Maria Madalena,
uma grande santa escondida sob lendas infundadas
Ela
é uma das pessoas mais importantes da história do cristianismo, mas muitos
cristãos só conhecem versões erradas a seu respeito
[...] Maria Madalena fazia parte do grupo
dos discípulos de Jesus, seguiu-o até a Cruz e, no jardim em que se encontrava
o sepulcro, foi a primeira testemunha da ressurreição. O Evangelho de João a
descreve chorando porque não tinha encontrado o corpo do Senhor no sepulcro. Ela
procurou-o no jardim com angústia e sofrimento, com as lágrimas que Santo
Anselmo definiu como “lágrimas da
humildade”. São Tomás a chamou de “apóstola
dos apóstolos” porque foi ela quem anunciou aos discípulos atemorizados e
trancados no cenáculo o que eles teriam que anunciar por todo o mundo.
Confusões comuns em torno a Maria Madalena e outras
mulheres
O cardeal Gianfranco Ravasi escreveu a
respeito dela:
“A
tradição, repetida mil vezes na história da arte e que perdura até os nossos
dias, fez de Maria uma prostituta. Isto aconteceu somente porque na página
evangélica precedente (o capítulo 7 de Lucas) é narrada a história da conversão
de uma anônima ‘pecadora conhecida naquela cidade’, aquela que havia untado os
pés de Jesus com óleo perfumado, quando hóspede na casa de um conhecido
fariseu; molhou-os com suas lágrimas e secou-os com seus cabelos. E assim foi
identificada Maria Madalena, sem nenhuma relação textual real, com aquela
prostituta sem nome. Pois bem: este mesmo gesto de veneração será repetido com
Jesus por outra Maria, a irmã de Marta e Lázaro, em outra ocasião (Jo 12, 1-8).
E consumou-se com isto mais um equívoco em relação a Maria Madalena: algumas
tradições populares a identificam com esta Maria de Betânia, depois de já ter
sido confundida com a prostituta da Galileia”.
Relação entre Maria Madalena e Jesus: lendas sem base
histórica
A partir dos relatos do Evangelho,
percebe-se que Maria Madalena sentia um grande amor por Jesus. Ela tinha sido
livrada por Ele de sete demônios, seguia-O como discípula, assistia-O com seus
bens (Lc 8, 2-3) e esteve com Maria, a Mãe de Jesus, e as outras mulheres
quando Jesus foi crucificado (Mc 15, 40-41).
Ela foi, segundo os Evangelhos, a primeira
pessoa a quem Jesus apareceu após a Ressurreição, depois de buscá-lo entre
lágrimas (Jo 20, 11-18). Daí a veneração que ela recebeu na Igreja como
testemunha do Ressuscitado.
Dessas passagens não se pode deduzir nem
que ela foi pecadora, nem muito menos que foi “a mulher de Jesus”, como diriam
os fãs de “O Código Da Vinci“. Os que
defendem que ela foi esposa de Jesus se baseiam no testemunho de alguns
evangelhos apócrifos: todos eles, talvez com exceção apenas do evangelho de
Tomé, são posteriores aos evangelhos canônicos e não têm caráter histórico,
sendo, antes, instrumentos para transmitir ensinamentos gnósticos.
Segundo estas obras que apesar do nome não são evangelhos propriamente, mas revelações particulares de Jesus aos seus discípulos após a Ressurreição, Maria Madalena é quem melhor entendeu tais revelações. Por isso, é a preferida de Jesus e a que recebeu uma revelação especial.
Segundo estas obras que apesar do nome não são evangelhos propriamente, mas revelações particulares de Jesus aos seus discípulos após a Ressurreição, Maria Madalena é quem melhor entendeu tais revelações. Por isso, é a preferida de Jesus e a que recebeu uma revelação especial.
Alguns textos (Evangelho de Tomé, Diálogos
do Salvador, Pistis Sophia, Evangelho de Maria) mostram certa oposição dos
apóstolos em relação a Maria Madalena pelo fato de ela ser mulher, e isso
reflete a concepção negativa que alguns gnósticos tinham do feminino e da
condição de Maria como discípula importante.
No entanto, alguns pretendem ver nesta
oposição um reflexo do que chamam de “postura oficial” da Igreja de então, que
seria supostamente contra a liderança espiritual da mulher. Nada disso é
demonstrável. Esta oposição poderia ser entendida como um conflito de
doutrinas: a de Pedro e dos demais apóstolos diante da doutrina desses grupos
gnósticos, expostas em nome de uma certa “Mariam”, que seria a Madalena.
Em todo caso, o fato de recorrerem a Maria
é uma tentativa de justificar sua abordagem gnóstica. Em outros evangelhos
apócrifos, especialmente no de Felipe, “Mariam” é modelo do ser gnóstico,
precisamente pela sua feminilidade. Ela é um símbolo espiritual do seguimento
de Cristo e de união perfeita com Ele. Nesse contexto, tais escritos falam de
um beijo entre Jesus e Maria, simbolizando uma espécie de sacramento superior
ao Batismo e à Eucaristia.
