns afirmam, ela foi canonizada durante o episcopado de Erchanbold, não no de Otkar, então não poderia ter sido durante o pontificado de Adriano II. 
     A comunidade beneditina de Eichstadt está florescendo, e as freiras cuidam do santuário da santa; as de Heidenheim foram impiedosamente expulsas em 1538, mas a igreja está agora nas mãos dos católicos.
Gertrude Casanova (Enciclopédia Católica de 1913)
25 de Fevereiro - Princesa, Abadessa, Milagreiro - Nobreza e Elites Tradicionais Análogas

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Santa Apolônia, mártir – 9 de fevereiro

     Apolônia de Alexandria (m. 249) fez parte de um grupo de virgens mártires que padeceram em Alexandria, no Egito, durante um levante local contra o Cristianismo antes da perseguição de Décio. De acordo com a legenda, durante sua tortura teve todos os seus dentes violentamente arrancados ou quebrados. Por esta razão, é popularmente considerada como a padroeira da Odontologia, dos dentistas e daqueles que sofrem de dor de dente ou outros problemas dentais [1].
História
     Historiadores cristãos têm afirmado que nos últimos anos do imperador Filipe, o Árabe (r. 244–249), durante as não bem documentadas festividades para comemorar o milênio da fundação de Roma (tradicionalmente teria ocorrido no ano de 753 a.C., o que nos dá a data aproximada do milênio como no ano de 248 d.C.), a fúria do povo de Alexandria se transformou em um ódio ainda maior, e embora um de seus poetas já profetizasse uma calamidade, mesmo assim, foram cometidos sangrentos abusos contra os cristãos, a quem as autoridades nada faziam para proteger.
     São Dionísio, bispo de Alexandria, (247–265), relata o sofrimento de seus paroquianos em uma carta endereçada a Fábio, bispo de Antioquia, que teve grande parte de seu texto preservado no livro de Eusébio intitulado a História Eclesiástica (VI.41[2]) [3]. Após descrever como um homem e uma mulher cristãos chamados Metras e Quinta, foram capturados e mortos pela multidão, e como as casas de muitos outros cristãos foram saqueadas, Dionísio continua seu relato:
     “Naquele momento Apolônia, parthénos presbytis [4] foi considerada por eles uma pessoa de alta estima. Então aqueles homens também a agarraram e com vários golpes quebraram todos os seus dentes. Eles então ergueram fora dos portões da cidade uma pilha de madeira e ameaçaram queimá-la viva se viesse a recusar-se a repetir diante deles palavras ímpias (como uma blasfêmia contra Cristo, ou uma invocação a algum deus pagão). Deram-lhe, diante de um pedido seu, um minuto de liberdade, e ela então se jogou rapidamente no fogo, sendo queimada até a morte”.
     Esta breve narrativa era mais estendida e moralizada no livro "Lenda Dourada" de Jacopo de Varazze (c. 1260) [5][6].
Suicídio  
     Apolônia e um grupo inteiro de jovens mártires não esperaram pela morte com a qual haviam sido ameaçadas, talvez para preservar sua castidade ou então porque viram-se confrontadas com a alternativa de renunciar sua fé ou serem assassinadas, voluntariamente abraçaram a morte que havia sido preparada para elas, uma atitude que perigosamente se aproxima do suicídio, segundo alguns. Santo Agostinho de Hipona toca nesta questão sobre o suicídio no primeiro livro da De Civitate Dei (I:26) [7]:
     “Mas, dizem eles, durante o tempo da perseguição certas mulheres santas jogavam-se às águas com a intenção de serem arrastadas pelas ondas e afogarem-se, e assim preservar sua castidade ameaçada. Apesar de elas abrirem mão de suas vidas conscientemente, mesmo assim receberam uma grande distinção como mártires da Igreja Católica e seus festejos são celebrados com grande cerimônia. Este é um tema sobre o qual eu não ouso emitir um julgamento esclarecedor. Pois eu sei, sem objeção, que a Igreja era divinamente autorizada através de revelações confiáveis a honrar desta forma a memória destes cristãos. Pode ser que seja este o caso. Mas pode também ser que não, que elas agiram desta maneira, não por um capricho humano, mas sob o comando de Deus, não erroneamente, mas através da obediência, da mesma forma que supomos ocorreu com Sansão? Quando, entretanto, Deus dá um comando e o faz de forma clara, quem atribuiria a esta obediência o título de crime ou condenaria esta piedosa devoção e serviço de boa vontade?
     A narrativa de São Dionísio não sugere a menor reprovação quanto a esse ato de Santa Apolônia; aos seus olhos, ela era tão mártir quanto as outras, e como tal era reverenciada na Igreja de Alexandria. Com o tempo, sua festa também se tornou popular no Ocidente. Uma narrativa posterior duplicou erroneamente Apolônia, tornando-a uma virgem cristã de Roma no reinado de Juliano, o Apóstata, sofrendo o mesmo destino dentário.
Veneração
     A Igreja Católica Romana celebra Santa Apolônia no dia 9 de fevereiro, e ela é popularmente invocada contra a dor de dente devido ao suplício que sofreu. Costuma ser representada nas artes com uma torquês ou tenaz através da qual um dente é preso. Posteriormente no século XIV a ilustração de um manuscrito francês foi amplamente distribuída como um pôster que era considerado apropriado para gabinetes odontológicos nos Estados Unidos. Nele, o dente sagrado preso no tenaz brilha por si, como se fosse um bico de luz [8].
     Santa Apolônia é uma das duas santas padroeiras da Catânia. Na Alemanha, Apolônia faz parte dos 14 Santos Auxiliares ("vierzehn heiligen" ou "Nothelfer"), escolhidos como os patronos da vida diária, sendo considerada a protetora contra a dor de dente [9].
    William S. Walsh, em Curiosities of Popular Customs And of Rites, Ceremonies, Observances, and Miscellaneous Antiquities de 1897, notou que, apesar da maior parte de suas relíquias estarem preservadas na própria igreja de Santa Apolônia em Roma, sua cabeça está na Basílica de Santa Maria em Trastevere, seus braços na Basílica de São Lourenço Fora dos Muros, partes de sua mandíbula na Catedral de São Basílio, e outras relíquias estão na igreja Jesuíta da Antuérpia, na igreja de Santo Agostinho em Bruxelas, na igreja Jesuíta em Mechelen, na igreja da Santa Cruz em Liège, no tesouro da Sé do Porto, na toponímia lisboeta bem como no próprio Convento de Santa Apolônia, e em muitas igrejas na cidade de Colônia. Essas relíquias consistem, muitas vezes, apenas de um dente ou pedaço de osso. Na Idade Média, objetos que se dizia serem seus dentes eram vendidos como curas para dor de dente [10].
     Há uma estátua de Santa Apolônia na igreja de Locronan, França. A Ilha Maurícia foi originalmente chamada de Santa Apolônia em sua homenagem em 1507 pelos navegadores portugueses [11]. Uma igreja paroquial em Eilendorf, um subúrbio de Aachen, Alemanha, recebeu o nome em homenagem a Santa Apolônia.
     Em algumas regiões da Itália, Santa Apolônia é referenciada como a fada do dente, coletando os dentes de leite caídos das crianças enquanto elas dormem e deixando um presente em troca [12].
     Havia uma igreja dedicada a ela em Roma, próxima à Basílica de Santa Maria em Trastevere, mas ela não mais existe. Só o seu pequeno quarteirão, a Piazza Sant'Apollonia ou Praça de Santa Apolônia ainda permanece. Uma das principais estações de trem de Lisboa também recebe o nome desta santa.
Devoção na Inglaterra
     Na Inglaterra existem 52 imagens conhecidas de Santa Apolônia em várias igrejas que resistiram à destruição dos comissários do século XVI.. Elas estão concentradas em Devon e Anglia Oriental. A maioria destas imagens são painéis panorâmicos atrás da cruz ou vitrais, com apenas uma sendo principalmente de pedra (Stoke-in-Teignhead, Devon). Sua imagem é o suporte lateral do brasão da Associação Odontológica Britânica [13].

