Onde nasceu
Nossa Senhora?
Essa pergunta, versando sobre tema muito
caro aos católicos, por diversas razões não encontra fácil resposta. A
natividade da Virgem Santíssima é comemorada no dia 8 do corrente.
Valdis
Grinsteins
Para entender a escassez de informações
nos primeiros séculos da Igreja, sobre a vida de Nossa Senhora, convém levar em
conta as particularidades daquela época.
O mundo pagão, por efeito da decadência em
que se encontrava, era politeísta, ou seja, os homens adoravam simultaneamente
vários deuses. Os pagãos não achavam ilógico nem absurdo que houvesse várias
divindades, ou que elas não fossem perfeitas. Pior ainda. Consideravam normal
que os deuses dessem exemplo de devassidão moral, sendo, por exemplo,
adúlteros, ladrões ou bêbados. Obviamente, nem todos os deuses eram
apresentados como subjugados por esses vícios, mas o fato de haver vários deles
nessas condições tornava imensamente árduo para os pagãos entender a noção
católica do verdadeiro e único Deus, de perfeição infinita.
Por isso a primitiva Igreja teve muito
cuidado ao apresentar Nossa Senhora como Mãe de Deus, pois aqueles povos, com
forte influência do paganismo, rapidamente tenderiam a transformá-la numa
deusa. Somente após a queda do Império Romano do Ocidente e a sucessiva cristianização
dos povos começou a Igreja – que nunca negou a importância fundamental da
Virgem Santíssima na história da salvação – a colocar Nossa Senhora na
evidência que lhe compete e a exaltar suas maravilhas. E com isso, a fazer um
bem indescritível às almas dos fiéis.
É fácil compreender por que nesse longo
período, cerca de 400 anos, muitas informações a respeito da Santíssima Virgem
tenham se perdido e outras se encontrem em fontes não inteiramente confiáveis.
Não obstante, a Tradição da Igreja conservou fielmente aqueles atributos d’Ela
que eram necessários para a integridade da fé dos católicos. O essencial foi
transmitido, e, para um filho que ama sua Mãe, qualquer dado a respeito d’Ela é
importante.
Entre esses dados, sobre os quais um véu
de mistério permaneceu, está o local em que nasceu Nossa Senhora.
Belém, Seforis, ou Jerusalém
Três cidades disputam a honra de ter sido
o local de nascimento da Mãe de Deus. (1)
A primeira é Belém. Deve-se essa tradição
ao fato de Nossa Senhora ser de estirpe real, da casa de Davi. Sendo Belém a
cidade de Davi, foi essa a razão pela qual São José e a Virgem Santíssima –
ambos descendentes do Profeta-Rei – dirigiram-se àquela localidade, por ocasião
do censo romano que ordenava a todos registrarem-se no lugar originário de suas
famílias. Por isso, o Menino Jesus nasceu em Belém, e é aclamado, no Evangelho,
como Filho de Davi. O principal argumento dos que sustentam a tese de que Nossa
Senhora nasceu em Belém encontra-se num documento intitulado De Nativitate S. Mariae, incluído na
continuação das obras de São Jerônimo.
Outra tradição assinala a pequena
localidade de Seforis, poucos quilômetros ao norte de Belém, como o local do
nascimento da Virgem. Tal opinião tem como base que, já na época do Imperador
Constantino, no início do século IV, foi construída uma igreja nessa localidade
para celebrar o fato de ali terem residido São Joaquim e Santa Ana, pais de
Nossa Senhora. Santo Epifânio menciona tal santuário. Os defensores de outras
hipóteses assinalam que o fato de os genitores da Virgem Santíssima terem
morado lá não indica necessariamente que Nossa Senhora haja nascido naquela
localidade.
A hipótese que congrega maior número de
adeptos é a de que Ela nasceu em Jerusalém. São Sofrônio, Patriarca de
Jerusalém (634-638), escrevendo no ano 603, afirma claramente ser aquela a
cidade natal de Maria Santíssima. (2) São João Damasceno defende a mesma
posição.
A festa da Natividade
Na Igreja católica celebramos numerosas
festas de santos. Havendo, felizmente, milhares de santos, comemoram-se
milhares de festas. Ocorre que não se celebra a data de nascimento do santo,
mas sim a de sua morte — correspondendo ao dia da entrada dele na vida eterna.
Somente em três casos comemoram-se as festas no dia do nascimento: Nosso Senhor
Jesus Cristo (Natal); o nascimento de São João Batista; e a natividade da
Santíssima Virgem.
A festa da Natividade era celebrada no
Oriente católico muito antes de ser instituída no Ocidente. Segundo uma bela
tradição, tal festa teve início quando São Maurílio a introduziu na diocese de
Angers, na França, em consequência de uma revelação, no ano 430. Um senhor de
Angers encontrava-se na pradaria de Marillais, na noite de 8 de setembro
daquele ano, quando ouviu os anjos cantando no Céu. Perguntou-lhes qual o
motivo do cântico. Responderam-lhe que cantavam em razão de sua alegria pelo
nascimento de Nossa Senhora durante a noite daquele dia. (3)
Em Roma, já no século VII, encontra-se o
registro da comemoração de tal festa. O Papa Sérgio tornou-a solene, mediante
uma grande procissão.
Posteriormente, Fulberto, Bispo de
Chartres, muito contribuiu para a difusão dessa data em toda a França.
Finalmente, o Papa Inocêncio IV, em 1245, durante o Concilio de Lyon, estendeu
a festividade para toda a Igreja.
Comemoração na atualidade
Por uma série de motivos curiosos, a festa
da Natividade é celebrada muito especialmente na Itália e em Malta. Sendo o
povo italiano muito vivo e propenso a celebrações familiares, não surpreende
esse fato.
Em Malta, a principal comemoração da festa
consiste numa solene procissão na localidade de Xaghra. (4)
Na cidade de Florença, no dia da festa,
numerosas crianças dirigem-se ao rio Arno levando pequenas lanternas, que são
colocadas na água e lentamente vão atravessando a cidade.
Na Sicília, na localidade de Mistretta, a
população celebra a festa representando um baile entre dois gigantes. À
primeira vista, pareceria que isto nada tem a ver com o fato histórico. Mas ele
corresponde a uma tradição: foi encontrada uma imagem de Santa Ana com Nossa
Senhora ainda menina. Levada à cidade, a imagem misteriosamente retornou ao
local onde havia sido achada, e os habitantes julgaram que só poderia ter sido
levada por gigantes. Proveio dessa lenda o costume.
Em Moliterno, ao contrário, existe o lindo
e pitoresco costume de as meninas da localidade fixarem pequenas candeias nos
chapéus de seus trajes típicos. Em determinado momento desaparecem as outras
luzes e só permanecem as das meninas, que executam uma dança regional.
Curiosamente, em muitas localidades as
luzes desempenham papel determinante na festa. Podemos conjeturar uma razão
para o fato: a Natividade de Nossa Senhora representou o prenúncio da chegada
ao mundo da Luz de Justiça, Nosso Senhor Jesus Cristo.
______________
Notas:
2.
Nuevo Diccionario de Mariologia, Ediciones Paulinas.
3.
La fête angevine N.D. de France, IV, Paris, 1864, 188.
Fonte:
www.catolicismo.com.br
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