É muito relevante observar que nem sequer
esses textos apócrifos atribuem conotações sexuais a tais símbolos, a ponto de
que nenhum estudioso sério os interpreta como “testemunho histórico” de suposta
relação sexual entre Jesus e Maria Madalena. Esta é uma suposição sem
qualquer fundamento histórico: nem mesmo os cristãos da época se viram
obrigados a polemizar a respeito, pois é uma tese relativamente recente – e que
ganha força de tempos em tempos, em particular quando se pretende vender livros
de ficção.
____________
Com
informações históricas a partir de texto de Juan Chapa (cf.
Aleteia, abril de 2014)
Jesus, casado com
Maria Madalena?
Parte dessa lenda
se escora num manuscrito apócrifo do ano 570
Foi lançado em 2014 um dos vários livros
que tratam da suposta relação amorosa entre Jesus e Maria
Madalena e da família que eles teriam constituído. Os autores de “The Lost Gospel” disseram, na época, ter
descoberto um documento do ano 570 segundo o qual Jesus teria se casado e tido
filhos com Maria Madalena. Um dos filhos, grande seguidor de Cristo, teria
presenciado os momentos da crucificação e da descoberta do sepulcro vazio. Esse
manuscrito tinha sido composto em siríaco, língua usada no Oriente Médio entre
os séculos IV e XVIII, com trechos em aramaico, a língua de Jesus.
José e Aseneth
O livro, escrito por Barrie Wilson,
professor canadense de estudos religiosos, e Simcha Jacobovici, escritor
israelense, suscitou muitas polêmicas. Após anos de estudos, os autores
afirmaram que existiria parte de verdade naquele manuscrito que, durante anos,
ficou nos arquivos da British Library de Londres. Os dois personagens
principais, José e Aseneth, seriam Jesus e Maria Madalena.
Dois filhos
O texto descreve um casamento que
durou sete dias e que teve a bênção do faraó do Egito. Olhando para Aseneth, o
faraó teria declarado: “Bem-aventurada
pelo Senhor Deus de José, porque ele é o primogênito de Deus, e serás chamada a
Filha do Deus Altíssimo e a esposa de José, agora e para sempre”. Nos anos
sucessivos, Aseneth teria concebido dois filhos: Manasseh e Ephraim. Segundo
Jacobovici, depois que o imperador romano Constantino ordenou destruir todos os
evangelhos, sobraram apenas os de Marcos, Lucas, Mateus e João. Dos demais que
havia não se tem mais traços – e justamente nesses outros haveria relatos sobre
Jesus e Maria Madalena.
O estado civil do Messias
O padre Rinaldo Fabris, biblista, declarou
a Aleteia que “a ausência de
informações sobre a infância de Jesus e sobre o seu estado civil instigou a
fantasia de muitos narradores cristãos e não cristãos. Esse mesmo
vazio dá origem a todos os textos apócrifos”. Por “apócrifos”, a propósito,
entende-se um grupo de textos de caráter religioso que se referem à figura de
Jesus Cristo, mas que não foram reconhecidos como canônicos.
“Na
verdade – prossegue o padre Fabris – o
problema da dificuldade em aceitar um casamento de Jesus não depende
de motivos dogmáticos. Se Ele tivesse sido casado e tivesse tido dois filhos,
não haveria nada de estranho à fé cristã: casar-se e ter filhos é a história da
maior parte dos seres humanos”. E o casamento e a família estão entre os
mais excelsos valores defendidos pelos cristãos. Se a Igreja não reconhece tal
suposto casamento de Jesus, não é porque tenha algo contra o casamento: é
simplesmente porque não existe fundamentação histórica alguma que possa ser
levada a sério no sentido de embasar tal hipótese. O alegado “casamento
de Jesus” nunca foi documentado, a não ser nesses textos que, segundo
o biblista, até podem conservar alguns dados históricos, mas contam algo muito
isolado e incompatível com a grande maioria dos relatos históricos mais
amplamente aceitos sobre o estado civil do Messias. Além disso, o manuscrito do
ano 570 apresenta consideráveis acrobacias fantasiosas ao tratar do
relacionamento entre Jesus e Maria Madalena.
A verdadeira Madalena
Um dos muitos equívocos que persistem no
tocante a Maria Madalena é a interpretação de que ela tenha sido prostituta. “É um mito ocidental”, corrige o padre
Fabris. “Quem decifra a história de
maneira fiel são os textos gregos. Ela era uma pessoa próspera, que estava
doente e foi curada por Jesus. Junto com outras mulheres prósperas, ela
‘financia’ Jesus em dados momentos, para ajudar os pobres, comprar um cordeiro
para a Páscoa etc. O oitavo capítulo do Evangelho de Lucas menciona este
assunto. Essas mulheres apoiavam os discípulos em suas obras”.
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