Oração a Santa Apolônia
     "Ó bom Deus, rogamos que a intercessão da gloriosa mártir de Alexandria, Santa Apolônia, nos livre de todas as enfermidades do rosto e da boca. Lembrai-vos principalmente das criaturas inocentes e indefesas. Afastai, se possível, a amargura das dores de dente. Iluminai, fortificai e protegei os cirurgiões-dentistas, para que sempre se dediquem ao próximo com o amor que de vós emana, e nos seja dado usufruir de vosso reino”.
     Santa Apolônia, intercedei a Deus por nós. Amém

Referências
1. ↑ «CATHOLIC ENCYCLOPEDIA: St. Apollonia». www.newadvent.org. Consultado em 24 de outubro de 2024
2. ↑ Eusébio de Cesareia. «41». História Eclesiástica. The Martyrs in Alexandria. (em inglês). VI. [S.l.: s.n.]
3. ↑ Historia Ecclesiae, Eusébio de Cesaréia I:vi: 41.
4. ↑ virgem presbítera, com isso ele provavelmente não quis se referir a uma virgem de idade avançada como é geralmente dito, mas a uma diaconesa) [carece de fontes]
5. ↑ «Apollonia von Alexandria - Ökumenisches Heiligenlexikon». www.heiligenlexikon.de (em alemão). Consultado em 24 de outubro de 2024
6. ↑ «Sant' Apollonia». Santiebeati.it (em italiano). Consultado em 24 de outubro de 2024
7. ↑ A Cidade de Deus, Agostinho de Hipona, I:26.
8. ↑ «Virgin Martyr Apollonia - Troparion & Kontakion». www.oca.org. Consultado em 24 de outubro de 2024
9. ↑ «LITANIES». www.catholictradition.org. Consultado em 24 de outubro de 2024
10. ↑ William S. Walsh, Curiosidades de trajes populares e de ritos, cerimônias, observâncias e antiguidades diversas, 1897.
11. ↑ Jacques Auber, Histoire de l'océan Indien, 1955, p. 233
12. ↑ «La fatina dei denti». QC QuotidianoCanavese (em italiano). 22 de agosto de 2019. Consultado em 24 de outubro de 2024
13. ↑ «The British Dental Museum». British Dental Assocation (em inglês). Consultado em 24 de outubro de 2024

Fonte: Apolônia de Alexandria – Wikipédia, a enciclopédia livre

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Santa Doroteia e S. Teófilo, Mártires - 6 de fevereiro

     
     Estes mártires são recordados em uma Passio muito antiga e comemorados no Martirológio Jeronimiano no dia 6 de fevereiro. O Martirológio Romano relata: Em Cesareia, na Capadócia, na moderna Turquia, os santos mártires Doroteia, virgem, e Teófilo, advogado.
     Nobre, muito rica e de grande educação, Doroteia viveu em Cesareia, capital da província romana da Capadócia, e foi martirizada no ano de 304 por ser cristã, vítima das perseguições do imperador romano Diocleciano.
     A jovem teve os pais martirizados no Anfiteatro, fez um voto de castidade a Cristo e transformou a própria casa numa espécie de igreja, onde passava os dias em meio a jejuns e orações, e valendo-se da própria fortuna para fazer caridade aos pobres. Tanto zelo e piedade atraiam os cristãos de Cesareia que a procuravam para ouvir os mais sábios conselhos. Isso fez com que seu nome fosse citado no Tribunal Romano como praticante da fé cristã.
     Na época governava o pretório de Cesareia o nobre Saprício, que mandou trazer a jovem à sua presença e a interrogou. Como a moça respondesse sabiamente a todas as perguntas, desarticulando as intenções dos juízes de ridicularizarem a religião cristã, e muito zelosa de sua pureza, foi obrigada a viver durante uma semana na companhia de duas jovens sacerdotisas pagãs chamadas Crista e Calista, para que elas fizessem Dorotéia abandonar sua fé.  Mas, a constância de Doroteia acabou por convertê-las à fé cristã, e elas foram mortas.
     Convencido de que a jovem não sacrificaria aos deuses, e grandemente irritado com suas respostas, Saprício ordenou que fosse estendida no cavalete. “É inútil contemporizar, disse Doroteia, tenho pressa de chegar a Jesus, meu Senhor, que me chamou à sequela de seus santos”. Saprício então mandou esbofeteá-la; vendo, depois, que ela continuava a manifestar a sua alegria, formulou assim a sentença: “Ordenamos que Doroteia, jovem repleta de orgulho, que recusou sacrificar aos deuses imortais e conservar assim a sua vida, desejosa de morrer por um homem chamado Jesus Cristo, morra à espada”.
     Ao escutar a moça dizer que iria para o céu onde era eterna a primavera, um dos pretores, de nome Teófilo, zombou dela dizendo: "Pois já que vais ao jardim de teu esposo onde a primavera é eterna, envia-me de lá frutos e rosas perfumadas".
     Doroteia prometeu realizar sua vontade. Antes de a espada cair sobre sua cabeça, ela rezou e pediu a Deus que realizasse sua promessa. Um Anjo apareceu-lhe e ela entregou em suas mãos o lenço com que enxugara o rosto, dizendo: "Vai e leva a Teófilo e diz que Doroteia, serva de Cristo, lhe envia os frutos e as flores que ele pediu. E diz também que, se ele quiser mais, que vá ter com ela no Paraíso". Dito isso, a espada caiu sobre Doroteia, que subiu radiante ao céu.
     No tribunal, Teófilo continuava a zombar do caso de Doroteia quando lhe apareceu o Anjo e transmitiu-lhe o recado da virgem cristã. Assombrado com o estupendo milagre de receber as maçãs e as rosas em época de inverno rigoroso, Teófilo imediatamente foi tocado pela Graça de Deus e passou a afirmar aos amigos que o Deus dos cristãos era de fato O verdadeiro.
     No início todos pensaram que se tratava de mais uma ironia de Teófilo, mas devido à sua insistência, foi denunciado. Saprício então o convocou para julgamento cobrando sua coerência com as convicções antigas, mas Teófilo afirmou que havia se convertido à fé em Cristo e que não a renegaria jamais. Foi torturado e decapitado também.
     O culto de Santa Dorotéia foi muito difundido durante a Idade Média, sendo invocada entre os "Santos Auxiliadores". Inúmeros artistas inspiraram-se na conversão de Teófilo retratando em quadros o milagre de Santa Dorotéia, chamada até hoje de a "Santa das flores": Doroteia, sentada aos pés da Virgem Maria tendo ao colo o Menino Jesus; Doroteia tem numa mão um feixe de margaridas, na outra uma cesta cheia de flores e frutos. A cabeça está coroada de rosas. Em outras representações, a cesta está nas mãos de um anjo encarregado de levá-la a Teófilo, estando o mensageiro ao lado direito da Santa.
     Doroteia é a santa das flores e faz parte daquela florescência de jovens que, com a sua virgindade e com a sua graça, perfumaram o cristianismo primitivo.
     Santa Doroteia é Patrona das Floristas.

Etimologia: Doroteia = dom de Deus, do grego, como Teodora.

S. Doroteia - Informações sobre o Santo do dia - Vatican News
Santa Doroteia – mártir | Paulus Editora

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Santa Vereburga de Chester, 3 de fevereiro


Princesa pagã meio feroz, princesa cristã meio gentil
 
    Beneditina, padroeira de Chester, abadessa de Weedon, Trentham, Hanbury, Minster em Sheppy e Ely, nascida em Staffordshire no início do século VII; morreu em Trentham, 3 de fevereiro de 699 ou 700.
     Sua mãe era Santa Ermenilda, filha de Ercomberto, rei de Kent, e Santa Sexburga, e seu pai, Wulfhere, filho de Penda, o mais feroz dos reis da Mércia. Santa Vereburga uniu assim em suas veias o sangue de duas raças muito diferentes: uma ferozmente cruel e pagã; a outra um tipo de valor gentil e santidade cristã. Nela, da mesma forma, centrou-se o sangue real de todos os principais reis saxões, enquanto seu pai, no assassinato de seu irmão mais velho, Peada, que havia se convertido ao cristianismo, sucedeu ao maior reino da heptarquia.

Da esquerda para a direita: Santa Eteldreda e Santa Vitburga, irmãs de Santa Sexburga; Sta. Vereburga, neta de Sta. Sexburga. Todas as três estão incorruptas, embora o túmulo de Sta. Vereburga tenha sido destruído sob Henrique VIII.

     Se Wulfhere era um pagão obstinado que atrasou sua conversão prometida, ou um cristão relapso, é controvertido, mas a lenda do crime terrível e antinatural que lhe foi imputado por alguns escritores deve ser descartado aqui com a autoridade de todos os cronistas anteriores e contemporâneos, como os bollandistas apontaram. Os mártires, Santos Wulfald e Ruffin, não eram filhos de Wulfhere e Santa Ermenilda, nem vítimas da tirania daquele rei. Ermenilda imediatamente conquistou o coração de seus súditos, e seu zelo deu frutos na conversão de muitos deles, enquanto sua influência sobre o caráter apaixonado de seu marido o transformou em um rei cristão modelo.
     Vereburga herdou o temperamento e os dons de sua mãe. Por causa de sua beleza e graça, a princesa foi ansiosamente procurada em casamento, sendo o principal entre seus pretendentes Werebode, um guerreiro obstinado, a quem Wulfhere era muito devedor; mas a constância de Vereburga superou todos os obstáculos, de modo que finalmente ela obteve o consentimento de seu pai para entrar na Abadia de Ely, que havia sido fundada por sua tia-avó, Santa Eteldreda, e cuja fama era generalizada.
     Wulfhere não sobreviveu por muito tempo à consagração de sua filha. Com sua morte, Santa Ermenilda assumiu o véu em Ely, onde acabou sucedendo sua mãe, Santa Sexburga, como abadessa. Kenred, irmão de Vereburga, sendo uma mera criança com a morte de seu pai, seu tio Ethelred sucedeu-o ao trono. Este rei convidou Vereburga a assumir a direção de todos os mosteiros de freiras em seu domínio, a fim de que ela pudesse levá-los ao alto nível de disciplina e perfeição que tantas vezes o edificaram em Ely. A santa, com alguma dificuldade, consentiu em sacrificar a reclusão que prezava e empreendeu o trabalho de reformar os mosteiros da Mércia existentes e de fundar novos que o rei Ethelred generosamente doou, a saber, Trentham e Hanbury, em Staffordshire, e Weedon, em Northamptonshire.
     Tinha sido privilégio de Sta. Vereburga ser treinada por santos, em casa por S. Chad (depois bispo de Lichfield), e por sua mãe, e no claustro por sua tia-avó. Sua posição não mudou a humildade que sempre a caracterizou, de modo que, em devoção a todos os que estavam sob seus cuidados, ela parecia mais a serva do que a mãe. Seu único pensamento era superar suas irmãs na prática da perfeição religiosa. Deus recompensou sua confiança infantil com muitos milagres, que fizeram de Sta. Vereburga um dos santos saxões mais conhecidos e amados. 
     O [milagre] do ganso roubado apelou mais para a imaginação popular. A história, imortalizada na iconografia de Sta. Vereburga, relata que, por um simples comando, ela baniu um bando de gansos selvagens que estava causando estragos nos campos de milho de Weedon, e que desde então nenhuma dessas aves foi vista naquelas partes. Ela também foi dotada dos dons de profecia e de ler os segredos dos corações. Sabendo o quanto suas diferentes comunidades eram dedicadas a ela e como cada uma se esforçaria para garantir a posse de seu corpo após a morte, ela decidiu evitar essa rivalidade piedosa escolhendo Hanbury como seu local de sepultamento. 
Catedral de Chester
     Mas as freiras do mosteiro de Trentham decidiram manter os restos mortais. Elas não apenas se recusaram a entregá-los àqueles que vieram de Hanbury, mas até trancaram o caixão em uma cripta e colocaram um guarda para vigiá-lo. O povo de Hanbury enviou novamente um grande grupo para fazer valer suas reivindicações. Chegando a Trentham à meia-noite, todos os ferrolhos e barras cederam ao toque, enquanto os guardas foram dominados pelo sono e não sabiam que o caixão estava sendo carregado para Hanbury.
     Tão numerosas e maravilhosas foram as curas operadas no túmulo da santa que, em 708, seu corpo foi solenemente transladado para um lugar mais visível na igreja, na presença de seu irmão, Kenred, que agora sucedera ao rei Ethelred. Apesar de ter estado nove anos na tumba, o corpo estava intacto. Tão grande foi a impressão causada em Kenred que ele resolveu renunciar à coroa e seguiu os passos de sua irmã. Em 875, por medo dos dinamarqueses e para mostrar maior honra a santa, o corpo foi removido para Chester. A Igreja de São Pedro e São Paulo, no local da atual catedral de Chester, foi novamente dedicada a Sta. Vereburga e São Osvaldo, provavelmente no reinado de Athelstan. 
     O grande Leofric, conde da Mércia (que também foi denominado conde de Chester), e sua esposa, Lady Godiva, repararam e ampliaram a igreja e, em 1093, Hugh Lupus, conde de Chester, doou ricamente a abadia e sua igreja. Pela instrumentalidade deste nobre, Chester, que estava nas mãos de cônegos seculares, tornou-se uma grande abadia beneditina, o nome de Santo Anselmo, então monge em Bee, sendo associado a essa transformação. A abadia possuía uma influência e posição tão imensas que, na época da supressão sob Henrique VIII, o conde de Derby era o senescal do abade. 
Altar de Sta. Vereburga
na Catedral de Chester
     Na vasta onda de iconoclastia que varreu o país no reinado daquele tirano, a catedral foi saqueada por apóstatas que espalharam as relíquias de Sta. Vereburga. Fragmentos do santuário foram usados como base de um trono episcopal. Muitos dos rótulos e figuras foram mutilados e, ao restaurá-los, os trabalhadores, por engano, colocaram cabeças femininas nos ombros masculinos e vice-versa. Apenas trinta das figuras originais permanecem, quatro tendo sido perdidas. Mais tarde, todos esses fragmentos foram removidos para a extremidade oeste do corredor sul do coro, onde foram colocados quase na posição original do santuário, que tem 10 pés de altura. 
     A festa de Sta. Vereburga é celebrada em 3 de fevereiro.

Acta SS., I FEV.; BRADSHAW, Metrical Holy Lyfe e História de Saynt Werburge, etc., ed. HAWKINS (impresso em fac-símile para a Chetham Society, 1848); BUTLER, Vidas dos Santos (Londres, 1833); DUGDALE, Monasticon anglicanum (Londres, 1846); DUNBAR, Dict. de Mulheres Santas (Londres, 1905), s.v.; HIATT, Chester, a Catedral e a Sé (Londres, 1898); LELAND, Collectanea (Londres, 1770); LEWIS, Dicionário Topográfico da Inglaterra (Londres, 1831), s.v.; Nova legenda Angliae, ed. HORSTMAN (Oxford, 1901); SPELMAN, Hist. e Destino do Sacrilégio (Londres, 1895); TANNER, Notitia Monast. (Londres, 1744).
IRMÃ GERTRUDE CASANOVA (Enciclopédia Católica)
3 de fevereiro - Princesa pagã meio feroz, princesa cristã meio gentil - nobreza e elites tradicionais análogas

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Santa Marcela de Roma, Viúva, “A glória das senhoras” - 31 de janeiro

     
     Algumas cartas de São Jerônimo, em especial a de número 127 (1) para a virgem Principia, discípula de Marcela, constituem a principal fonte para a vida da Santa.
     A presença pagã ainda era forte no Império quando Marcela nasceu. Havia decorrido pouco mais de uma década do Edito de Milão (ano 313), pelo qual Constantino tirou a Igreja das catacumbas, dando-lhe liberdade e permitindo sua expansão.
     Santa Marcela viveu quando Roma já não era mais a orgulhosa cidade que causava inveja a todos os povos. Com a divisão do Império e a importância que adquiriu Bizâncio, perdera muito de sua grandeza. Os imperadores posteriores a Constantino pouco permaneceram em Roma, escolhendo outras cidades do Império para capital, como Milão e Ravena.
     A Cidade Eterna tornou-se cobiçada como possível presa por vários povos bárbaros. Alarico, rei dos visigodos, a sitiou duas vezes em 408. Alarico retornou dois anos depois, invadindo e saqueando a cidade a ferro e fogo.
     Marcela pertencia a uma das mais ilustres famílias romanas, os Marcelos (segundo outros dos Claudios). Nasceu em 325, ficando órfã do pai na adolescência. Com a educação que recebeu, Marcela tornou-se uma donzela muito culta, capaz de manter conversação em qualquer campo do saber. Cresceu em meio ao luxo, frequentando os mais altos ambientes de Roma.
     Casou-se muito jovem, ficando viúva apenas sete meses depois das núpcias. Jovem, bela, de alta estirpe, logo apareceram vários pretendentes à sua mão. Apesar das pressões da mãe, Albina, Marcela tinha decidido consagrar-se inteiramente a Jesus Cristo, dedicando-se inteiramente a uma vida retirada. Assim, segundo São Jerônimo, Marcela foi a primeira matrona romana a desenvolver os princípios do monaquismo entre as famílias nobres, desafiando o ambiente mundano que a cercava.
     Marcela entrou em contato com alguns sacerdotes de Alexandria refugiados em Roma devido à perseguição ariana, dos quais ouviu o relato da vida de Santo Antão, ainda vivo, e de como funcionavam os mosteiros da Tebaida fundados por São Pacômio para virgens e viúvas. Resolveu seguir o exemplo dessas heroínas da solidão. Vestiu-se com uma pobre túnica, passou a jejuar moderadamente por causa de sua frágil saúde, e a dedicar longo tempo à oração e ao estudo das Sagradas Escrituras.
     Seu majestoso palácio do Aventino transformou-se em um cenáculo para onde confluíam outras nobres romanas como Sofronia, Asélia (sua irmã), Principia, Marcelina - seus irmãos Ambrósio e Sátiro; Lea, Paula com suas filhas; a própria mãe, Albina, aderiu àquela nova forma de vida.
     Entre aquelas nobres romanas destacou-se Santa Paula (2), de tão alta estirpe quanto a de Marcela, que também tinha consagrado a Deus sua viuvez. São Jerônimo afirma que “foi na cela de Marcela que Eustáquia (filha de Paula, ainda criança), esse paradigma de virgens, foi gradualmente formada”. Mais tarde Santa Eustáquia mudou-se com sua mãe para a Terra Santa, a fim de trabalharem com São Jerônimo. Santa Paula conhecia os idiomas grego e hebraico. Ela e a filha auxiliavam São Jerônimo nos seus trabalhos de tradução dos textos bíblicos, a famosa Vulgata usada durante séculos pela Santa Igreja. Mãe e filha finalmente fundaram um mosteiro na Terra Santa, onde viveram santamente.
     A casa de Marcela tornou-se um centro de propaganda monástica. Penitência, jejum, oração, estudo, exclusão de conversações fúteis eram praticados na vida quotidiana.
     No ano 382 o imperador Teodósio e o Papa São Dâmaso resolveram convocar um sínodo em Roma para combater as heresias que pululavam principalmente no Oriente. Entre os que compareceram figuravam Santo Epifânio, bispo de Salamina (Chipre), e São Paulino, bispo de Antioquia. Com eles veio a Roma o monge Jerônimo, já então com fama de grande exegeta. Adoecendo Santo Ambrósio, que deveria ser o secretário do sínodo, São Dâmaso nomeou São Jerônimo para substituí-lo.
     Esse futuro Doutor da Igreja assinalou-se tanto por sua erudição e segurança de doutrina que, terminado o sínodo, São Dâmaso escolheu-o para seu secretário particular.
     A pedido de São Dâmaso, São Jerônimo hospedou-se em casa de Marcela. Foi uma época emocionante para essa mulher de letras que havia mergulhado no grego e no hebraico, entreter uma das grandes mentes da época. São Jerônimo passou os três anos seguintes no que chamou de "igreja doméstica", traduzindo a Bíblia para o latim. Marcela aprendeu com seus ensinamentos, mesmo quando criticou sua tradução. Ele falou e escreveu sobre sua devoção cristã e erudição e elogiou sua influência sobre Anastácio, bispo de Roma - particularmente em sua condenação das doutrinas de Orígenes, que São Jerônimo declarou uma "vitória gloriosa". Na verdade, sua admiração por Marcela era ilimitada, não apenas por sua perspicácia intelectual, mas também por sua deferência aos homens que poderiam ser ameaçados por seu vasto estoque de conhecimento.
     Marcela, no entanto, também era conhecida por seus esforços para impedir São Jerônimo de brigar com seus oponentes - ou pelo menos ajudá-lo a controlar seu temperamento lendário. Onze de suas cartas existentes são endereçadas a ela, e ela é mencionada em muitos de seus outros escritos. Em uma de suas cartas, ele responde à pergunta dela sobre a verdade do montanismo. Alguém aparentemente estava tentando convertê-la, e ela estava profundamente interessada no que estava ouvindo, embora suspeitasse que a alegação de que eles possuíam uma espiritualidade mais autêntica poderia ser falsa. São Jerônimo escreve uma longa refutação ponto por ponto do movimento
     Santa Marcela, estudiosa erudita das Escrituras, tudo fez para que o santo a dirigisse, com suas discípulas, nos estudos e na vida de piedade. Conta São Jerônimo:
     “Em minha modéstia, evitava os olhos das damas de alta categoria. Contudo ela pleiteou tão pressurosamente — ‘oportuna e importunamente’ (2 Tm 4, 2), como diz o Apóstolo — que por fim sua perseverança superou minha relutância. E, como nesses dias meu nome tinha alguma fama como estudante das Escrituras, ela nunca veio me ver sem que me perguntasse alguma questão relativa a elas; nem aquiescia logo às minhas explicações, pelo contrário, as debatia. Não era, entretanto, para discutir, mas para aprender as respostas às objeções que poderiam ser feitas aos meus pronunciamentos”. Com admiração, acrescenta: “Quanta virtude e habilidade, quanta santidade e pureza encontrei nela, espanto-me em dizer. [...] E o que em mim era o fruto de longo estudo e, como tal, feito pela constante meditação que se tornou parte de minha natureza, isso ela saboreou e fez como próprio dela” (Carta 127, 7).
Sta. Marcela, Sta. Paula e
sua filha com São
Jerônimo

     Quando São Jerônimo retirou-se para Belém, Santa Marcela ficou como árbitra em matéria de Sagrada Escritura para os discípulos que o santo deixara em Roma, inclusive alguns sacerdotes.
     São Jerônimo diz que Santa Marcela estava atenta à pureza da fé. E quando surgiram em Roma, ou nela se tornaram conhecidas algumas heresias como a dos pelagianos, ela pôs-se em guarda: “Consciente de que a fé de Roma — louvada por um apóstolo (Rm 1, 8) — estava agora em perigo, e de que essa nova heresia estava levando consigo não somente padres e monges, mas também muitos leigos, [...] ela resistiu a seus mestres, escolhendo agradar antes a Deus que aos homens” (Id. nº 9).
     A Santa desejou transferir-se para Belém, atendendo ao pedido de suas amigas Santas Paula e Eustáquia, mas preferiu continuar a vida ascética e penitente em Roma. Por volta do ano 399 mudou-se para um local mais isolado, nos arredores de Roma, onde vivia com a jovem Principia, sua discípula, mantendo entretanto sua casa no Aventino.
     Santa Marcela se correspondia frequentemente com o seu mentor espiritual, São Jeronimo, o qual respondia suas perguntas sobre questões espirituais, e ele passou a respeita-la e referir-se a ela com "a gloria das damas romanas". Onze das suas cartas à Santa Marcela sobreviveram ao tempo e estão guardadas na Biblioteca do Vaticano.[1]
     Em 410, quando Alarico e os seus bárbaros invadiram Roma, encontraram a casa de Santa Marcela no prestigioso bairro do Aventino. Apesar de sua avançada idade, ela os recebeu sem nenhum temor. Quando perguntaram por ouro, mostrou-lhes seu pobre hábito como prova de que vivia na pobreza. Mas eles não acreditaram, e flagelaram-na impiedosamente. Esquecida de si mesma, ela só pedia que poupassem Principia, então ainda nova, pois sabia que a ela eles não ultrajariam, o mesmo não se dando com a jovem virgem. Afinal os bárbaros levaram as duas para a basílica de São Paulo Apóstolo, e lá as abandonaram. Poucos dias depois, Santa Marcela entregava sua alma a Deus (Id. nº 13).
________________
Notas:
1. Cfr. Saint Jerome, Letters, New Advent, CD-Rom.
2. Festejada dia 26 de janeiro.
MOMENTOS OPORTUNOS: Santa Marcela - Digna discípula de São Jerônimo     
Santa Marcela de Roma: Conheça a história da sua devoção
Marcela de Roma – Wikipédia, a enciclopédia livre

quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

Santa Jacinta Marescotti, Padroeira de Viterbo - 30 de janeiro

     
     Clarice de Marescotti era filha de Marcantonio Marescotti e Otávia Orsini, Condessa de Vignanello, localidade próxima de Viterbo, Itália, onde nasceu provavelmente no dia 16 de março de 1585.
     De seus pais recebeu profunda formação religiosa. Entretanto, atingindo a adolescência, Clarice, nobre, bela, tornou-se vaidosa e mundana, buscando apenas divertir-se. Sua preocupação passou a ser vestidos, adornos, entretenimentos e um casamento digno de sua classe social.
     Seu pai se preocupava muito com a salvação da filha. Resolveu mandá-la para o convento onde já estava sua irmã mais velha, que lá era um exemplo de virtude. Clarice foi de má vontade, mas como terceira franciscana, pois alimentava o desejo de sair dele o mais rápido possível para voltar à vida de antes. Tanto insistiu que o pai acabou cedendo.
     Mas fora ela não encontrou o que esperava: nenhum casamento apareceu e Clarice viu ainda sua irmã mais nova, Hortência, casar-se com o marquês romano Paulo Capizucci e ela ficar para trás.
     Por insistência da família ela retornou àquele mesmo convento das religiosas da Ordem Terceira Franciscana regular, desta vez como freira, tomando o nome de Jacinta.
     Mas, julgando ela que as celas das freiras eram muito pequenas e pobres, mandou construir uma especial para si, de acordo com sua posição social. Sua cela parecia um bazar pelos luxuosos adornos. Aquilo poderia ficar bem num palácio, destoava do ambiente do convento. Sua piedade é tíbia; a mortificação prescrita, um tédio; até recebe as admoestações com desprezo. Por dez anos levou no convento uma vida mundana.
     Quando completou 30 anos, chegou a hora de Deus e surgiu potente a nobre e católica linhagem que levava dentro de si. Uma grave doença a faz refletir sobre o fogo do Purgatório e do Inferno; tremeu de terror e clamou pelo confessor.
     O Pe. Antônio Biochetti, virtuoso sacerdote, foi atender a doente. Mas, entrando naquele quarto luxuoso recusou-se atender a confissão da freira, dizendo que o Paraíso não era feito para os soberbos. Chorando perguntou-lhe: "Então não há mais salvação para mim?". "Sim — respondeu o religioso — contanto que deixe esses vãos adornos, essas vestimentas suntuosas, e se torne humilde, piedosa, esqueça o mundo e pense só nas coisas do Céu".
     Na manhã seguinte, após ter trocado sua roupa de seda por um pobre hábito, Jacinta fez sua confissão geral com um verdadeiro arrependimento. Depois, no refeitório, aplicou-se forte disciplina diante das irmãs e pediu-lhes perdão pelos maus exemplos que havia dado.
     Nova enfermidade fez com que a ruptura com a vida antiga fosse total. Entregou tudo o que possuía para a superiora e revestiu-se com a mortalha de uma freira que acabava de morrer. Fez o propósito de romper com tudo aquilo que lhe lembrava a antiga vida. Desde então passou a ser chamada de Jacinta de Santa Maria e não mais de Marescotti.
     Trocou sua cama por um feixe de lenha, tendo uma pedra como travesseiro; mortificava-se dia e noite, tomando tão ásperas disciplinas, que o solo de sua cela ficava manchado de sangue. Às sextas-feiras, em memória da sede que Nosso Senhor sofreu na Paixão, colocava um punhado de sal na boca. Sua alimentação passou a ser pão e água. Durante a Quaresma e o Advento, vivia de verduras e raízes apenas cozidas na água.
     Considerando-se como a pior pecadora, escolheu para patronos santos que tinham ofendido a Deus antes de se converterem, como Santo Agostinho, Santa Maria Egipcíaca e Santa Margarida de Cortona. Era devota do Arcanjo São Miguel, amava a contemplação da Paixão de Jesus Cristo, a Missa a levava às lágrimas, as imagens da Virgem Santíssima eram seu refúgio.
     Procurava toda ocasião para se humilhar. Às vezes ia ao refeitório com uma corda ao pescoço, ajoelhava-se diante das freiras, beijava-lhes os pés pedindo perdão pelos maus exemplos passados.
     Ela escreveu a uma religiosa: "Há 14 anos que eu mudei de vida. Durante esse tempo eu rezei algumas vezes quarenta horas seguidas, assisti todos os dias a várias missas, e me encontro ainda longe da perfeição. Quando poderei servir meu Deus como Ele merece? Reze por mim, minha amiga, para que o Senhor me dê ao menos a esperança".
     Embora se considerasse a mulher mais pecadora, a nomeiam subpriora e mestra de noviças. E a fama de suas virtudes propaga-se por toda a região. Deus recompensou sua fiel serva com dons extraordinários como o de profecia, milagres, conhecer os corações, ser instrumento de conversões e frequentes êxtases.
     A conversão de Francisco Pacini, célebre por seus desmandos, tornou-se famosa. Ouvindo falar dele, a Santa fez jejuns e orações por sua conversão. Convencido por um amigo convertido por Jacinta, Pacini vai ao convento falar com ela. No parlatório, diante daquela pobre freira, começou a tremer e à medida que ela falava, ele foi se transformando, caiu de joelhos e prometeu confessar-se.
     No domingo seguinte, o da Paixão, com os pés descalços e uma corda no pescoço, Pacini, no meio da Igreja pediu perdão a todos por seus crimes e escândalos. Mais tarde revestiu o hábito de peregrino e consagrou sua vida a Deus.
     Jacinta reformou muitos conventos com cartas escritas às superioras relaxadas, admoestando-as dos castigos que as ameaçavam. Por sugestão sua a Duquesa de Farnese e de Savella fundou dois mosteiros de clarissas, um em Farnese, outro em Roma.
     Ela se preocupava com as almas que se extraviavam no pecado e para sua recuperação fundou duas confrarias: a Companhia dos Sacconi, para atendimento material dos enfermos e para ajudá-los a morrer bem; e a Congregação dos Oblatos de Maria para incentivar a piedade, fazer obras de caridade e fomentar o apostolado dos leigos.
     Como não tinha voto de clausura, Jacinta ia visitar os pobres, levando-lhes sempre o auxílio espiritual, além do material. Em seu grande apreço pela nobreza dava assistência especialmente aos nobres empobrecidos e envergonhados.
     Santa Jacinta de Marescotti entregou sua bela alma a Deus em 30 de janeiro de 1640. Foi canonizada em 1807 pelo Papa Pio VII. É festejada no dia de seu nascimento para o Céu.

Fontes: Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, d’après le Père Giry, Paris, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, 1882, tomo II, pp. 348 a 356; Manuel de Castro, O.F.M., Santa Jacinta de Marescotti, in Santoral Franciscano